CAPÍTULO PUBLICADO

LIVRO: SAÚDE DA MULHER E SEUS DESAFIOS

OPEN ACCESS PEER-REVIEWED BOOK 

A ACEITAÇÃO IMPACTA NOS NÍVEIS DE ANSIEDADE, DEPRESSÃO E COMPROMETIMENTO DA DOR EM MULHERES COM FIBROMIALGIA?

DOES ACCEPTANCE IMPACT LEVELS OF ANXIETY, DEPRESSION AND PAIN IMPAIRMENT IN WOMEN WITH FIBROMYALGIA?

 2023 Editora Science / Brazil Science Publisher

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CAPÍTULO 1

A aceitação impacta nos níveis de ansiedade, depressão e comprometimento da dor em mulheres com fibromialgia?

Does acceptance impact levels of anxiety, depression and pain impairment in women with fibromyalgia?

 

DOI: https://doi.org/10.56001/23.9786500631609.01

 

Ilma Pereira dos Santos Henrique

Universidade Católica Dom Bosco, Campo Grande-MS.

https://orcid.org/0000-0003-2940-3295

Luziane de Fátima Kirchner

Instituto Clínico IPSH – Florescimento Humano, Campo Grande-MS.

http://lattes.cnpq.br/0910442125365295

 

 

 

Resumo

Introdução: A fibromialgia (FM) é uma síndrome caracterizada por dor musculoesquelética, crônica e difusa em vários pontos do corpo que geram limitações significativas ao indivíduo e acometem principalmente mulheres. O objetivo deste trabalho foi comparar a ansiedade e depressão com a aceitação da dor em pacientes com Fibromialgia, identificando se maior aceitação da experiência dolorosa está correlacionada ao menor nível de depressão e ansiedade. Métodos: Estudo de corte transversal com 79 participantes com diagnóstico de Fibromialgia, do sexo feminino, entre 32 a 71 anos, recrutadas para participar de um projeto de extensão de uma instituição superior de ensino do estado do Mato Grosso do Sul. A coleta foi realizada de forma remota entre os anos de 2021 e 2022, a partir da aplicação dos instrumentos Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão (HAD), Questionário de Impacto da Fibromialgia (FIQ-R) e Chronic Pain Acceptance Questionnaire (CPAQ). Resultados: Os resultados apontaram que a correlação entre a aceitação da dor e comprometimento da dor foi moderada (r=-0,52), assim como foi observada a correlação negativa moderada entre a aceitação da dor, ansiedade e depressão. Conclusão: Esses dados sugerem que promover estratégias direcionadas a aceitação a dor poderá contribuir para reduzir o comprometimento funcional e emocional de pessoas com fibromialgia.

Palavras-Chaves: Dor; Aceitação; Ansiedade; Depressão, Fibromialgia.

Abstract

Introduction: Fibromyalgia (FM) is a syndrome characterized by musculoskeletal, chronic and diffuse pain in various parts of the body that generate significant limitations to the individual and affect mainly women. The aim of this study was to compare anxiety and depression with pain acceptance in patients with Fibromyalgia, identifying whether greater acceptance of the painful experience is correlated with lower levels of depression and anxiety. Methods: Cross-sectional study with 79 participants diagnosed with Fibromyalgia, female, between 32 and 71 years old, recruited to participate in an extension project of a higher education institution in the state of Mato Grosso do Sul. Data were collected remotely between 2021 and 2022, using the Hospital Scale for Anxiety and Depression (HAD), Fibromyalgia Impact Questionnaire (FIQ-R) and Chronic Pain Acceptance Questionnaire (CPAQ). Results: The results showed that the correlation between pain acceptance and pain impairment was moderate (r=-0.52), as well as a moderate negative correlation between pain acceptance, anxiety and depression. Conclusion: These data suggest that promoting strategies aimed at pain acceptance may contribute to reducing the functional and emotional impairment of people with fibromyalgia.

Keywords: Pain; Acceptance; Anxiety; Depression, Fibromyalgia.

 

 

Introdução

A fibromialgia (FM) é uma síndrome caracterizada por dor musculoesquelética, crônica e difusa em vários pontos do corpo, que geram limitações significativas ao indivíduo e acometem principalmente mulheres (9:1) na faixa etária de 30 a 60 anos (HEYMANN et al., 2010).  Boomershine (2021), relata que a FM acomete mulheres jovens ou de meia-idade, mas também pode afetar pessoas de ambos os sexos e em qualquer idade. Por ser uma síndrome crônica, a FM gera um impacto na qualidade de vida dos pacientes. Lorena et al., (2016) observaram que pacientes com FM, apresentaram altos índices de dor e a presença de limitações nos aspectos físicos, emocionais e mentais dessas pessoas, concluindo que a dor representa um importante fator causal para a diminuição da qualidade de vida dos pacientes fibromiálgicos.

Segundo a Portaria do Ministério da Saúde de 2012, a Fibromialgia apresenta sintomas múltiplos, tais como fadiga, distúrbio do sono, disfunção cognitiva e episódios depressivos. Santos et al., (2012) e Brites (2014), relatam que a FM se correlaciona com outras síndromes de natureza funcional, tais como cefaleia crônica, síndrome de cólon irritável, disfunção da tireoide, depressão e ansiedade, sendo que a dor crônica aumenta o risco das comorbidades, como os transtornos de ansiedade e depressão. O estudo de Berber et al., (2005) com 70 pacientes mulheres, identificou que a depressão impacta na qualidade de vida das pessoas com FM, prejudicando a funcionalidade, as condições emocionais e a percepção de dor. A depressão tende a piorar a qualidade do sono, o que pode aumentar a sensibilidade à dor e o estresse e diminuir a disposição para exercícios (SOCIEDADE BRASILEIRA DE REUMATOLOGIA, 2011).

Os sintomas depressivos e ansiosos podem acometer os indivíduos de forma combinada, havendo uma frequência da comorbidade entre ambos os transtornos. Assim, Santos et al., (2012) aponta ser comum que pessoas com diagnóstico de Fibromialgia possuam ansiedade em comorbidade com a depressão. Nesse estudo, os autores observaram que há uma forte relação da incapacidade em pessoas com FM devido a intensidade da dor, assim como sintomas de ansiedade e depressão, conforme indicado em instrumentos padronizados aplicados em 60 pessoas com o diagnóstico de FM, e maiores de 18 anos. A prevalência desses sintomas, como ansiedade e depressão, varia entre 13% a 71% em pessoas com FM. Os autores também observaram que os sintomas ansiosos podem comprometer o curso da doença, e a presença da ansiedade está ligada a um maior número de sintomas físicos e consequente maior intensidade da dor.  Pinheiro et al., (2014), realizou um estudo com 125 pacientes em tratamento para dor crônica/FM no qual foram aplicados a Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão (HAD), e questionários que avaliaram a intensidade da dor, tempo de dor e variáveis sociodemográficas. Os resultados indicaram uma correlação entre ansiedade, depressão e dor, sugerindo que quanto maior o comprometimento dos sintomas de ansiedade e depressão, maiores eram as respostas de intensidade da dor. Os autores concluíram, com este estudo, que a intensidade da dor pode impactar diretamente na ansiedade e na depressão dos pacientes investigados, assim como os fatores de maior vulnerabilidade, tempo de diagnóstico de dor também podem impactar na dor (PINHEIRO et al., 2014). Além disso, conforme os achados de BERBER et al., (2005), a depressão tende a piorar a condição física, a dor e as emoções, impactando na saúde mental do indivíduo. 

VANDERBERGUE (2005), aponta que o indivíduo tende a focar na intensidade de situações dolorosas e nos aspectos negativos da situação vivenciada, repercutindo em um padrão desadaptativo de enfrentamento. Cardoso et al., (2011), observou em seu estudo de revisão bibliográfica na qual descreveu algumas formas segundo a literatura de manejo mais eficazes na depressão, e nesse estudo foram achados também a Terapia de Aceitação e Compromisso, compreende-se que o indivíduo com depressão tende a apresentar redução na frequência de comportamentos positivamente reforçados (atividades prazerosas) e aumento consequentemente de comportamentos de fuga e esquiva as situações aversivas.

Uma perspectiva de modelo para dor crônica é a étnico-social, está relacionada à aprendizagem social do indivíduo e como as crenças, atitudes, são formadas socialmente e são importantes no papel a resposta de dor (SARDA et al., 2012). Segundo Teixeira (2022), estudos indicam a importância de observar a dor crônica como uma doença e não somente um sintoma, o que favorece uma abordagem biopsicossocial, reconhecendo o indivíduo para além da dor. Uma característica dos indivíduos com dor crônica é o sentimento de incontrolabilidade e de imprevisibilidade, que podem estar ligados com sintomas depressivos (GOMES, 2008).

A aceitação de pensamentos e sentimentos, como proposta da Terapia de Aceitação e Compromisso desenvolvida por (HAYES et al., 1999 apud SABAN, 2015), tem sido compreendida como um construto que pode determinar a forma como o indivíduo reage e se adapta às situações aversivas, assim como a tentativa de controlar os eventos encobertos, julgados negativos. A Terapia de Aceitação e Compromisso, (ACT), visa abandonar o controle mal aplicado, ou o que almeja livrar-se da experiência que não pode ser eliminada, ao invés de aumentar o sofrimento tentando controlar (LUOMA et al., 2022). LEVIN et al., (2015, p. 26), descreve aceitação “como sendo a resposta a questão relativa ao que fazer com os eventos encobertos aversivos, esses eventos seriam situações em que não há possibilidade de controle”. A aceitação promove flexibilidade, não é uma técnica, mas um processo funcional (HAYES; STROSAHL; WILSON, 2021). Para (PINHEIRO et al., 2014), e (SANTOS et al., 2012), eles também apontam que podem indicar que a forma como o indivíduo vivência e enfrenta o seu processo de adoecimento pode ter um impacto direto na dor e consequentemente desencadear ou potencializar sintomas de ansiedade e depressão. Nesse sentido, identificar o nível de aceitação em pacientes com dor crônica poderá auxiliar no manejo terapêutico. Um estudo realizado por Tangem et al., (2020) avaliou 365 mulheres com fibromialgia, indicou que uma maior aceitação da dor está associada a um aumento da funcionalidade diária, menor nível de intensidade da dor e dos demais sintomas, como a depressão, ansiedade ao longo do tempo, evidenciando um impacto positivo da aceitação em pacientes com fibromialgia. 

Outros autores argumentaram que participantes com menor aceitação da dor apresentaram maiores escores na avaliação de sintomas de depressão, ansiedade e estresse, impactando nos níveis de comprometimento funcional e emocional dos indivíduos (MCCRACKEN et al., 2004, apud COSTA; GOUVEIA, 2009). Mais estudos que corroborem esses dados são necessários, especialmente envolvendo as amostras brasileiras de portadores da Fibromialgia. Estudos brasileiros objetivaram a avaliação dos efeitos da Terapia de Aceitação e Compromisso para pessoas com dor crônica (SABAN, 2015; SOUZA; de-FARIAS, 2014), e a análise de outras variáveis, como a autodeterminação e as estratégias de coping no enfrentamento da dor (BATISTA, 2017).  Para LUOMA et al., (2022, p. 125), “muita luta e sofrimento podem surgir a partir da negação da dor humana e uma batalha com nossa experiência interna inicia, e o controle da dor será quase que inevitável, porém ineficaz”, justificando os dados da análise desse presente estudo, as pessoas que apresentaram uma depressão maior tiveram uma piora na aceitação da dor, assim como índices mais altos na variável de ansiedade, indicando uma piora na funcionalidade e disposição para dor das participantes.

De acordo com (HAYES; STROSAHL; WILSON, 2021, p. 217), “o ato de aceitar não seria ceder, não é uma técnica e não é um fracasso, mas sim, um processo contínuo e funcional”, que possibilita o paciente entrar em contato com a sua experiência pessoal, e que poderá permitir um processo de aprendizagem e postura de aceitação, baseado em seus valores pessoais, pessoas que tendem a focar menos na eliminação da dor, e portanto poderá focar em outros aspectos da vida, como sua vida social e profissional, apesar dos prejuízos relacionados a dor.

 Dessa forma, o objetivo desta pesquisa é identificar o nível de aceitação da dor e o seu impacto na funcionalidade e nas condições emocionais de pessoas com FM, em específico a ansiedade e a depressão. 

 Métodos

Este estudo respeitou os cuidados éticos de pesquisa com seres humanos, conforme Resolução MS/CNS nº 510 de 2016, que regulamenta as pesquisas na área de Ciências Humanas e Sociais. O projeto da pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos - CEP/UCDB (Parecer Número 5.079.447), sendo que os participantes foram esclarecidos dos procedimentos, riscos e benefícios dos estudos e aqueles que concordaram em participar assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE.

Participantes e Local: 79 pessoas do gênero feminino, entre 32 a 71 anos, com diagnóstico de Fibromialgia há mais de 12 meses. Para participar deste estudo as mulheres não poderiam ser portadoras de doenças malignas graves, como o câncer, e poderiam apresentar dificuldades cognitivas que as impedissem de responder aos instrumentos.

A coleta de dados foi realizada de maneira remota, a partir do contato com as pessoas interessadas em participar de um projeto de extensão para atendimento as pessoas com fibromialgia, desenvolvido em uma instituição de ensino superior do estado do Mato Grosso do Sul. 

 

  • Caracterização geral da população estudada  

Tabela 1 - Dados sociodemográficos dos participantes 

Características sociodemográficas

N

Idade (média)

46,9

Estado civil

 

Solteiro

13

Casado

46

Divorciado

15

Viúvo 

4

Escolaridade 

 

Ensino Fundamental

12

Ensino Médio

30

Ensino Superior

36

Recebe auxílio-doença

 

Sim

9

Não

69

Renda

 

Menos de 1 salário-mínimo (menos de R$ 1.100,00)

16

Entre 1 e 3 salários-mínimos (entre R$ 1.100,00 e R$ 3.300,00)

44

Entre 3 e 7 salários-mínimos (entre R$ 3.300,00 e R$ 7.700,00)

15

Entre 7 e 10 salários-mínimos (entre R$ 7.700,00 e R$ 11.000,00) 

43

Tempo com dor 

 

01 a 03 anos

8

03 a 05 anos

11

05 a 10 ano

21

mais de 10 anos

38

 

A maior parte da amostra se declarou casada (n=46), com escolaridade entre Ensino Médio (n=30) e superior (n=36). Quanto ao auxílio-doença, a maioria respondeu que não recebe este tipo de auxílio (n =69) e que a renda se encontra entre 01 a 03 salários mínimos (n=69). Quanto ao tempo que as participantes relataram conviverem com a dor, a maioria indicou que é acima de 5 anos até 10 anos (n=21), predominantemente acima de 10 anos (n=38)

  • Instrumentos

Questionário Sociodemográfico - elaborado pelos pesquisadores para uso neste estudo, contendo perguntas sobre o diagnóstico assim como os tratamentos realizados até o presente momento condições atuais de saúde, dados de início e manutenção da dor, tratamentos farmacológicos e não-farmacológicos.

Questionário de Impacto da Fibromialgia, versão brasileira revisada - FIQ-R (PAIVA et al., 2013): são dispostos 21 itens em uma escala formato Likert (0-10), organizada em 03 domínios relacionados à: 1) funcionalidade; 2) impacto global da FM; 3) intensidade dos sintomas. O somatório de cada domínio é dividido por 3, 2 e 2, respectivamente e a soma dos subscores é pontuação final.

Escala Hospitalar de Ansiedade e depressão – HAD (CASTRO et al., 2006): avaliação do nível de ansiedade e depressão, avaliação do nível da ansiedade e depressão, com escala de assinalar X, com a alternativa que melhor descreve a sua resposta. Essa escala contém 14 itens com quatro alternativas de resposta cada item, as quais o participante indica o que experienciou na última semana. As questões são igualmente divididas, e se intercalam, entre as subescalas de ansiedade e depressão. A classificação é atribuída a partir do somatório dos itens: 0 a 6 (leve), 7 a 12 (moderado) e 13 ou mais (grave).

Chronic Pain Acceptance Questionnaire - CPAQ (MCCRACKEN et al.,  2004): constituído por 20 itens dispostos em uma escala de 7 pontos (0 a 6), que avalia a aceitação a dor. Contém duas subescalas, uma que avalia o engajamento em atividades (11 itens) e a outra que avalia a disposição para a dor (9 itens).

  • Procedimento de coleta de dados

A coleta de dados foi realizada a partir do cadastro no serviço-escola projeto de extensão de uma instituição superior de ensino do estado do Mato Grosso do Sul com participantes advindos de anúncios e divulgações nas mídias. As participantes deixavam o nome e contato telefônico na secretaria da clínica com interesse no serviço. 

Entre os anos de 2021 e 2022, a pesquisadora entrou em contato com as participantes, solicitando para responderem ao formulário do Google Forms. O formulário foi encaminhado via mensagem (whatsapp) com o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido - TCLE e a inclusão dos instrumentos Questionário Sociodemográfico, FIQ-R, HAD, CPAQ.  Estimou-se que a duração aproximada para o preenchimento do formulário foi de 20 minutos.

  • Análise dos dados

Os dados foram analisados quantitativamente, comparando-se os efeitos na incapacidade frente à dor, ansiedade, depressão e aceitação da dor, entre os grupos. Para a análise estatística, foi realizado o coeficiente de correção de Pearson, uma vez que a amostra apresentou distribuição normal. O nível de significância adotado foi de 5% e a magnitude das correlações foram consideradas: Fraca (<0,30); Moderada (0,30 a 0,59), Forte (0,60 a 0,99) ou Perfeita (1,0) (LEVIN; FOX, 2004).

 Resultados 
  • Inclusão e exclusão de participantes: 

Inclusão: ser portadora da Fibromialgia com diagnóstico a mais de 06 meses, pessoas do gênero feminino, acima de 18 anos.

Exclusão: Não ser portadora de doenças malignas graves, como câncer e não possuir dificuldades cognitivas que possam impedir as participantes de responder os instrumentos.

A Tabela 1 abaixo apresenta a análise de correlação entre as variáveis aceitação da dor (Escore Geral) e distribuída entre os fatores Engajamento em atividades e Disposição para a dor (CPAQ), comprometimento da dor (FIQ-R), ansiedade e depressão (HAD). Os valores de p inferiores a 0,05 indicam que houve significância estatística. O coeficiente de correlação é a força da correlação, positiva ou negativa e conforme Levin; Fox (2004), pode ser fraca, moderada, forte ou perfeita.

Tabela 1. Correlação de Pearson para os escores CPAQ versus FIQ-R, HAD ansiedade e HAD depressão.

 

Variáveis

 

FIQ-R

Comprometimento

da dor

HAD

Ansiedade

HAD

Depressão

CPAQ-GERAL Aceitação

Coeficiente de correlação

-0,52

-0,41

-0,42

valor de P

*0,000

*0,000

*0,000

     

CPAQ-Engajamento em atividades

Coeficiente de correlação

-0,49

-0,38

-0,48

valor de P

*0,000

*0,001

*0,000

     

CPAQ-Disposição para a dor

Coeficiente de correlação

-0,33

-0,26

-0,14

valor de P

*0,003

*0,024

0,231

*p>0,05

 

Os dados indicaram que houve correlação negativa e moderada entre a aceitação da dor (CPAQ-Geral) e os níveis de impacto da dor, ansiedade e depressão. Ou seja, quanto maior a aceitação da dor, menores eram os níveis de comprometimento da dor. ansiedade e depressão, conforme os relatos das participantes.

No que se refere à análise por fatores do CPAQ, os dados também apontaram que quanto maiores eram o Engajamento em atividades e a Disposição para sentir dor, menores eram os níveis de comprometimento da dor, ansiedade e depressão. Essas correlações apresentaram, predominantemente, magnitude moderada (Coeficiente de correlação > 0,30).

Discussão

Esse estudo propôs correlacionar comprometimento da dor, ansiedade, depressão com a aceitação da dor em pacientes com diagnóstico de Fibromialgia, observando o impacto da aceitação da dor nestes pacientes. O estudo apontou que a correlação entre a aceitação da dor e comprometimento da dor foi moderada (r=-0,52), assim como foi observada a correlação negativa moderada entre a aceitação da dor, ansiedade e depressão. 

Nesse sentido, as pessoas com maior escore de aceitação da dor também relatam menor comprometimento da fibromialgia em sua qualidade de vida. Costa e Gouveia (2009), em um estudo psicométrico da versão portuguesa com 104 indivíduos com dor crônica, com instrumento Chronic Pain Acceptance Questionnaire (CPAQ), indicou que o grupo com mais sintomas de depressão demonstrou menor disposição para a realização de atividades e menos disponibilidade para dor. Em relação a ansiedade, este estudo também apontou que os participantes que apresentaram maior ansiedade, indicaram menor disposição para realização de atividades e menos disposição para sentir dor. 

No presente estudo o “engajamento em atividades” também foi correlacionado negativamente com o comprometimento da dor, o que indica que quanto mais a pessoa relata engajar-se nas atividades menor é o impacto da dor na sua vida diária. Segundo Murta (1999), portanto, uma estratégia comportamental para o manejo com a dor, seria o engajamento gradativo em atividades cotidianas.

Conforme (CHAGAS; GUILHERME; MORIYAMA, 2013), em seu estudo descritivo e exploratório de intervenção com 06 pacientes utilizando a ACT para uma maior aceitação em relação a ansiedade, observou que a maioria dos participantes relataram aceitar sentimentos e pensamentos, que estavam evitando anteriormente após o processo interventivo.

Corroborando a esses achados, (PINHEIRO et al., 2014) e (SANTOS; BOGGIO, 2019), observaram que pessoas com FM indicaram maior probabilidade de comorbidades como ansiedade e depressão em seu quadro clínico, incorrendo em uma piora na qualidade de vida e maior dificuldade no manejo com o tratamento. Entretanto pode-se perceber que os pacientes que manejam melhor o seu processo de dor, indicam um maior engajamento no tratamento e melhora na qualidade de vida, diminuindo seus processos psicológicos de ansiedade e depressão.   

Quanto à disposição para dor, os resultados apontaram que esta variável apresentou correlação moderada com o comprometimento da dor. A correlação da disposição para a dor também foi identificada para a ansiedade, porém não foi observada em relação a variável depressão. Teixeira (2022), em seu estudo observacional transversal com 2176 pessoas, observou que a interferência negativa da dor na vida dos participantes, tem influência direta no trabalho, atividades gerais, caminhada, sono, relações interpessoais e forma de viver. CASTRO et al., (2011), observou em seu estudo com 400 pacientes adultos com dor crônica (331 do sexo feminino e 69 do sexo masculino), que a dor era mais incapacitante quando os sintomas depressivos e ansiosos estavam presentes. TANGEM et al., (2020) argumenta, que pacientes fibromiálgicos que praticam a forma de aceitação da dor, indicam resultados mais satisfatórios em relação ao tratamento e maior engajamento, possibilitando novas formas de enfrentar as adversidades vivenciadas.

Esse estudo possibilitou verificar que a aceitação poderá contribuir nas atividades cotidianas dos pacientes, e sugere que intervir para aumentar a disposição de pessoas com fibromialgia para a aceitação da dor poderá contribuir para reduzir o comprometimento funcional e emocional que a fibromialgia tem nesta população. Wicksell et al., (2013), observou que em seu estudo para avaliar a eficácia da ACT em pacientes com fibromialgia (n=40) houve diferenças significativas no funcionamento da dor, impacto da FM, qualidade de vida, depressão e ansiedade, promovendo a aceitação da dor e do sofrimento após a intervenção. Sugere-se uma continuidade da pesquisa para uma maior compreensão em relação a aceitação da dor em pacientes com fibromialgia e possível diminuição de seus sintomas ansiosos e depressivos, assim como um maior engajamento em atividades e consequente melhora na qualidade de vida desses pacientes.

Considerações Finais

A Fibromialgia é uma doença crônica que acomete milhares de pessoas em ao redor do mundo, a incidência predominante no gênero feminino, faz com que todo o núcleo familiar tenha impacto direto ou indiretamente em decorrência do diagnóstico, alterando por vez, toda a rotina familiar, inclusive impactando em diversas áreas da vida do paciente, entre essas áreas citamos, vida pessoal, profissional e saúde em geral. Sendo, portanto, importante observarmos meios de contribuição aos pacientes que possam favorecer em sua qualidade de vida e bem-estar, e através dos dados observados no presente artigo, foi possível verificarmos a correlação, entre a aceitação da dor nas pacientes com FM, assim como os aspectos psicológicos como a ansiedade e a depressão que influenciam diretamente no processo do adoecimento. Sugere-se que existe uma correlação entre moderada entre a aceitação da dor e o impacto da dor na vida da paciente. E em relação à aceitação da dor, ansiedade e depressão, apresentaram uma correlação negativa moderada. 

Esse estudo propôs correlacionar ansiedade, depressão e impacto da dor com a aceitação da dor em pacientes com diagnóstico de Fibromialgia, observando o impacto da aceitação da dor em pacientes com FM. O estudo apontou que a correlação entre a aceitação da dor e impacto da dor foi moderada, assim como foi observada a correlação negativa moderada entre a aceitação da dor, ansiedade e depressão, ou seja, quanto maior a aceitação da dor, menores eram esses sintomas de ansiedade e depressão, conforme os relatos das participantes.

Os dados do CPAQ também apontaram que quanto maiores eram o engajamento em atividades e a disposição para sentir dor, menores eram os níveis de impacto da dor, ansiedade e depressão, essas correlações indicaram predominantemente, magnitude moderada, contribuindo com a hipótese levantada, ou seja, pessoas que possuem uma maior aceitação da dor e disposição para sentir a dor, podem ter maior engajamento em suas atividades diárias e isso poderá indicar em menor impacto na ansiedade e depressão em decorrência do seu processo de adoecimento.

Referências 

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