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EDITORIAL

O discurso médico está cada vez mais recheado de referências a dados de pesquisas, seja em apoio ao estabelecimento de diagnósticos, seja para a escolha de procedimentos terapêuticos. Nada mais natural de vez que, através dos resultados obtidos na pesquisa, tem havido um enorme impulso no desenvolvimento da Medicina.

Entretanto, é importante assinalar que, cada vez mais freqüentemente, são relatados abusos e fraudes cometidos por pesquisadores que, por ignorância, má fé, ou mesmo por dinheiro, falsificam os resultados de seus trabalhos manipulando dados e, consequentemente, induzindo o leitor a falsas conclusões e, até mesmo, a cometer graves erros na avaliação ou no tratamento de seus pacientes.

Este problema é tão grave que, em 1989, o Instituto Nacional de Saúdedos Estados Unidos da América do Norte elaborou um manual (NIH Guide for Grants and Contracts, 1989), no qual fixa instruções sobre a conduta responsável na pesquisa que, se não cumpridas, inabilitam a receber auxílio oficial.

Num país como o Brasil, onde a maioria das escolas médicas não tem tradição de pesquisa e onde a estrutura dos cursos não prevê uma base sólida em metodologia científica para os estudantes, torna-se ainda mais preocupante esta situação.

Estarão os estudantes e até mesmo grande parle dos professores habilitados ao exame crítico de um relatório de pesquisa? Estarão familiarizados com os diversos tipos de estudos e capazes de avaliá-los em seu contexto próprio? Estarão preparados para perceber e valorizar os conflitos de interesses envolvidos em muitas das controvérsias no campo da Pesquisa? Estarão aptos a enfrentar os dilemas éticos, que são postos por algumas das novas tecnologias, por exemplo, no campo da reprodução humana, ou da venda de órgãos para transplantes?

Não se conhece qualquer estudo que autorize responder, com precisão, a qualquer destas perguntas, entretanto, seguramente não há quem possa com seriedade responder afirmativamente a qualquer delas.

Diante disto e da escassa produção sobre o tema em nossa Revista, estamos colocando o problema neste Editorial esperando que hajam manifestações sobre o assunto, inclusive relatos de experiências por parte das escolas na abordagem do problema.

Desde logo, gostaríamos de mencionar algumas sugestões que podem ser úteis para iniciar esta abordagem.

A primeira talvez seja, e este é o objetivo deste Editorial, levantar simplesmente o tema e dar a ele a dimensão adequada. Através de palestras e seminários com pesquisadores, filósofos, eticistas, cientistas sociais, trazer o problema à consciência dos alunos e professores.

A segunda seria uma seleção adequada da bibliografia, com orientação especifica sobre o assunto aos usuários, a fim de que não se caia no simplismo do “é verdadeiro porque está escrito”. As revistas de tradição com corpo editorial respeitável, que não sofrem ingerência de propaganda, devem ter seu papel enfatizado para os alunos e professores.

A terceira seria a instituição de cursos de metodologia científica, com o objetivo não de formar um pesquisador, mas de capacitar o médico e o professor a lidar com as incertezas da ciência, de vez que todos estivemos muito convencidos, até aqui, de suas certezas e afirmações definitivas.

Prof. Luiz Antonio Santini
Diretor Executivo da ABEM

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Jul 2021
  • Data do Fascículo
    May-Aug 1993
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