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Posturas e imposturas: o estilo de Lacan e sua utilização da matemática

Resumos

Visa-se analisar as críticas dirigidas por A. Sokal e J. Bricmont, na obra Imposturas intelectuais, ao estilo de J. Lacan e à utilização que este faz das ciências matemáticas. Sustenta-se que o desconhecimento de conceitos psicanalíticos faz com que tais críticas não atinjam seu alvo. São discutidas questões de estilo, com base na posição de J. Lacan, avesso ao estilo pedagógico por razões intrínsecas à própria psicanálise. No que concerne às questões de conteúdo, defende-se a idéia de que os críticos apoiam-se em uma concepção de matemática que, além de não ser única, difere daquela adotada pelo psicanalista. Considera-se que houve, por parte dos críticos, negligência intelectual em relação ao programa de pesquisas de J. Lacan. Conclui-se que a popularidade da obra Imposturas intelectuais, no que diz respeito exclusivamente às críticas endereçadas a J. Lacan, não decorre da aplicação de critérios acadêmicos e intelectuais. Sugere-se, segundo uma hipótese lacaniana, que a fonte do sucesso de Sokal e J. Bricmont reside na satisfação com a zombaria.

estilo de Lacan; uso da matemática em Lacan; críticas de Sokal e Bricmont


Postures and impostures: Lacan's style and the use of mathematical science. The purpose of the present work is to examine the criticism to J. Lacan's style and his use of mathematical sciences made by A.Sokal and J.Bricmont in Intelectual impostures. It argues that the lack of knowledge concerning psychoanalytical concepts is the main pitfall of the criticism attempted at and that J.Lacan's position against a pedagogical approach is due to psychoanalytical reasons. The article demonstrates also that Sokal and Bricmont rely on a conception of mathematics that, not being the only one available, does differ from that of the psychoanalyst. The paper goes on to point at intellectual negligence on the part of the critics regarding Lacan's program of research. It concludes by stating that the popularity of Intelectual impostures, in what respects exclusively the criticism to Lacan, does not stem from the intellectual and academic criteria. Following a Lacanian hypothesis, it suggests that the source of Sokal and Bricmont's popularity resides rather in the satisfaction obtained through mockery.

Lacan's style; Lacan's use of Mathematics; Sokal and Bricmont's criticism


TRADUÇÃO

Posturas e imposturas: o estilo de Lacan e sua utilização da matemática

Jason GlynosI; Yannis StavrakakisII

IConferencista no Departmento de Governo da Universidade de Essex; ljglyn@essex.ac.uk

IIPesquisador na School of Politics da Universidade de Nottingham

RESUMO

Visa-se analisar as críticas dirigidas por A. Sokal e J. Bricmont, na obra Imposturas intelectuais, ao estilo de J. Lacan e à utilização que este faz das ciências matemáticas. Sustenta-se que o desconhecimento de conceitos psicanalíticos faz com que tais críticas não atinjam seu alvo. São discutidas questões de estilo, com base na posição de J. Lacan, avesso ao estilo pedagógico por razões intrínsecas à própria psicanálise. No que concerne às questões de conteúdo, defende-se a idéia de que os críticos apoiam-se em uma concepção de matemática que, além de não ser única, difere daquela adotada pelo psicanalista. Considera-se que houve, por parte dos críticos, negligência intelectual em relação ao programa de pesquisas de J. Lacan. Conclui-se que a popularidade da obra Imposturas intelectuais, no que diz respeito exclusivamente às críticas endereçadas a J. Lacan, não decorre da aplicação de critérios acadêmicos e intelectuais. Sugere-se, segundo uma hipótese lacaniana, que a fonte do sucesso de Sokal e J. Bricmont reside na satisfação com a zombaria.

Palavras-chave: estilo de Lacan, uso da matemática em Lacan, críticas de Sokal e Bricmont.

ABSTRACT

Postures and impostures: Lacan's style and the use of mathematical science. The purpose of the present work is to examine the criticism to J. Lacan's style and his use of mathematical sciences made by A.Sokal and J.Bricmont in Intelectual impostures. It argues that the lack of knowledge concerning psychoanalytical concepts is the main pitfall of the criticism attempted at and that J.Lacan's position against a pedagogical approach is due to psychoanalytical reasons. The article demonstrates also that Sokal and Bricmont rely on a conception of mathematics that, not being the only one available, does differ from that of the psychoanalyst. The paper goes on to point at intellectual negligence on the part of the critics regarding Lacan's program of research. It concludes by stating that the popularity of Intelectual impostures, in what respects exclusively the criticism to Lacan, does not stem from the intellectual and academic criteria. Following a Lacanian hypothesis, it suggests that the source of Sokal and Bricmont's popularity resides rather in the satisfaction obtained through mockery.

Keywords: Lacan's style, Lacan's use of Mathematics , Sokal and Bricmont's criticism.

INTRODUÇÃO

Lacan é difícil de ler, sem dúvida nenhuma. Sobre isso, pelo menos, simpatizantes e detratores de Lacan estão de acordo. Evidentemente, dizer que com as ciências matemáticas acrescentadas à equação as coisas não se tornam mais fáceis, é querer atenuar os fatos. A maioria das pessoas se sente insegura diante da mais simples demonstração matemática, quanto mais ao se tratar de referências a subdivisões com nomes que parecem esotéricos como topologia e teoria nodal...

Quando pesquisamos a composição do universo, das galáxias e supernovas distantes, até as células, sinapses e quarks, não nos surpreendemos ao nos depararmos com um discurso estranho para nós. O discurso científico é, em geral, opaco e cheio de um jargão impenetrável que só se consegue dominar à custa de muito tempo e força de vontade.

As pessoas não esperam compreender mecânica quântica e admitem tranqüilamente sua ignorância. Por outro lado, quando pesquisamos a natureza humana, processos psíquicos, identidades e emoções, e as atividades mentais, esperamos que os modelos e discursos correspondentes sejam facilmente compreensíveis. Isso porque eles deveriam estar nos dizendo algo sobre nós mesmos — e sobre esse algo, em outras palavras, julgamos ter direitos e conhecimentos. Trata-se de uma suposição natural profundamente arraigada. Tanto é assim que até mesmo os cientistas expressam frustração diante da relutância da mente em revelar os seus segredos. Portanto, quando a psicanálise lacaniana — que se propõe a ser esse tipo de discurso sobre nós mesmos — dá a impressão de fazer todos os esforços possíveis para impedir uma compreensão clara, quando Lacan não hesita nem um instante em recrutar a matemática para a sua causa, isso chega a parecer ofensivo.

Ninguém gosta de se sentir pouco inteligente. São raríssimas as pessoas que, tendo lutado para entender os Écrits de Lacan, não tenham se sentido vulneráveis intelectualmente. Essa vulnerabilidade torna-se exacerbada quando um seminário ou ensaio lacaniano é recomendado como material de leitura por um amigo ou professor respeitado. Vulnerabilidade que pode se transformar rapidamente em frustração, intimidação e até mesmo cólera.

É só imaginar então o que aconteceria se alguém aparecesse declarando que Lacan é um impostor. Suponhamos que, além do mais, esse "alguém" fosse nada menos do que um cientista de renome. Artigos, noticiários, editoriais e programas de rádio seriam de repente invadidos pela descoberta de que "o imperador está nu"; de que o discurso difícil, até mesmo tortuoso de Lacan nada mais é do que um exercício de obscurantismo em nível de Joyce; de que as incursões matemáticas de Lacan não têm nada a ver com psicanálise. Imagine o alívio e a satisfação! Em uma sociedade dominada pela necessidade de comunicação resumida e de impacto, pode-se agora, com a consciência tranqüila, deixar de lado esse livro pesado.

Esta história não é só uma história. É uma história que até certo ponto explica a popularidade de um best-seller escrito recentemente por Alan Sokal e Jean Bricmont (de agora em diante chamados S&B), intitulado Imposturas intelectuais (S&B, 1998). Nesse livro os autores, ambos cientistas, criticam a maneira como a matemática é invocada nas obras de um grande número de intelectuais franceses: Kristeva, Irigaray, Latour, Baudrillard, Deleuze & Gattari, Virilio e Lacan.

Alan Sokal, professor de física da Universidade de Nova York (NYU), tomou para si a tarefa de defender uma concepção ortodoxa do discurso científico contra um aparente ataque vindo do cenário intelectual francês — ataque esse que adquiriu status hegemônico em certos círculos acadêmicos do Ocidente. Iniciou seu contra-ataque escrevendo um artigo propositadamente espúrio sobre os hermenêuticos da gravidade quântica, o qual ofereceu para publicação. Uma vez aceito e publicado o artigo no jornal Social Text (SOKAL, 1996a), ele imediatamente revelou que se tratava de embuste — o chamado 'embuste de Sokal' (SOKAL, 1996b) — acendendo assim um interessante e proveitoso debate internacional sobre os padrões intelectuais dos setores acadêmicos pós-modernos.1 1 Ver sobre isso Aronowitz (1997), Robbins (1996). Imposturas intelectuais, no entanto, tenta levar a questão ainda mais longe, sendo portanto o ponto alto do projeto inicial de seu autor.

Em contraste direto com a obra de Jacques Lacan, Imposturas intelectuais é um livro fácil de ler e até divertido. Os capítulos, cada um dedicado a um intelectual francês, contêm trechos interligados com comentários sucintos, muitas vezes na forma de interjeições irônicas.

Concentraremos, aqui, nossa atenção especialmente no capítulo sobre Lacan. Colocaremos em questão as observações críticas de S&B, as quais visam solapar a legitimidade do estilo de Lacan e sua utilização da matemática. Mas o nosso objetivo é meticulosamente delimitado. Não afirmamos que Lacan é fácil ou divertido de ler. Não oferecemos explicações detalhadas de conceitos lacanianos. Não demonstramos (exceto indiretamente) que novas percepções e maneiras de pensar ele usa para lidar com questões de processos mentais. Também não damos razões para acreditar que vale a pena fazer muito esforço para entendê-lo. Nosso argumento em grande parte se restringe a mostrar por que as acusações de S&B não são válidas, tomando-se como base não só os padrões de integridade intelectual em geral aceitos, mas também os padrões que eles mesmos escolheram.

ARMANDO O PALCO

No prefácio da edição inglesa de Imposturas intelectuais, Sokal e Bricmont, 1998, visam dois alvos distintos:

1. Intelectuais que, alegam eles, abusam dos conceitos científicos e matemáticos. O fato de que se valem do verbo "abusar" sem dúvida assinala a seriedade da acusação; e afirmam que essa injúria toma pelo menos duas formas não necessariamente não relacionadas. Ou esses conceitos são invocados "sem a menor justificativa" (p. IX) no tocante à questão que está sendo discutida, ou então são jogados de qualquer maneira a fim de corroborar suas afirmações (vis-à-vis seu público predominantemente não científico) sem "qualquer consideração pela relevância ou sequer pelo significado." (p. IX-X)

2. O relativismo epistemológico da "ciência pós-moderna, a noção de que a ciência moderna não passa de um 'mito', uma 'narração' ou uma 'construção social' entre muitos outros." (p. X)

Naturalmente os dois alvos não podem ser sempre encontrados na obra de cada um dos autores que eles escrutinam. O segundo alvo, por exemplo, não é encontrado na obra de Lacan. Podemos então começar por estabelecer um ponto de convergência entre o status da ciência no entender de S&B e a ciência no entender de Lacan. Slavoj Zizek trata justamente desse ponto no seguinte parágrafo:

"Qual é essencialmente a diferença entre os narrativistas pós-modernos e Lacan? Talvez a melhor maneira de abordar a questão seja através da brecha que separa o universo moderno da ciência do conhecimento tradicional: para Lacan, a ciência moderna não é simplesmente uma outra narrativa local enraizada em suas condições pragmáticas específicas, uma vez que tem relação com o Real (matemático) que se encontra sob o universo simbólico." (ZIZEK, 1997, p. 159)

Se é verdade que diante disso seria possível interpretar a posição de Lacan como de apoio ao ataque de S&B contra o relativismo epistemológico,2 2 Naturalmente não estamos sugerindo que existam razões em comum que levem a essa (o)posição compartilhada. já encontramos nesse mesmo parágrafo o indício sutil de uma divergência de opinião mais explícita, isto é, o recurso a um Real matemático. Afinal de contas, Lacan é bem explícito ao declarar, em nome da psicanálise, que "a formalização [m]atemática é nossa meta, nosso ideal" (LACAN, 1988, p. 119) — o que, talvez deva ser ressaltado, não é a mesma coisa que dizer que é o único ou mesmo o principal ideal da psicanálise. De qualquer forma, isso evidencia o papel central que Lacan dá à formalização matemática em sua tentativa de estabelecer um caminho pelo qual a psicanálise possa ser considerada científica.3 3 Mas como Lacan insiste em dizer, a alegação de que a psicanálise é (ou ambiciona ser) científica não deveria ser confundida com uma alegação semelhante porém diferente, segundo a qual a psicanálise é uma ciência, pelo menos da mesma forma que a física é tradicionalmente considerada uma ciência. Ver, por exemplo, Lacan (1989). Como S&B também observaram, "A predileção de Lacan pela matemática não é de maneira alguma marginal em sua obra." (S&B, 1998, p. 23)

Contudo, assim que excluímos Lacan da segunda classe de alvos de S&B, estamos dando a entender o porquê de ser ele a sua principal bête noire. Porque é justamente esse recurso à matemática que, segundo Imposturas intelectuais, traz Lacan para o rol dos alvos de primeira classe: Lacan abusa dos conceitos científicos e matemáticos.

Porém de que modo, exatamente, Lacan abusa das noções matemática? A fim de determinar de que espécie de abuso Lacan parece ser culpado, S&B fazem o favor de compilar uma lista de quatro significados do termo "abusar" na introdução a Imposturas intelectuais:

1. Expor longas teorias científicas sobre as quais o autor tem, na melhor das hipóteses, noções muito vagas. A tática mais comum é o uso de terminologia científica (ou pseudocientífica) sem muita preocupação com o verdadeiro significado das palavras.

2. Introduzir conceitos das ciências naturais nas ciências sociais ou humanas sem oferecer a menor justificativa conceptual ou empírica. Se uma bióloga desejasse usar em sua pesquisa noções elementares de topologia matemática, teoria de conjunto ou geometria diferencial, ela seria convidada a dar alguma explicação. Uma analogia vaga não seria levada a sério por seus colegas. Aqui, pelo contrário, ficamos sabendo através de Lacan que a estrutura do neurótico é exatamente toro (nada menos do que a própria realidade)...

3. Revelar uma erudição superficial jogando descaradamente termos técnicos em um contexto em que são absolutamente irrelevantes. O objetivo sem dúvida é impressionar a todos e, acima de tudo, intimidar o leitor não cientista...

4. Manipular locuções e frases sem sentido. Alguns dos autores revelam uma verdadeira intoxicação com palavras, combinada com uma suprema indiferença por seu significado. (Idem, p. 4)

Por fim, no começo do capítulo dedicado a Lacan, S&B afirmam que ele "ilustra perfeitamente, em diferentes partes de sua obra, os abusos da lista..." (p. 17). E na conclusão do mesmo capítulo, S&B declaram que Lacan "se sobressai... no segundo tipo de abuso da lista [acima]." (p. 34)

O propósito de nosso pequeno comentário será levantar dúvidas quanto à crítica feita a Lacan por S&B, demonstrando de que forma estes últimos erram o alvo; e isso devido em grande parte à ignorância (reconhecida) de S&B em relação aos conhecimentos psicanalíticos. Organizamos nossos comentários em torno de questões de estilo e conteúdo.

QUESTÕES DE ESTILO

Uma das críticas mais comuns a Lacan, muito antes do aparecimento de S&B no cenário das "guerras da ciência", é dirigida ao seu estilo (ver, por exemplo, ROUSTANG, 1982, 1990). S&B adotam essa linha e apresentam uma versão específica dela. A certa altura, por exemplo, S&B afirmam que o relato de Lacan não é "pedagógico do ponto de vista matemático" (p. 29). Apesar desse comentário ter sido feito em relação a "Da estrutura como o amálgama de um pré-requisito do Outro a qualquer sujeito que seja" (LACAN, 1970), S&B dão a entender que a afirmação pode ser aplicada ao estilo de Lacan em geral. Isso fica claro quando S&B perguntam, por exemplo, como poderá o não-cientista (ou não-matemático) saber se o relato de Lacan e sua utilização da matemática são claros ou mesmo corretos (p. 11); ou quando S&B sugerem que intelectuais em geral "deveriam explicar as noções técnicas necessárias tão claramente quanto possível, em termos acessíveis ao leitor-alvo (que se presume não seja cientista)" (p. 8); ou quando S&B dizem que "[n]ão é dele que o aluno vai aprender o que é um número natural ou um conjunto compacto"; (p. 34) ou mesmo quando S&B se perguntam se Lacan está "tentando impressionar seu público com uma erudição superficial" (p. 29).

Como já dissemos, muitas pessoas, na verdade lacanianos, gostariam de concordar com a afirmação de que grande parte do que Lacan disse e escreveu é muito difícil de entender. Isso é verdade não só em relação à sua concepção e utilização de idéias científicas e matemáticas, como também em relação às suas análises da literatura de outras disciplinas (psicanálise, ciências humanas, ciências sociais, etc.). Seria possível, portanto, chegar-se à conclusão de que S&B fizeram um ponto com a maior facilidade: Lacan é um pedagogo ruim!

Mas isso é mesmo verdade? Faria alguma diferença à acusação de S&B se Lacan nunca tivesse declarado seus objetivos pedagógicos? Provavelmente não. Embora ele às vezes facilitasse as coisas,4 4 Em topologia de superfície ver, por exemplo, Lacan em geral (1961-2). Para uma discussão sobre números complexos, ver o seu seminário de 10 de janeiro, 1962. dava a entender claramente que o seu público (vindo de diversos setores disciplinares), se assim o desejasse, devia tomar a iniciativa e fazer investigações nas direções de pesquisa recomendadas por ele.

Faria alguma diferença se Lacan por princípio se posicionasse contra o discurso de estilo pedagógico? Seria então certo acusá-lo de não ser bastante pedagógico? Se parece que Lacan toma deliberadamente uma posição, então esperar-se-ia que S&B no mínimo apresentassem razões para considerar a pedagogia um ideal digno de ser almejado em certos casos, em vez de partir da premissa de que tais razões são conhecidas.

Na verdade, acontece que Lacan tinha uma opinião extremamente crítica do discurso de estilo pedagógico,5 5 Sobre isso, ver Lacan (1969-70). sempre aconselhando o seu público a rejeitar uma compreensão rápida demais. Isso não quer dizer que Lacan acreditasse que a pedagogia não tem lugar em nossa sociedade, um ponto de vista obviamente absurdo; apenas se abstinha deliberadamente de usá-la em seus seminários e escritos. Consideremos, por exemplo, a seguinte citação: "Não fico surpreso com o fato de que meu discurso possa causar uma certa margem de equívoco", mas isso é feito "com uma intenção expressa, absolutamente deliberada, pois eu adoto esse discurso de uma forma que oferece a vocês a oportunidade de não compreendê-lo completamente" (Como citado em Samuels, 1993, p. 16). Ou: "vocês não são obrigados a compreender os meus textos. Se não os compreendem, melhor — isso lhes dará a oportunidade de explicá-los" (LACAN, 1998, p. 34).

A estratégia empregada por S&B depende da reação instintiva do público a citações como essas, freqüentemente usadas fora de contexto. Essas afirmações parecem obviamente absurdas apenas quando se esquece como o estilo de Lacan é estreitamente ligado às suas preocupações teóricas e clínicas. É sempre bom lembrarmo-nos disso. Em uma sociedade estruturada pela repressão exercida pelo fator tempo e pela necessidade de eficiência, é natural que se exijam explanações fáceis de digerir com rapidez. Tornou-se segunda natureza esperar instruções ou roteiros claros sobre como realizar tarefas ou ser mais feliz. Entretanto, Lacan está preocupado antes de tudo com o que acontece na clínica, os seminários e escritos são dirigidos principalmente aos analistas. São essas preocupações que dão origem às suas afirmações sobre equívocos.

Por que deveria ele se dar ao trabalho de aconselhar seu público a rejeitar uma compreensão rápida demais? Exatamente porque teme que os analistas sejam tentados a compreender seus pacientes depressa demais. E o que significa "compreender"? Compreender alguma coisa significa traduzir um termo para outros termos já nossos conhecidos. Isso quer dizer, para Lacan, que ao compreender o discurso de um paciente os analistas só compreendem o que conhecem. Em vez de avaliar o paciente em sua singularidade, em vez de estarem abertos para algo novo e diferente, os analistas efetivamente reforçam seu próprio autoconhecimento.

Sem dúvida é inquietante ser confrontado com algo que não se pode compreender de imediato. Sem dúvida é confortador acreditar que nos compreendemos uns aos outros e que todos compartilhamos certas aspirações e padrões de moralidade. Porém, Lacan declara, isso tem um preço. O preço que pagamos por confiar indevidamente na compreensão imediata é uma aceitação irrefletida de premissas das quais nos habituamos a depender e que já não necessitam de justificativa. Pensemos, por exemplo, no ideal da pedagogia. Esse ideal é muitas vezes aceito como indiscutível, sem necessidade de justificativa.

No fim das contas, o argumento de Lacan é de natureza ética, para ser usado não unicamente na clínica, mas no trabalho teórico e na vida quotidiana também. Tem a ver com cada um sendo responsável por sua própria compreensão, em vez de depender de um consenso. E a estratégia que ele decidiu adotar nesse sentido envolvia a criação sistemática de certa margem de não-compreensão. Ele reconheceu nessa estratégia um potencial de produtividade — produtivo em termos de gerador de um desejo de compreensão responsável e em termos de gerador de pesquisa. Resumindo, Lacan não está celebrando equívocos. O que ele está é apresentando um argumento a favor de compreensão responsável. Como diz Fisk, Lacan

"procura obter certos efeitos no leitor que não sejam efeitos de significado: ele procura nos despertar, nos provocar, nos perturbar — não nos embalar e sim nos sacudir para fora de nossas rotinas conceptuais. Consequentemente, sua intenção é nos fazer trabalhar, nos lembrar que não compreendemos o que pensamos que compreendemos (sejam os textos de Freud que dão a ilusão de serem fáceis, ou os discursos de nosso analisando), e que talvez tenhamos que fazer várias tentativas para expressar ou conceituar algo, e mesmo assim nossa interpretação será apenas aproximadamente correta: ainda assim erraremos o alvo." (FISK, 1997, p. 220)

Mas mesmo se ignorarmos a ausência de qualquer esforço por menor que seja para rebater a oposição por princípio de Lacan ao discurso de estilo pedagógico, os argumentos de S&B contra ele não se tornam nem um pouco mais convincentes. Suponhamos, hipoteticamente, que S&B acusam Lacan de usar um estilo difícil, não pedagógico. Acusar Lacan disso, insinuando dessa forma que ele não tem nada de útil a dizer sobre matemática em relação à psicanálise, seria um erro de categoria. Seria o mesmo que ridicularizar o trabalho de um eminente físico de vanguarda por ele ou ela não querer, ou não poder, apresentar um discurso pedagógico. S&B estariam efetivamente derrubando uma questão de estilo em cima de uma questão de conteúdo.

Todos concordamos que quem se familiariza com cursos preparatórios relevantes é capaz de seguir melhor um seminário de física superior. Seria tão surpreendente saber que quem se familiariza com os seminários de Lacan das décadas de 50 e 60 sente-se mais à vontade com seus escritos e seminários da década de 70? Seguindo esse raciocínio, cada um de seus 25 seminários podem ser vistos como que edificados sobre (mesmo se às vezes no sentido de reação contra) material produzido em seminários anteriores, sem falar na literatura (contemporânea ou não) com que Lacan constantemente se envolvia. Na verdade, como se sabe, seus primeiros trabalhos escritos sobre complexos familiares e criminologia, ou seus primeiros seminários, são muito acessíveis, em estilo quase anglo-saxão (ver por exemplo LACAN, 1996). Desse ponto de vista, é perfeitamente compreensível — embora não inevitável — que com o passar dos anos o estilo de Lacan, em virtude da bagagem de conhecimentos antes adquiridos, e com a qual ele contava até certo ponto, parecia tornar-se progressivamente mais obscuro. Da mesma forma que um seminário ou um livro de nível superior sobre mecânica quântica ou economia pode parecer, para alguém ignorante do assunto, impressionante e assustador ou um palavreado superficial e sem sentido, o mesmo acontece com muitos dos últimos seminários e textos psicanalíticos de Lacan. Apesar de Lacan ter sido freqüentemente explícito em suas referências a seminários passados, essas referências eram também muitas vezes implícitas, óbvias apenas para os que conheciam seus ensinamentos anteriores. Sendo assim, não nos surpreende saber de escolas lacanianas de psicanálise que dedicam, como coisa natural, um seminário de ano inteiro à discussão, parágrafo por parágrafo, de até mesmo um texto curto de vinte páginas. Nesse contexto, talvez seja relevante citar a intervenção de Anthony Wilden na discussão que se seguiu a "Da estrutura como o amálgama ...". Referindo-se à dificuldade em compreender a apresentação, ele se dirige a Lacan declarando "o senhor começou de cima (do ponto mais difícil de sua obra), e é muito difícil para nós reconhecer as origens do seu pensamento... Na minha opinião... é absolutamente necessário para nós ler os que o senhor escreveu antes de dizer um monte de bobagens..." (LACAN, 1970, p. 196).

Esse método de ler Lacan é conduzido com a maior atenção a detalhes, não só porque os seus seminários são produto de um trabalho de revisão e seleção (a partir de uma coleção de cópias); como também (de uma perspectiva não francesa) por causa dos muitos problemas que surgem devido ao processo de tradução. Em outras palavras, os acadêmicos, assim como os que estão em fase de treinamento, desenvolvem compreensão e opinião crítica do texto após um período de estudo difícil e prolongado. Isso não garante de maneira alguma uma compreensão satisfatória ou convincente — a verdade é que a psicanálise pode ser abandonada por completo depois de vários anos de uma luta aparentemente inútil. Acontece que a física matemática também pode ser abandonada após uma longa luta igualmente árdua com a matéria.

Chegamos à conclusão de que o estilo de Lacan é perfeitamente compatível com os seus declarados objetivos e interesses. Não há dúvida de que se pode discordar das razões que o levam a adotar esse estilo específico, entretanto, como essas razões se originam diretamente de preocupações teóricas, clínicas e éticas, S&B teriam, antes de mais nada, que trabalhar um pouco. Eles erigem como único e indiscutível critério de avaliação um estilo pedagógico tradicional, cuja ausência usam freqüentemente como prova do abuso praticado por Lacan contra importantes conhecimentos consagrados. Pagam um alto preço. Porque não sabem quem Lacan é, além do homem de palha que eles apresentam de maneira muito divertida. Representam perfeitamente a idéia lacaniana de que "compreender uma pessoa depressa demais é não compreendê-la." O que não explicam é como Lacan conseguiu, sem baixar o nível de seu discurso, não apenas ser, como dizem S&B, extraordinariamente influente (p. 194), pelo menos no mundo franco-hispânico, como também, o que é mais importante, iniciar uma cadeia de programas produtivos de pesquisa, no campo de análise infantil, em topologia lacaniana, na questão do fim da análise, e assim por diante — algo que até mesmo a IPA, que "excomungou" Lacan em 1963, é forçada a admitir mais abertamente hoje em dia.6 6 Uma indicação desse tipo de abertura dialogal pode ser encontrada na discussão recente entre J-A. Miller e R.H. Etchegoyen em Miller e Etchegoyen (1996).

QUESTÕES DE CONTEÚDO

Embora seriamente deficiente em pesquisa e auto-reflexão, as objeções de S&B ao estilo de Lacan expressam um receio aparentemente válido. Lacan é explícito ao dar-nos a oportunidade de não compreendê-lo por completo, e abre a possibilidade de que sejamos inteiramente responsáveis tentando explicá-lo. O que então o impediria de empregar referências obscuras às ciências matemáticas a fim de se fortalecer como Mestre? O que o impediria de servir-se de seu estilo como de um conveniente álibi para o uso espúrio da matemática, não se sentindo assim nem um pouco obrigado a justificar a relação entre a matemática e a psicanálise? Não deviríamos nós, como cientistas matemáticos, desiludir esses coitados que insistem em levar Lacan a sério? É este o raciocínio implícito de S&B. Nós, portanto, vamos das questões de estilo às objeções mais baseadas em questões de conteúdo, quer dizer, o conhecimento e utilização por Lacan das ciências matemáticas de um lado, e, por outro lado, a alegada irrelevância da matemática de Lacan para a psicanálise.

Em sua introdução, S&B fazem a afirmação generalizada de que "em casos de uso legítimo, o autor precisa ter um bom entendimento da matemática que se propõe a usar — principalmente não deve haver erros crassos..." (p. 8). Naturalmente S&B dão a entender que Lacan não é tão propenso a esse tipo de abuso. Isso se torna evidente quando contrastam sua análise de Lacan com a de, digamos, Kristeva.7 7 Não temos a pretensão de conhecer o trabalho de Kristeva o suficiente para poder julgar sua utilização da matemática. Simplesmente relatamos a avaliação de S&B. Em sua análise de Lacan eles evitam claramente fazer a acusação de erros óbvios ou persistentes, o que não acontece na análise de Kristeva (p. 39). Trata-se mais do fato de que a matemática de Lacan parece "bizarra" (p. 34), sem dúvida devido ao exegese que a acompanha e que o próprio Lacan admite ser difícil. Nesse particular, "suas afirmações, quando compreensíveis, não são sempre falsas" (p. 34) — na verdade, S&B às vezes declaram de má vontade que as afirmações de Lacan "não são de todo ruins" (p. 26). Os problemas surgem quando a ligação entre suas afirmações matemáticas e a teoria psicanalítica é pouco clara.

Lacan sem dúvida confundia às vezes os termos em seu discurso, dando detalhes incorretos de definições matemáticas e/ou teoremas.8 8 Ver, por exemplo, Lacan (1998-9), onde ele erroneamente afirma que um conjunto aberto e o que exclui seus próprios limites. Na verdade, muitos lacanianos têm feito questão de assinalar vários erros como esse. No contexto de uma comunicação no estilo de seminário isso talvez seja de se esperar. Levando-se em conta que ele recorreu com freqüência à matemática durante 25 anos, é surpreendente que, tendo em vista sua noção supostamente "nebulosa" (p. 4) ou "vaga" (p. 13, 14) de matemática e ciência, ele tenha cometido tão poucos erros facilmente identificáveis. Entretanto, não estamos afirmando aqui que Lacan era um perfeito conhecedor da matemática. De qualquer maneira, a principal acusação de S&B é que o uso que Lacan fazia da matemática era inadequado e irrelevante para a psicanálise.

Em relação a isso é interessante notar como S&B, na introdução de Imposturas intelectuais, defendem-se de uma possível acusação de que poderiam estar examinando as afirmações matemáticas de Lacan fora de contexto. O argumento que usam em sua própria defesa é de que os conceitos matemáticos têm significados muito exatos. Já vimos que Lacan sofre do suposto defeito de não ser bastante pedagógico. Em outras palavras, ele não explica de modo claro e em separado conceitos matemáticos como tais, pelo menos não detalhadamente nos textos a que S&B se referem. Em vez disso, Lacan vai direto para a interpretação de símbolos matemáticos de um ponto de vista psicanalítico. Por isso é muito difícil julgar seu conhecimento de matemática ou o que ele pretende fazer com esse conhecimento. Assim fica muito fácil para alguém que não conheça o contexto psicanalítico no qual as afirmações matemáticas de Lacan aparecem, tirar a conclusão apressada de que Lacan "violenta a matemática" (p. 25), ou de que ele procura impressionar seu público com uma terminologia sofisticada como "união (em lógica matemática)" (p. 33), ou que seu recurso à dinâmica em ciência matemática (teorema de Stoke) é "especialmente despudorado" (p. 3), ou confrontar uma afirmação como a gravitação sendo "o inconsciente da partícula" com um espanto mudo (por meio de um ponto de exclamação) (p. 33).9 9 Nesse sentido S&B apenas reiteram, no campo da ciência matemática, uma acusação estrutural homóloga segundo a qual "Lacan está violentando a lingüística" (um argumento freqüente diante do fato de que Lacan se apropria dos conceitos de Jakobson relativos à metáfora e à metonímia)ou "Lacan está violentando Freud". Com relação a essas últimas questões ver Stavrakakis (1999, p. 21-2, 57-9)

Com certeza a hostilidade de S&B ao uso que Lacan faz da matemática é também uma conseqüência do modo específico como vêem a matemática. Partem do princípio, por exemplo, de que afirmações matemáticas têm significados únicos. Porém, essa concepção só pode originar-se de uma única perspectiva em relação à matéria. É preciso reconhecer que, além de intuitivamente atraente, essa perspectiva é capaz de aproveitar o modo com que o senso comum pensa as matemáticas. Contudo, baseia-se em uma analogia subdesenvolvida com uma visão igualmente subdesenvolvida de significados lingüísticos. É bom notar a esse respeito que Lacan dedicou muito tempo e esforço à articulação de conceitos tais como analogia e significado em relação a muita literatura sobre filosofia da ciência e matemática. De acordo com Lacan, a matemática ocupa um loco privilegiado nos limites da linguagem. Segundo esse ponto de vista, a matemática é essencialmente desprovida de significado: "A formalização matemática de significação é o oposto de significado... Em nosso tempo, filósofos da matemática dizem 'não significa coisa nenhuma' no tocante à matemática, mesmo quando são matemáticos como Russell." (LACAN, 1998, p. 93).10 10 A esse respeito talvez valha a pena lembrarmos o que Feynman tinha a dizer no tocante à mecânica quântica: É por isso, afinal de contas, que rabiscos idênticos no papel podem adquirir significados muito diferentes dependendo do âmbito de sua aplicação (e portanto interpretação). O fato de que o físico Richard Feynman tenha salientado que mecânica quântica não pode ser compreendida também é relevante neste contexto — ela simplesmente "funciona" (FEYNMAN, 1995, p. 117).

Recorrer à matemática e à física pode realmente resultar em aceitação incondicional por parte dos que não são versados nas ciências matemáticas (usando de vez em quando, por exemplo, citações e um vocabulário que pareça dar cobertura científica às afirmações [S&B, 1998, p. 13]). Isso, entretanto, acontecerá entre os que não tenham querido ou podido consultar textos introdutórios relevantes. Não adianta negar que esse tipo de coisa acontece muito em seminários acadêmicos sobre Lacan, nos quais o estudo de lingüística e matemática não é necessariamente incentivado ou mesmo sugerido.

Nada disso, contudo, atinge a integridade do uso que Lacan faz da matemática. Em seu prefácio, S&B expressam (com certeza prendendo o riso) o seguinte desejo: "Não seria ótimo (para nós matemáticos e físicos, bem entendido)... se a topologia tivesse algo a ver com a psique humana?" (p. X) Mas nenhuma ironia pode explicar o simples fato de matemáticos profissionais serem atraídos para o estudo da psicanálise lacaniana; ou explicar as muitas elaborações de relevantes noções matemáticas como a topologia lacaniana. Inclusive, S&B fazem referência aos "discípulos de Lacan (os quais) têm produzido relatos completos de sua topologie psychanalytique." (p. 23) O estranho é que está faltando — estranho justamente por sua ausência óbvia — qualquer comentário que diga se essas anotações expositoras dos discípulos chegam a esclarecer, tornando-a mais explícita, a intuição matemática de Lacan em relação à psicanálise. Isso seria no mínimo um teste ideal para determinar se as incursões de Lacan na matemática podem ser tão facilmente descartadas como um desastroso, triste sonho quixotesco.

As duas declarações seguintes dizem respeito à discussão acima. Na primeira, S&B declaram que o relato matemático de Lacan "[não] é original... do ponto de vista matemático..." (p. 29; frifo nosso). Na segunda, afirmam que a matemática de Lacan "não pode desempenhar um papel produtivo em qualquer análise psicológica séria." (p. 34) Prima facie, é claro, essas declarações correm o risco de deixar o leitor perplexo. A quem cabe julgar a originalidade de trazer noções matemáticas para a psicanálise: à comunidade psicanalítica ou à comunidade matemática?, o leitor, sem dúvida, perguntar-se-á. A resposta óbvia a essa pergunta parece de certa forma emudecer as declarações citadas. Todavia, talvez estejamos nos apressando. Portanto, nos próximos parágrafos consideraremos em detalhe a segunda afirmação antes de nos voltarmos para um estudo mais detalhado da primeira.

Em relação à segunda afirmação, é interessante notar como S&B mais uma vez antecipam, e procuram descartar, uma objeção que eles sentem que será feita de imediato pelo leitor. Vale a pena fazer uma pausa para dar uma atenção mais detalhada à maneira, aparentemente direta, pela qual procuram lidar com essa objeção. S&B admitem abertamente, por exemplo, que "nem é preciso dizer que não temos a competência necessária para julgar os aspectos não científicos da obra desses autores." (p. 6) Mas é justamente por essa confissão parecer ao leitor óbvia e sem problemas que deveríamos exercer pressão neste exato ponto. Pois, certamente, esse tipo de confissão desarmante não pode justificar a substituição de estudos sérios por condenações sumárias. Na verdade, o caráter desarmante da afirmação deveria ser um toque de alerta. Porque no nível estritamente conceptual, essa afirmação conta com uma tese não argumentada, qual seja, a de que é possível julgar os méritos científicos de uma disciplina sem referência ao tipo de questões concretas levantadas pela disciplina. Em outras palavras, S&B sugerem que é possível julgar os méritos científicos da psicanálise sem estar a par das questões e dos conhecimentos gerados pela experiência psicanalítica.

Não seria o mesmo julgar os méritos científicos da física sem estar a par das questões e conhecimentos específicos à disciplina da física? Como, por exemplo, pode alguém julgar a pertinência de noções matemáticas (como teoria de conjunto ou topologia) para uma área particular da física (como a física das partículas elementares) ou da psicanálise (como o processo de sexuação) se esse alguém não está a par das questões e debates que impulsionam a área? Isso sem falar no progresso e significado dos conhecimentos relevantes da física e da psicanálise. A fim de decidir se um físico está interpretando corretamente um área da matemática não se pode deixar de ter experiência e conhecimentos da disciplina. Por que não conferir um status similar a um psicanalista? Como é possível julgar a pertinência de certas noções matemáticas na obra de um autor quando se admite abertamente ao mesmo tempo não compreender o resto da obra do autor (p. 8)? Uma separação tão nítida entre a matemática de Lacan de um lado, e seu impacto produtivo sobre a psicanálise de outro, é realmente simplista demais.11 11 Mas mesmo se aceitamos que S&B "não pretendem julgar a psicanálise de Lacan ... [limitando-se a] fazer declarações sobre as ciências matemáticas e físicas..."(S&B,1998, p. 11), o que devemos pensar de sua tentativa de fazer exatamente isso, a saber, julgar não a matemática de Lacan em si mas o fato de que a matemática dele não pode fazer nenhum papel útil em psicanálise (Idem, p. 34)?

Talvez possamos, no entanto, sugerir um modo viável de fazer sentido da primeira afirmação de S&B segundo a qual é possível julgar a originalidade da utilização da matemática pela psicanálise "de um ponto de vista matemático." Podemos fazer isso valendo-nos de novo de uma homologia estrutural com a física. Afinal de contas, todos nós sabemos que alguns dos aspectos mais originais da matemática foram inventados e aperfeiçoados a partir de conquistas no campo da física. Há uma razão para isso: os físicos são levados a lidar com questões específicas que surgem em sua área de estudo — o uso que um físico faz da matemática é guiado por sua intuição, intuição essa baseada no conhecimento das questões e evidências específicas.

Isso traz à tona a antiga disputa entre matemática pura e aplicada, permitindo assim que consideremos sob um novo ângulo a utilização da matemática por Lacan. É de conhecimento geral o fato de que do ponto de vista da matemática pura, o uso que os físicos fazem da matemática é muitas vezes considerado "desleixado", a ponto de correr o risco de ser condenado como um simples erro. Muitas vezes são os "puristas" os encarregados de pôr em ordem os detalhes matemáticos. De forma homóloga, é a intuição de Lacan (baseada em uma extensa experiência psicanalítica e conhecimento profundo da literatura relevante) que induz Lacan a usos específicos da matemática — algo que pode resultar na invenção de uma nova matemática adequada ao campo da psicanálise. O essencial é que o forte de Lacan seja visto não tanto nas minúcias de detalhes matemáticos mas em sua vigorosa compreensão intuitiva da matemática e das ciências matemáticas em geral, o que oferece direções produtivas para novas pesquisas no campo da psicanálise. Embora seja verdade que não se pode dizer que Lacan tenha inventado uma ramificação bem desenvolvida e claramente definida de matemática lacaniana, matemáticos em círculos lacanianos estão hoje concentrando seus esforços em pesquisas nesse sentido.12 12 Ver, por exemplo, Burgoyne (1999), Morel (1994), Darmont (1990), Vappereau (1985), Granon-Lafont (1985; 1990) e Nasio (1979; 1987). Quanto aos debates a respeito da posição da matemática de Lacan dentro da escola lacaniana, ver, por exemplo, Dor (1991). Seria algo que poderia muito bem justificar o título "topologia lacaniana", por exemplo, visto que a topologia da qual depende o psicanalista envolve um conjunto de axiomas específicos da área.

Deixemos de lado a crítica que temos apresentado contra as acusações de S&B ao conhecimento e à utilização de noções científicas e matemáticas por parte de Lacan. Vamos partir do princípio hipotético de que para criticar o uso de matemática em uma disciplina específica não seja preciso ter um conhecimento profundo excessivamente detalhado dos problemas e do conjunto de conhecimentos da disciplina. Isso nos leva ao que S&B declaram ser sua maior objeção à utilização da matemática por Lacan (p. 34). Desse ponto de vista, a única coisa necessária para julgar a pertinência do recurso de um autor à matemática é identificar uma conceptual ou empírica ligação consciente e explícita com a disciplina em questão (neste caso, a psicanálise), sem precisar compreender seus detalhes intrincados. Deve haver algum argumento evidente que justifique a relevância. Como S&B salientam, sua objeção à utilização da matemática por parte de Lacan "não tem a ver principalmente com erros, e sim com a manifesta irrelevância da terminologia científica do sujeito supostamente sob observação." (p. 11) Mais especificamente, "as analogias (de Lacan) entre psicanálise e matemática são as mais arbitrárias que se possa imaginar, para as quais ele não oferece qualquer justificativa empírica ou conceptual (nem aqui nem em outras partes de sua obra)" (p. 34; grifos nossos).

Uma das discussões de S&B acontece no contexto da afirmação de Lacan (1970, p. 193) de que "[s]e é possível simbolizar o objeto por [um] corte fundamental, da mesma forma é possível demonstrar que um corte no toro corresponde ao sujeito neurótico, e em uma superfície cortada transversalmente a outro tipo de doença mental." S&B querem saber o que esses objetos topológicos têm a ver com a estrutura da doença mental (p. 18). Em vista das afirmações de grande alcance citados no parágrafo anterior, é surpreendente ficar sabendo que Lacan tratou da relação entre topologia (inclusive o toro) e neurose em muitos seminários (ver especialmente, LACAN, 1961-2).

Mas o que, o leitor é capaz de insistir, coisas como a "união" da lógica matemática ou o Teorema de Stokes podem ter a ver com a psicanálise? O que, por caridade, pode justificar a relação entre gravidade e o inconsciente de uma partícula ou entre a raiz quadrada de -1 e o pênis? Mesmo se concordarmos que S&B procuraram ingenuamente julgar a matemática de Lacan independentemente do contexto psicanalítico no qual ele se expressava, como é possível não declarar o óbvio: que esses conceitos matemáticos são introduzidos da maneira "mais arbitrária que se possa imaginar" (p. 34)? O que faz a relação entre a matemática de Lacan e a psicanálise parecer tão ilusória, até mesmo não existente, para S&B? É isso que exige uma explicação.

Os lacanianos gostariam de insistir que só algo tão simples quanto ignorância básica da obra de Lacan pode fazer com que esses conceitos matemáticos pareçam enigmáticos. Voltemos mais uma vez à discussão de S&B sobre a topologia de Lacan e os conceitos associados de espaço, ligação, fechamento, corte, etc. A objeção primordial de S&B é que "Lacan nunca explica a relevância desses conceitos matemáticos para a psicanálise" (p. 19). E, no entanto, mais adiante são forçados a admitir em uma nota de pé de página que "a relação entre topologia e estrutura é fácil de entender" (p. 20). Porém, naturalmente, como eles também acentuam, a conexão final à psicanálise depende do que se quer dizer com "estrutura".

Somente a ignorância dos conceitos mais básicos da obra de Lacan torna essa pergunta possível. Uma vez que se tenha em mente que uma enorme porção de seus ensinamentos é resumida na afirmação "o inconsciente é estruturado como a linguagem", não só se estabelece um vínculo conceptual com a topologia, mas se identifica facilmente uma conexão com a psicanálise. Em outras palavras, o estudo da estrutura — especialmente no contexto da lingüística — é indispensável, segundo Lacan, quando se procura compreender o funcionamento do inconsciente, e portanto é igualmente indispensável para compreender a disciplina da psicanálise. Então, sem negar o fato de que o comentário de Lacan é difícil de entender, sem ir além de um conhecimento profundo das noções mais elementares de Lacan, a acusação de que a matemática de Lacan é irrelevante ou arbitrária no que diz respeito à psicanálise só pode soar falso. Um vínculo conceptual é facilmente identificável com as noções de Lacan, sem que seja preciso mergulhar muito profundamente nos detalhes de seus ensinamentos.

O problema na questão de conteúdo é que S&B gostariam de obrigar Lacan a se dirigir a eles sob as condições deles, condições que eles consideram universais. Do ponto de vista lacaniano, S&B fazem o papel do grande Outro, o Sujeito-que-Supostamente-Sabe da Ciência. Assumindo a posição de porta-vozes oficiais da Ciência, eles encarregam-se de policiar as fronteiras de sua concepção pessoal (e não comprovada) de ciência matemática — o que é compreensível mas não desculpável — declarando também que o conhecimento específico da disciplina apropriadora não pode ter qualquer relevância em relação à sua acusação de equívoco.

CONCLUSÃO

Nosso veredicto é que S&B são culpados de negligência intelectual grave na medida em que sistematicamente interpretam mal e distorcem o programa de pesquisa de Jacques Lacan e sua relação com a ciência matemática. Nenhum esforço verdadeiro é feito no sentido de dar a Lacan uma oportunidade de defesa ou de tomar conhecimento, de forma acadêmica, da literatura relevante, admitindo abertamente uma ignorância quase completa da psicanálise. Não fosse a ligação de S&B com o estabelecimento científico — cuja autoridade é normalmente aceita sem discussão — Imposturas intelectuais não teria sido publicado.13 13 Como um exemplo da capacidade dessa publicação de influenciar opiniões pela simples associação com o estabelecimento científico, autorizando assim um repúdio imediato da utilização por parte de Lacan da ciência matemática, ver, por exemplo, Schwartz (1999, p. 254-5).

Evidentemente, essa é uma posição bem rígida — não desprovida de dificuldades. Pois se é verdade que estamos convencidos de que S&B — por mais que tenham sido honestas e bem-intencionadas as suas intenções — distorceram Lacan seriamente, restou-nos o seguinte dilema. Seria de bom alvitre tornar o debate respeitável, publicando uma resposta, uma espécie de "botar as coisas em pratos limpos"? Por que não reagir simplesmente como Jacques Derrida com seu apodo sardônico "Le pauvre Sokal" (DERRIDA, 1997)?

Sem dúvida essa resposta de Derrida fará efeito. Em nossa opinião, contudo, um tipo diferente de intervenção era igualmente importante. Importante não porque prometesse ser intelectualmente gratificante em um sentido substantivo. Neste ensaio não contribuímos de forma alguma para a compreensão da psicanálise ou da filosofia da ciência. A intervenção era importante porque o debate está vinculado a um sentimento generalizado característico do espírito da época atual, cuja conseqüência é uma espécie de reação reacionária hostil à psicanálise e ao pós-estruturalismo em geral.

Essa reação se caracteriza por uma espécie de posição patológica contrária a Lacan e companhia. Usamos o termo "patológica" aqui para significar simplesmente sintomática do ponto de vista de uma comunidade que se imagina governada por princípios sensatos e pluralistas. Com patologia queremos nos referir somente ao que resulta quando opiniões que repudiam a obra de alguém são levadas a sério mesmo se expressas por quem admite a sua ignorância com relação à disciplina daquele alguém, usando ironia sensacionalista no lugar de rigor intelectual, e apoiando-se — por simples associação — na autoridade institucional do estabelecimento científico. O pobre cidadão que habita essa "comunidade de sensatez" tem que ficar horrorizado, lutando para oferecer o que só pode parecer uma resposta impotente: "Uma coisa é alguém discordar de Lacan, ou chegar à conclusão de que Lacan é difícil demais para valer a pena, ou decidir que Lacan não faz o seu gênero; outra coisa é se dar ao trabalho de invocar a fé institucional para endossar e encorajar um divertimento barato às custas de autores cujas obras não são examinadas detalhadamente."

Está claro que o livro Imposturas intelectuais de S&B não deve sua popularidade a qualquer tipo de solidez acadêmica, integridade intelectual ou erudição literária. Como então explicar o rebuliço que o cerca? O bom senso desconstrutivista sugere que sua popularidade decorre não tanto do conteúdo entre as capas como do contexto cultural e acadêmico em que apareceu. Terminamos com uma hipótese lacaniana, insinuando que esse sucesso é sustentado por uma satisfação ou prazer (juissance) que tem pelo menos duas origens:

1. a zombaria dirigida a intelectuais franceses difíceis de entender; e

2. a zombaria dirigida aos que zombam de intelectuais franceses.

Não é fácil manter-se afastado dessas duas fontes de satisfação.

BIBLIOGRAFIA

Tradução de Flávia Maria Samuda

"Porque o comportamento atômico é tão diferente do que vivenciamos normalmente, é muito difícil nos acostumarmos com ele que dá a todos, aos novatos e aos físicos experientes, a impressão de ser estranho e misterioso. Nem mesmo os especialistas o compreendem como gostariam, o que é perfeitamente lógico uma vez que toda a experiência humana direta, e toda a intuição humana se se referem a objetos grandes. Podemos prever o comportamento de objetos grandes, mas coisas em pequena escala simplesmente não se comportam da mesma maneira. Então temos que aprender a respeito delas de uma forma meio abstrata ou imaginativa em vez de usar a nossa experiência direta. Decidimos examinar um fenômeno que é impossível, absolutamente impossível explicar através de explicações clássicas, e o qual traz em si a essência da mecânica quântica. Na verdade, contém o único mistério. Não podemos explicar o mistério no sentido de "explicar" como funciona. Nós lhes diremos como funciona. Dizendo como funciona estaremos falando das peculiaridades básicas da mecânica quântica." (FEYNMAN, 1995, p. 117)

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  • 1
    Ver sobre isso Aronowitz (1997), Robbins (1996).
  • 2
    Naturalmente não estamos sugerindo que existam razões em comum que levem a essa (o)posição compartilhada.
  • 3
    Mas como Lacan insiste em dizer, a alegação de que a psicanálise é (ou ambiciona ser) científica não deveria ser confundida com uma alegação semelhante porém diferente, segundo a qual a psicanálise é uma ciência, pelo menos da mesma forma que a física é tradicionalmente considerada uma ciência. Ver, por exemplo, Lacan (1989).
  • 4
    Em topologia de superfície ver, por exemplo, Lacan em geral (1961-2). Para uma discussão sobre números complexos, ver o seu seminário de 10 de janeiro, 1962.
  • 5
    Sobre isso, ver Lacan (1969-70).
  • 6
    Uma indicação desse tipo de abertura dialogal pode ser encontrada na discussão recente entre J-A. Miller e R.H. Etchegoyen em Miller e Etchegoyen (1996).
  • 7
    Não temos a pretensão de conhecer o trabalho de Kristeva o suficiente para poder julgar sua utilização da matemática. Simplesmente relatamos a avaliação de S&B.
  • 8
    Ver, por exemplo, Lacan (1998-9), onde ele erroneamente afirma que um conjunto aberto e o que exclui seus próprios limites. Na verdade, muitos lacanianos têm feito questão de assinalar vários erros como esse.
  • 9
    Nesse sentido S&B apenas reiteram, no campo da ciência matemática, uma acusação estrutural homóloga segundo a qual "Lacan está violentando a lingüística" (um argumento freqüente diante do fato de que Lacan se apropria dos conceitos de Jakobson relativos à metáfora e à metonímia)ou "Lacan está violentando Freud". Com relação a essas últimas questões ver Stavrakakis (1999, p. 21-2, 57-9)
  • 10
    A esse respeito talvez valha a pena lembrarmos o que Feynman tinha a dizer no tocante à mecânica quântica:
  • 11
    Mas mesmo se aceitamos que S&B "não pretendem julgar a psicanálise de Lacan ... [limitando-se a] fazer declarações sobre as ciências matemáticas e físicas..."(S&B,1998, p. 11), o que devemos pensar de sua tentativa de fazer exatamente isso, a saber, julgar não a matemática de Lacan em si mas o fato de que a matemática dele não pode fazer nenhum papel útil em psicanálise (Idem, p. 34)?
  • 12
    Ver, por exemplo, Burgoyne (1999), Morel (1994), Darmont (1990), Vappereau (1985), Granon-Lafont (1985; 1990) e Nasio (1979; 1987). Quanto aos debates a respeito da posição da matemática de Lacan dentro da escola lacaniana, ver, por exemplo, Dor (1991).
  • 13
    Como um exemplo da capacidade dessa publicação de influenciar opiniões pela simples associação com o estabelecimento científico, autorizando assim um repúdio imediato da utilização por parte de Lacan da ciência matemática, ver, por exemplo, Schwartz (1999, p. 254-5).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Out 2006
    • Data do Fascículo
      Dez 2001
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