O GRUPO DE OUVIDORES DE VOZES: DISPOSITIVO DE CUIDADO EM SAÚDE MENTAL

Palavras-chave: Psicoterapia de grupo, confusão alucinatória, saúde mental.

Resumo

A alucinação auditiva é um fenômeno que participa da vida de muitas pessoas que fazem tratamento no sistema público de saúde mental de nosso país. No cotidiano de um Centro de Atenção Psicossocial de uma capital brasileira, ouvidores de vozes relatavam com frequência que continuavam sofrendo em função de experiências alucinatórias, mesmo seguindo o tratamento prescrito pela equipe de saúde. Considerando esse problema, foi criado no local um grupo voltado para a lida com o fenômeno. Este artigo teve como objetivo analisar experiências desse grupo. Para isso, utilizou-se o método qualitativo, o qual envolveu o registro de 62 sessões sob a forma de diário de campo, e a análise do corpus. A organização dos dados se deu em três espectros temporais estruturantes de (psico)terapias de grupo em geral: “apresentação”, “trocas de experiências”, e “fechamento”; além de um aspecto dinâmico, denominado de “manejo terapêutico”. A apresentação promoveu a ambientação dos participantes e possibilitou o surgimento de temas importantes, os quais foram trabalhados no decorrer da sessão. Ao trocarem experiências, os integrantes conseguiram compreender algumas dinâmicas relativas às vozes, e houve a promoção de determinados fatores terapêuticos. O manejo serviu para alinhavar os espectros temporais e garantir a fluidez da atividade. Recomenda-se a adoção de grupos com esse foco e formato nos serviços de saúde mental, considerando que eles ampliam a capacidade de cuidado.

Downloads

Não há dados estatísticos.

Biografia do Autor

Henrique Campagnollo Dávila Fernandes, Universidade de Brasília
Psicólogo graduado pelo Centro Universitário de Brasília - UniCeub (2013). Mestre em Psicologia Clínica e Cultura pela Universidade de Brasília (2017), com pesquisa sobre o fenômeno da audição de vozes (alucinação auditiva). Especialista em Gestão de Pessoas pela Universidade Federal de São João Del Rei - MG (2008), e em psicologia clínica de base fenomenológico-existencial pelo Instituto de Psicologia Fenomenológico-Existencial do Rio de Janeiro - IFEN (2016). Integra um grupo de ouvidores de vozes desde 2015, e tem prestado apoio a um grupo de ajuda mútua em saúde mental na comunidade da Ceilândia - Distrito Federal. É graduando em filosofia (UnB).
Valeska Zanello, Universidade de Brasília
Possui graduação em Filosofia pela Universidade de Brasília (2005), graduação em Psicologia pela Universidade de Brasília (1997), e doutorado em Psicologia pela Universidade de Brasília (2005) com período sanduíche de um ano na Université Catholique de Louvain (Bélgica). Professora adjunta 3 do departamento de Psicologia Clínica da Universidade de Brasília, orientadora de mestrado e doutorado no Programa de Pós-Graduação em Psicologia Clínica e Cultura (PPG-PSICC). Tem experiência na área de Psicologia, com ênfase em SAÚDE MENTAL e GÊNERO, atuando principalmente nos seguintes temas: saúde mental, genero, psicanálise e filosofia da linguagem. Coordena o grupo de pesquisa "Saúde Mental e Gênero" (foco em mulheres) o qual realiza uma leitura do campo da saúde mental sob um viés feminista das relações de gênero ( e interseccionalidades com raça e etnia) no que diz respeito à epistemologia, semiologia, diagnóstico psiquiátrico e prática profissional. Foi representante do Conselho Federal de Psicologia no Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (SPM) e no GEA (Grupo de Estudos do Aborto) no periodo de 2014 a 2016. Membro do Grupo de Estudos Feministas (GEFEM) da UnB. Participou do TEDx Universidade de Brasília com o talk "Por que xingamos homens e mulheres de formas diferentes?". Gravou o (vídeo aula) ORIENTAPSI, do Conselho Federal de Psicologia, sobre o tema "Saúde Mental e Gênero".

Referências

Baker, P. (2009). The voice inside: a practical guide for and about people who hear voices. Port of Ness: P&P Press.

Bauer, S.M., Schanda, H., Karakula, H., Olajossy-Hilkesberger, L., Rudaleviciene, P., Okribelashvili, N., Chaudhry, H.R., Idemudia, S.E., Scheider, S., Ritter, K., & Stompe, T. (2011). Culture and the prevalence of hallucinations in schizophrenia. Comprehensive Psychiatry, 52, 319-325.

Brasil. (2011). Ministério da Saúde. Portaria Nº 3.088, de 23 de dezembro de 2011. Institui a Rede de Atenção Psicossocial para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde. Brasília: Ministério da Saúde.

Cordiolli, A.V., & Giglio, L. (2008). Como atuam as psicoterapias: os agentes de mudança e as principais estratégias e intervenções psicoterápicas. In: Cordioli, A.V. Psicoterapias – Abordagens Atuais. Porto Alegre: Artmed.

Corstens, D., & Longden, E. (2013). The origins of voices: links between life history and voice hearing in a survey of 100 cases. Psychosis, 5(3), 270-285.

Corstens, D., Longden, E., McCarthy-Jones, S., Waddingham R., & Thomas, N. (2014). Emerging perspectives from the hearing voices movement: implications for research and practice. Schizophr Bull, 40, S285–S294.

De Leede-Smith, S., & Barkus, E. (2013). A comprehensive review of auditory verbal hallucinations: lifetime prevalence, correlates and mechanisms in healthy and clinical individuals. Front Hum Neurosci, 7, 1-25.

Dillon, J., & Hornstein, G.A. (2013). Hearing voices peer support groups: a powerful alternative for people in distress. Psychosis, 5(3), 286-295.

Englisch, S., & Zink, M. (2012). Treatment-resistant Schizophrenia: Evidence-based Strategies. Mens Sana Monographs, 10(1), 20–32.

Escher, S. (2009). Accepting voices and finding a way out. In: Romme, M., Escher, S., Dillon, J., Corstens, D., & Morris, M. Living with voices: 50 stories of recovery. Birmingham City University: PCCS Books.

Green, C. A., Estroff, S. E., Yarborough, B. J., Spofford, M., Solloway, M. R., Kitson, R. S., & Perrin, N. A. (2014). Directions for future patient-centered and comparative effectiveness research for people with serious mental illness in a learning mental health care system. Schizophr Bull, 40(S1), S1-S94.

Holanda, A. F. (2009). A perspectiva de Carl Rogers acerca da Resposta Reflexa. Revista do NUFEN, 1(1), 40-59.

Johns, L., Kompus, K., Connell, M., Humpston, C., Lincoln, T., Longden, E., Preti, A., Alderson-Day, B., Badcock, J. C., Cella, M., Fernyhough, C., McCarthy-Jones, S., Peters, E., Raballo, A., Scott, J., Siddi, S., Sommer,I., & Larøi, F. (2014). Auditory verbal hallucinations in persons with and without a need for care. Schizophr Bull, 40, S255-S264.

Kalhovde, A. M., Elstad, I., & Talseth, A. G. (2013). Understanding the experiences of hearing voices and sounds others do not hear. Qualitative Health Research, 23(11), 1470-1480.

Kråkvik, B., Larøi, F., Kalhovde, A. M., Hugdahl, K., Kompus, K., Salvesen, Ø., & Vedul-Kjelsås, E. (2015). Prevalence of auditory verbal hallucinations in a general population: A group comparison study. Scandinavian Journal of Psychology, 56, 508-515.

Larøi, F., Sommer, I. E., Blom, J. D., Fernyhough, C., Hugdahl, K., Johns, L. C., McCarthy-Jones, S., Preti,A., Raballo, A., Slotema, C.W., Stephane, M., & Waters, F. (2012). The characteristic features of auditory verbal hallucinations in clinical and nonclinical groups: state-of-the-art overview and future directions. Schizophr Bull, 38(4), 724-733.

Longden, E., Corstens, D., Escher, S., & Romme, M. (2012). Voice hearing in a biographical context: a model for formulating the relationship between voices and life history. Psychosis, 4, 224–234.

Longden, E., Corstens, D., & Dillon, J. (2013). Recovery, discovery and revolution: the work of Intervoice and the hearing voices movement. In: Madness contested: power and practice. Coles, S., Keenan, S., & Diamond, B. Ross-on-Wye: PCCS Books.

Martins, F. (2003). Psicopathologia II: Semiologia Clínica: Investigação Teórico Clínica das Síndromes Psicopatológicas Clássicas. Brasília: Universidade de Brasília.

Merhy, E.E. (2007). Os CAPS e seus trabalhadores: no olho do furacão antimanicomial. Alegria e alívio como dispositivos analisadores. In: Merhy EE, Amaral H, organizadores. A reforma psiquiátrica no cotidiano II. São Paulo: Hucitec.

Muñoz, N.M., Serpa Jr, O.D., Leal, E.M., Dahl, C.M., & Oliveira, I.C. (2011). Pesquisa clínica em saúde mental: o ponto de vista dos usuários sobre a experiência de ouvir vozes. Estudos de Psicologia, 16(1), 83-89.

Nuevo, R., Chatterji, S., Verdes, E., Naidoo, N., Arango, C., & Ayuso-Mateos, J.L. (2012). The continuum of psychotic symptoms in the general population: a cross-national study. Schizophr Bull., 38(3), 475-85.

Rogers, C.R., & Kinget, G.M. (1977). Psicoterapia e Relações Humanas, v. 2. Belo Horizonte: Interlivros.

Romme, M. (2009a). Hearing voices groups. In: Romme, M., Escher, S., Dillon, J., Corstens, D., & Morris, M. Living with voices: 50 stories of recovery. Birmingham City University: PCCS Books.

Romme, M. (2009b). What causes hearing voices? In: Romme, M., Escher, S., Dillon, J., Corstens, D., & Morris, M. Living with voices: 50 stories of recovery. Birmingham City University: PCCS Books.

Ruddle, A., Mason, O., & Wykes, T. (2011). A review of hearing voices groups: Evidence and mechanisms of change. Clinical psychology review, 31(5), 757-766.

Sommer, I.E., Slotema, C.W., Daskalakis, Z.J., Derks, E.M., Blom, J.D., & van der Gaag, M. (2012). The treatment of hallucinations in schizophrenia spectrum disorders. Schizophr Bull, 38(4), 704–714.

Vasconcelos, E. M. (2013). Manual [de] ajuda e suporte mútuos em saúde mental: para facilitadores, trabalhadores e profissionais de saúde e saúde mental. Brasília: Ministério da Saúde, Fundo Nacional de Saúde.

Yalom, I., & Leszcz, M. (2006). Psicoterapia de grupo: Teoria e prática. Porto Alegre: Artmed.

Zimmerman, D.E. (2007). Fundamentos básicos das grupoterapias [recurso eletrônico]. 2. ed. Porto Alegre: Artmed. Disponível em: https://books.google.com.br

Publicado
2018-04-29
Como Citar
Fernandes, H. C. D., & Zanello, V. (2018). O GRUPO DE OUVIDORES DE VOZES: DISPOSITIVO DE CUIDADO EM SAÚDE MENTAL. Psicologia Em Estudo, 23, 117-128. https://doi.org/10.4025/psicolestud.v23i0.39076
Seção
Artigos originais

 

0.3
2019CiteScore
 
 
7th percentile
Powered by  Scopus

 

 

0.3
2019CiteScore
 
 
7th percentile
Powered by  Scopus