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Prioridades no setor saúde: análise com base em estatísticas de mortalidade de Brasília, Distrito Federal (Brasil), 1977-1978

Health priorities: an analysis based on mortality statistics, Brasilia (Brazil), 1977-1978

Resumos

Foi observado, em Brasília (Brasil), no período de 1977-1978, grande número de óbitos em crianças, maior mortalidade no sexo masculino e predominância de mortes, cujas principais causas foram: a) perinatais e infecciosas em crianças pré-escolares, b) acidentes nos escolares, adolescentes e adultos jovens e c) doenças cardiovasculares e tumores após os 45 anos de idade. Esses resultados são valiosos para orientar a aplicação de recursos por parte dos serviços oficiais de saúde.

Saúde pública; Mortalidade; Estatística vital


Mortality statistics were investigated in Brasilia (Brazil) during 1977-1978. Many deaths were among children. A breakdown into figures showed that mortality was greater among males and the main causes of death were: a) perinatal causes and infectious diseases among pre-school children; b) accidents among school children, adolescents, and young adults; c) heart disease and tumors in the middle-aged and elderly. This information is valuable in planning the utilization of public health resources.

Health and welfare planning; Mortality; Vital statistics


Prioridades no setor saúde: análise com base em estatísticas de mortalidade de Brasília, Distrito Federal (Brasil), 1977-1978* * Trabalho realizado com auxílio do CNPq (Proc. 2222.2054.78)

Health priorities: an analysis based on mortality statistics, Brasilia (Brazil), 1977-1978

Maurício Gomes Pereira

Da Secretaria de Saúde do Distrito Federal — Caixa Postal 15-2922 — 70000 — Brasília, DP — Brasil.

RESUMO

Foi observado, em Brasília (Brasil), no período de 1977-1978, grande número de óbitos em crianças, maior mortalidade no sexo masculino e predominância de mortes, cujas principais causas foram: a) perinatais e infecciosas em crianças pré-escolares, b) acidentes nos escolares, adolescentes e adultos jovens e c) doenças cardiovasculares e tumores após os 45 anos de idade. Esses resultados são valiosos para orientar a aplicação de recursos por parte dos serviços oficiais de saúde.

Unitermos: Saúde pública, planejamento. Mortalidade, Brasília, Brasil. Estatística vital.

ABSTRACT

Mortality statistics were investigated in Brasilia (Brazil) during 1977-1978. Many deaths were among children. A breakdown into figures showed that mortality was greater among males and the main causes of death were: a) perinatal causes and infectious diseases among pre-school children; b) accidents among school children, adolescents, and young adults; c) heart disease and tumors in the middle-aged and elderly. This information is valuable in planning the utilization of public health resources.

Uniterms: Health and welfare planning. Mortality, Brasilia, Brazil. Vital statistics.

1. INTRODUÇÃO

Os recursos do setor saúde são sempre insuficientes face o grande número de problemas a serem enfrentados. Daí a necessidade de um conhecimento adequado das condições de saúde de uma região, permitindo selecionar problemas em termos de prioridade. Informações de natureza diversa servem de base para o estudo da situação, sendo particularmente importantes os dados demográficos, econômicos, epidemiológicos e de utilização de serviços 6. As informações de natureza epidemiológica compreendem os estudos de morbidade e de mortalidade 3. Morbidade é o melhor indicador, embora seja de difícil obtenção. Por isso, os dados de mortalidade, apesar de fornecerem uma visão parcial das doenças da região — pois não revelam as doenças de pouca gravidade — são as mais utilizadas estatísticas de saúde 2.

O objetivo deste trabalho é descrever alguns aspectos das estatísticas de óbitos de pessoas residentes no Distrito Federal e usar estas informações para o levantamento de prioridades.

2. MATERIAL E MÉTODOS

Foram incluídos os óbitos de pessoas residentes no Distrito Federal, nos anos 1977 e 1978. Tomou-se um período de dois anos para maior estabilidade dos coeficientes de mortalidade. A causa básica do óbito foi codificada por pessoal especializado da Secretaria de Saúde com o uso da 8a revisão da "Classificação Internacional de Doenças"4. Após codificados, foram agrupados pela lista internacional de 50 causas de óbitos (lista B) e distribuídos por sexo e idade. Os óbitos fetais não foram incluídos na análise.

A estimativa da população para 1o de julho de cada ano foi feita pela CODEPLAN, órgão do Governo do Distrito Federal 1.

3. RESULTADOS

Em 1977 ocorreram 5.162 óbitos de pessoas residentes no Distrito Federal e 5.205 no ano seguinte. O coeficiente de mortalidade geral para cada ano, no período considerado, foi de 5,1 por 1.000 habitantes. Esta cifra média, no entanto, mostrou grandes variações quando analisada sob determinados aspectos. A taxa de mortalidade é alta no início e no final da vida (Tabela 1). As crianças menores de um ano, menos de 4% da população, foram responsáveis por 35% do total de óbitos; as com 65 anos ou mais, cerca de 1% da população, por 15% das mortes. Conclui-se, portanto, que as crianças pequenas e as pessoas idosas, apenas 5% da população, concorreram com metade dos óbitos no período.

Há maior mortalidade no sexo masculino. O coeficiente médio anual foi de 5,9 por 1.000 em homens e de 4,4 por 1.000 em mulheres. Esse excesso de mortalidade masculina foi observada em todas as idades (Fig.). A diferença entre sexos só não é estatisticamente significativa no grupo de um a 4 anos. Pode-se observar que a diferença é grande no adulto jovem onde o coeficiente de mortalidade em homens é o dobro da taxa feminina.


A mortalidade masculina, além de ser maior do que a feminina em todos os grupos etários, é também mais elevada para todas as principais causas consideradas, com exceção dos tumores, apesar de em algumas categorias a diferença não ser estatisticamente significativa (Tabela 2). A relação mortalidade masculina/feminina é bastante alta em acidentes, envenenamentos e violências (daqui para frente chamada apenas de acidentes); para cada sete óbitos por acidente no sexo masculino, houve apenas dois no sexo feminino. A primeira causa no sexo masculino corresponde aos acidentes, seguido das doenças infecciosas e parasitárias e das cardiovasculares. No sexo feminino, as doenças infecciosas e parasitárias ocupam o primeiro lugar seguido das doenças cardiovasculares.

A Tabela 3 apresenta as principais causas por grupo etário. Para os menores de 1 ano, as causas perinatais (anoxia e prematuridade, principalmente), as doenças infecciosas e parasitárias (a maioria, gastroenterites) e respiratórias (pneumonias e broncopneumonias) são responsáveis por 80% dos óbitos. Para as crianças de um a 4 anos, as doenças respiratórias ocupam o primeiro lugar, seguido das enfermidades infecciosas e parasitárias e dos acidentes. Entre 5 e 14 anos de idade, os acidentes são a principal causa. Nas pessoas de 15 a 44 anos de idade, os acidentes mantêm-se como a principal causa, com as enfermidades cardiovasculares em segundo. A maioria dos óbitos por enfermidades cardiovasculares é devida à hipertensão, infarto do miocárdio, arteriosclerose e acidente vascular cerebral. Dos 45 anos em diante, as enfermidades cardiovasculares alcançam a primeira posição seguida dos tumores. Em conjunto, sem distinção de idade e sexo, pode-se observar, na última coluna da Tabela 3, que as doenças infecciosas e parasitárias, as doenças cardiovasculares, os acidentes, as causas perinatais e as enfermidades respiratórias, nesta ordem, foram as causas de maior freqüência.

Observando-se a mesma Tabela pode-se acompanhar a importância relativa de cada grupo de causas nas diversas idades. As doenças infecciosas e parasitárias e as enfermidades respiratórias são importantes em crianças, responsáveis em conjunto por praticamente metade dos óbitos em menores de 5 anos. Essas cifras indicam a subnutrição como provável causa associada, apesar de raramente constar em atestados. Como era de se esperar, os tumores e as doenças cardiovasculares aumentam com a idade. As anomalias congênitas, ao contrário, diminuem de incidência com o passar dos anos. Já os acidentes têm importância maior em escolares, adolescentes e adultos jovens.

4. DISCUSSÃO E CONCLUSÕES

A análise dos óbitos no Distrito Federal em 1977 e 1978 indicou que há uma concentração de mortes nos primeiros anos de vida e uma maior mortalidade no sexo masculino. Predominam as causas perinatais e infecciosas nas crianças pré-escolares; de acidentes nos escolares, adolescentes e adultos jovens; e de doenças cardiovasculares e tumores após os 45 anos de idade. O Distrito Federal apresenta, assim, um padrão de mortalidade diversificado:

a) Nota-se a importância das enfermidades transmissíveis e a ocorrência de grande proporção de óbitos em crianças, situações próprias de regiões em desenvolvimento. Esses eventos são potencialmente evitáveis através de medidas básicas tais como: saneamento do meio ambiente, vacinações, acesso facilitado a serviços de saúde e suplementação nutricional de grupos vulneráveis.

b) Ocorre grande número de mortes por doenças crônico-degenerativas e acidentes, geralmente prevalentes em regiões mais desenvolvidas. A prevenção desses óbitos tem sido feita em ambiente hospitalar através de medidas sofisticadas, de alto custo e baixa eficácia. Maiores recursos deveriam ser orientados para o controle dos fatores de risco, ou seja, voltados para diminuir a influência daquelas condições geralmente associadas ao aparecimento das doenças crônico-degenerativas e dos acidentes, tais como, hábito de fumar, nutrição defeituosa, atividade física insuficiente e consumo excessivo de álcool.

As medidas preventivas mencionadas são apenas algumas de um número bem maior que podem ser encontradas descritas em bibliografia especializada 2,5.

Deve-se ressaltar que, o levantamento de prioridades — e o conseqüente encaminhamento de medidas preventivas a serem aplicadas — foi feito, neste trabalho, a partir de dados colhidos em declarações de óbitos. O valor do diagnóstico sanitário depende, portanto, da confiabilidade das informações anotadas. Assim, a preocupação por informações completas nas referidas declarações deve estar presente tanto da parte dos médicos como de pessoal administrativo encarregado de preencher esses documentos. Isso feito, as estatísticas de mortalidade servirão cada vez mais como um instrumento valioso na melhor orientação dos recursos de saúde.

Recebido para publicação em 27/05/1980

Aprovado para publicação em 12/09/1980

  • 1
    ANUÁRIO ESTATÍSTICO DO DISTRITO FEDERAL. (CODEPLAN) Brasília, 1978.
  • 2. LEAVELL, H. R. & CLARK, E. G. Medicina preventiva. São Paulo, Ed. McGraw-Hill do Brasil, 1976.
  • 3. MACMAHON, B. & PUGH, T. F. Epidemiology: principles and methods. Boston, Little, Brown and Co., 1970. p. 57-102.
  • 4
    MANUAL da classificação estatística internacional de doenças, lesões e causas de óbito: 8a. revisão. Washington, D. C., Organização Panamericana da Saúde, 1969.
  • 5. PARETA, J. M. M. et al. Saúde da comunidade: temas de medicina preventiva e social. São Paulo, McGraw-Hill do Brasil, 1976.
  • 6. TAYLOR, C. E. Stages of the planning process. In: Weinke, W. A. Health planning. Baltimore, Johns Hopkins University, 1972. p. 20-34.
  • *
    Trabalho realizado com auxílio do CNPq (Proc. 2222.2054.78)
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      27 Jan 2006
    • Data do Fascículo
      Dez 1980

    Histórico

    • Aceito
      12 Set 1980
    • Recebido
      27 Maio 1980
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