REDCPS - Revista Enfermagem Digital Cuidado e Promoção da Saúde

Fluxo contínuo: 2021, Número: 6 - 34 Artigos

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DOI: http://www.dx.doi.org/10.5935/2446-5682.20210055

ESPECIAL COVID-19

Teoria do autocuidado no ciclo Gravídico-Puerperal durante pandemia de Covid-19: reflexão para a prática de enfermagem

Theory of self-care in the Pregnancy-Puerperal cycle during the Covid-19 pandemic: reflection for nursing practice

Layla Santana Corrêa da-Silva; Amanda Marques Bezerra; Ana Paula de Assis Sales; Verusca Soares de-Souza; Maria Angélica Marcheti

Universidade Federal de Mato Grosso do Sul-UFMS, Instituto Integrado de Saúde-INISA - Campo Grande - MS - Brasil

Endereço para correspondência

Layla Santana Corrêa da-Silva
E-mail: correa_layla@hotmail.com

Recebido em 11/02/2021
Aceito em 12/04/2021
Publicado em 24/09/2021

Resumo

OBJETIVO: Refletir sobre o autocuidado no ciclo gravídico-puerperal durante a pandemia da Covid-19 à luz da teoria do autocuidado de Dorothea Orem.
MÉTODOS: Trata-se de um estudo teórico-reflexivo voltado para análise bibliográfica de literaturas relacionada ao autocuidado na gestação, parto e puerpério e os impactos das adaptações necessárias ao contexto atual de pandemia.
RESULTADOS: O ciclo gravídico-puerperal é um momento único e com adaptações que demanda maior atenção aos cuidados pessoais e requer dos profissionais de saúde estratégias que ofereçam informações e apoio às mulheres. Com o isolamento social na pandemia, devido às mudanças fisiológicas do período, as demandas de autocuidado tornaram-se fundamentais devido o afastamento da rede de apoio pelas novas recomendações de prevenção ao vírus.
CONCLUSÕES: A teoria de Orem é uma estratégia para o enfrentamento do contexto pandêmico somado às alterações gravídico-puerperais tornando possível uma assistência de qualidade mesmo em meio a tantos desafios do momento atual.

Palavras-chave: Teoria de enfermagem; Autocuidado; Cuidado pré-natal; Covid-19

 

INTRODUÇÃO

A gestação é um processo que envolve reestruturação e reajustamento. Além das mudanças físicas, há também modificação nos aspectos da identidade e uma nova definição de papéis é necessária. Já o período puerperal é um estágio de redescobertas em que a mulher experimenta transformações biopsicossociais com ajustes em seu novo papel na sociedade, inclusive influenciado pela forma de condução do pré-natal e vivência no parto(1,2).

O acolhimento e a disposição para fornecer informações necessárias irão determinar a experiência da mulher, os ganhos e o ambiente facilitador durante o período(2). Nessa perspectiva, a assistência realizada de forma acolhedora e humanizada torna-se imprescindível para a qualidade da assistência e prevenção de riscos associados.

Por meio das estratégias conduzidas pela Rede Cegonha a atenção ao pré-natal, ao puerpério e ao recém-nascido deve ser feita em um conjunto de consultas e visitas programadas para a mulher e sua família na atenção básica com acompanhamento e obtenção de uma adequada preparação para o parto e nascimento, com o intuito de proporcionar às mulheres saúde, qualidade de vida e bem estar durante a gestação, parto, pós-parto e o desenvolvimento da criança até os dois primeiros anos de vida(3).

Assim, o atendimento dos profissionais visa o acompanhamento, orientação e promoção das informações de acordo com as necessidades, além de rastrear possíveis situações de risco e tratar intercorrências que possam interferir no bem-estar do bebê, da gestante e de sua família(2,3).

Embora se conheça os fluxos e componentes mínimos do cuidado à mulher no ciclo gravídico-puerperal, o atual cenário pandêmico causado pelo novo Coronavírus, conhecido como Covid-19, exigiu a revisão e organização do atendimento aos indivíduos.

O cenário clínico-epidemiológico consolidado em todos os continentes como uma realidade pandêmica tem afetado as práticas de atenção à saúde, inclusive a assistência à mulher no ciclo gravídico-puerperal. No entanto, as alterações causadas na saúde pela pandemia também se mostram como uma oportunidade de agir e ser enfermagem refletindo e fortalecendo a assistência.

Cumpre destacar que, devido às modificações fisiológicas e imunológicas das mulheres em período gestacional, parturitivo e puerperal, verifica-se um maior potencial em desenvolver Síndromes Respiratórias. Assim, foram incluídas a nível mundial no grupo de risco para as Síndromes Respiratórias Aguda Grave (SARS) causadas pelo Covid-19, mesmo que não sejam consideradas mais susceptíveis a contrair o vírus(4).

Existem discrepâncias entre as recomendações dos órgãos responsáveis em relação aos procedimentos de rotina antes realizados (transmissão vertical, riscos materno-fetal, corte do cordão umbilical e aleitamento) (5). Entretanto, mesmo com as incertezas ocasionadas pelo momento de pandemia, todas as mulheres, inclusive aquelas com confirmação ou suspeita de infecção pela Covid-19, possuem o direito aos cuidados de qualidade no processo gravídico- puerperal.

Os modelos teóricos contribuem para que conceitos sejam formados, assim como o conceito de autocuidado e o déficit do autocuidado. A educação em saúde pode ser vista como uma forma de produzir o autocuidado, sendo um processo que depende da percepção de cada ser humano sobre suas necessidades e sua condição. Considerando a saúde materno-infantil, o enfermeiro tem a possibilidade de aplicar a teoria de Orem considerando os cuidados específicos de manutenção à saúde no período(6,7).

A teoria do autocuidado de Orem(9) se baseia nas ações voluntárias que o indivíduo é capaz de realizar para cuidar de si a fim de promover o bem-estar, a saúde e a autoestima. Para isso, é necessário que o indivíduo reconheça os requisitos universais, os de desenvolvimento e os de desvio de saúde enquanto componentes essenciais para a prática do autocuidado. Consideram-se universais as atividades realizadas no cotidiano; de desenvolvimento a adaptação a um novo trabalho ou mudanças físicas; os desvios de saúde as condições de doença, ferimento ou consequência de medidas médicas exigidas para diagnosticar ou corrigir uma condição.

Frente ao cenário de recomendações e adaptação tanto ao contexto da pandemia de Covid-19 quanto ao processo gestacional e puerperal, o autocuidado torna-se algo ainda mais significativo tanto pela diminuição da rede de apoio, considerando as recomendações de isolamento social, quanto pela introdução de novas demandas de cuidados inerentes ao Covid-19 introduzidos ao ciclo gravídico puerperal. Nessa perspectiva, objetiva-se refletir sobre o autocuidado e as práticas de enfermagem no ciclo gravídico-puerperal durante a pandemia de Covid-19 à luz da teoria do autocuidado de Dorothea Orem.

Reflexões acerca do autocuidado e o ciclo gravídico durante a pandemia da Covid-19

A gestação é um momento que, embora seja especial e cheio de emoções, pode ser repleto de incertezas e medos. Tais paradoxos podem ser exacerbados no cotidiano das gestantes que enfrentam a pandemia da Covid-19, pois o medo, a ansiedade e a incerteza que antes já eram presentes, podem afetá-las ainda mais nesse momento.

Com foco na qualidade de vida e estímulo de ações de autocuidado, o Ministério da Saúde lançou o “Protocolo de Manejo Clínico do Coronavírus (Covid-19) na Atenção Primária à Saúde” (Quadro 1), que já está em sua nona versão devido as atualizações constantes. Este protocolo visa a redução da transmissão durante a assistência à mulher no parto, puerpério e abortamento por meio da prevenção e controle da infecção causada pelo patógeno SARS-CoV-2(10).

 

 

O que se sabe até o momento é que as gestantes não correm um risco maior de contrair o vírus do que o restante da população. Porém, devido às alterações em seu corpo, como a elevação do diafragma, o aumento do diâmetro da caixa torácica, a vasodilatação da mucosa e as alterações na imunidade, as gestantes possuem predisposição para as infecções, inclusive as respiratórias. Portanto, é importante adotar precauções para reduzir o risco de contaminação, mas garantindo os direitos e aos cuidados de qualidade (10,11).

Mesmo que o atendimento ao pré-natal tenha se mantido, adaptações foram necessárias. O Ministério da Saúde produziu uma nota técnica para o atendimento às mulheres no ciclo gravídico-puerperal onde os profissionais são orientados a como lidar com as sintomáticas. Entre as orientações para combate à Covid-19 encontram-se as mesmas medidas para população geral, que incluem o adiamento em 14 dias e atendimento isolado dos demais pacientes no caso de sintomáticas(11,12).

Considerando a contribuição de Orem(13) no desenvolvimento da Teoria de Enfermagem do Autocuidado, notamos que neste momento pandêmico o autocuidado é de extrema relevância. Na perspectiva da teoria, as ações que são dirigidas para promover o autocuidado, são dadas pelo termo “requisitos de autocuidado”, os quais são divididos em três categorias: requisitos universais, requisitos de autocuidado de desenvolvimento e requisitos de autocuidado no desvio da saúde.

Acerca dos requisitos de autocuidado de desenvolvimento, que se referem às novas situações que ocorrem durante a vida humana, cita-se como exemplo o que acontece durante a gestação. A gestação se caracteriza como um momento novo na vida de uma mulher no qual ocorrem transformações que demandam mudanças na maneira de realizar o autocuidado(7,13).

O autocuidado é uma técnica utilizada para empoderar o sujeito a ser ativo no processo e pode modificar suas atitudes, auxiliando-o na adoção de novos comportamentos. Auxilia o indivíduo em suas atividades básicas do cotidiano (como ingestão hídrica e alimentação adequada, repouso, etc.). A gestante precisa se adaptar às novas necessidades de cuidado que seu corpo demanda enquanto ele se prepara e gera um novo ser. Neste sentido, a própria mulher será agente de transformação para manter a saúde e prevenir complicações por meio do autocuidado (corpo e mente), melhorar o estilo de vida, conhecer e controlar os fatores de risco além de se preparar para cuidar de outro ser.

Quando houve o início da pandemia da Covid-19 no Brasil e no mundo, as boas práticas assistenciais que os estudos já apontavam não podiam mais ser replicadas. A presença de acompanhante no parto e pós-parto tiveram novas exigências. Por exemplo, a permanência de apenas um acompanhante durante todo o período e a realização do teste prévio de Covid-19, variando em cada instituição e nas diversas realidades do país.

Exames e ultrassons passaram a ser realizados em menor escala e o início de pré-natais foram adiados pelo medo das gestantes em expor-se ao vírus. O isolamento social e outras tantas recomendações além das que os especialistas já estavam acostumados tiveram que ser adequadas à nova realidade que se instalou no mundo.

A educação em saúde é um processo que possibilita a capacidade de indivíduos e grupos sociais em expressar suas necessidades e preocupações. Neste momento produtor de medo e ansiedade, uma atenção especial na educação em saúde pode ser um caminho para que os profissionais estimulem os usuários na tomada de decisões de forma a estimular o autocuidado a partir de fornecimento de orientações, uma vez que a finalidade das práticas educativas em saúde é oportunizar momentos de reflexões conjuntas e ações capazes de possibilitar às pessoas um aprendizado consciente, sem a intenção de controlar suas vidas(14).

Um dos papeis da equipe de saúde e principalmente do enfermeiro envolve preparar o indivíduo para que possa realizar seu próprio cuidado de forma eficaz. Uma preparação realizada de forma adequada mantém as necessidades biopsicossociais que varia a cada ser humano. Ao longo da gestação, o objetivo principal dos profissionais é a promoção do bem- estar e a prevenção de complicações para o binômio. Dessa forma, a mulher poderá vivenciar de forma digna o processo de cuidar durante seu gestar e parir, podendo reintegrar-se ao seu cotidiano mais segura e confiante(6).

No decorrer do período gestacional, se revelam necessidades da mulher em receber orientações e encorajamento relacionados à busca por medidas de prevenção de intercorrências no crescimento e no desenvolvimento do futuro bebê. Tais necessidades só são reveladas por meio das estratégias de educação em saúde voltadas para grupos de gestantes as quais permitem identificar a necessidade individual de maneira que promova autorreflexão e leve à construção de ferramentas de autocuidado que serão geridas pela própria paciente, estimulando autonomia em saúde pelo processo de empoderamento assim como defendia Orem em suas teorias(13).

A realização de grupos educativos para as gestantes é uma estratégia essencial para a promoção da saúde materno-infantil, conhecidas como “rodas de conversa com gestantes”. Nessas rodas, os profissionais de saúde conhecem a mulher, seus contextos sociais e mostram que é possível a produção de educação em saúde, promovendo uma troca de experiências com outras mulheres no mesmo momento de vida. Tais atividades estão suspensas presencialmente, mas ganharam espaço nas redes virtuais de forma a conceder a essas mulheres o empoderamento e proporcionar o desenvolvimento de suas próprias estratégias de auto cuidado por intermédio de uma reflexão ativa reforçando a importância dos cuidados na gestação e preparação para gerir o cuidado.

No contexto de pandemia, a tecnologia torna-se uma ferramenta aliada, de forma que a comunicação entre as pessoas foi adaptada, usando a internet para criação de grupos de e diversos atendimentos médicos, deixando a parte presencial apenas para casos extremos. As informações tem sido produzidas em grande escala a fim de instruir e auxiliar na construção do autocuidado.

Orem(13) defende que todo ser humano é capaz e deseja realizar ações em seu próprio benefício. Neste período gestacional se fala e se orienta muito para garantir o melhor desenvolvimento ao bebê e preservar o bem-estar e a saúde da mulher, sua integridade física e emocional, além das suas necessidades específicas para que ela tenha melhores condições de “maternar”.

O autocuidado visa a independência do sujeito em relação ao cuidado, permitindo que o mesmo o desenvolva de sua forma, assim, valoriza as suas próprias escolhas nas tomadas de decisões voltadas para o desenvolvimento do auto cuidar. Além disso, pode possibilitar que a gestante reflita sobre sua vida e quais adequações são necessárias para manter ou melhorar a qualidade de vida.

O autocuidado representa as ações que a mulher realiza para que se preserve e cultive a saúde e a qualidade de vida de forma autônoma e livre. Ele promove a autonomia e a consciência do papel fundamental que exerce em seu bem-estar(15). Nesse sentido, o papel do enfermeiro pode ser visto como o de um orientador do processo de autocuidado e auxiliar no processo de aprendizagem por permitir uma melhor compreensão do ser no mundo, e não apenas estar no mundo.

O isolamento social é considerado uma das poucas maneiras de controlar a disseminação do vírus, mas essa estratégia também trouxe o sentimento de solidão na população. A gestante em meio a tantas mudanças dentro de si, agora também precisa adaptar- se às mudanças externas tais como afastamentos de pessoas queridas e inseguranças e medos em torno dos cuidados a serem tomados. Independentemente da situação sorológica dessas mulheres, é necessário um olhar sensível à saúde mental, devido à instabilidade emocional inerente à vivência do processo de gestação, parto, nascimento e puerpério, tendo em consideração as repercussões econômicas, sociais, laborais e psíquicas do isolamento social, as quais potencializam sentimentos de solidão, medo, ansiedade e estresse(16).

Acerca do momento do parto, a Federação Brasileira de Associação de Ginecologistas e Obstetras(17) lançou um protocolo para redução da transmissão durante a assistência, intitulado “Protocolo de Atendimento no Parto, Puerpério e Abortamento durante a Pandemia da COVID-19” (Quadro 2).

 

 

Tais recomendações disseminadas pelas mídias sociais orientam as mulheres a se prepararem e se reorganizarem em relação ao momento do parto, desde informações sobre o local de escolha e a presença de acompanhante até a como realizar práticas seguras para com o seu bebê. O que antes era permitido nas maternidades como a presença de doula, fotógrafos, escolha livre para local do parto e práticas na amamentação, sofreu um grande impacto na assistência obstétrica direta a mulher, além de uma necessidade de reorganização dos serviços. É importante lembrar que os direitos da mulher devem ser garantidos e para serem cumpridos é importante conhecimento destes.

Em tempos de pandemia, a realidade dos serviços de saúde brasileiros encontram desafios para a atenção às mulheres representadas pela inicial falta de equipamentos de proteção individual, testagens insuficientes e especificidades da arquitetura das maternidades. Esses desafios podem colaborar para um aumento do risco de disseminação do vírus nestes locais e de exposição para gestantes saudáveis e profissionais de saúde. Considerando esses possíveis efeitos, as orientações são para que o cuidado respeitoso aos direitos femininos e seguro para parturientes, neonatos, puérperas, acompanhantes e profissionais de saúde no âmbito dos serviços da atenção obstétrica devem ser estimulados e respeitados de forma que a mulher passe por uma experiência positiva de parto(16).

Reflexões acerca do puerpério durante a pandemia de Sars-Cov-2: entre o autocuidado e o aprender cuidar do outro

O período puerperal representa uma fase de reestabelecimento do organismo à situação pré-gravídica, o autocuidado nesse momento pode ser a livre escolha do indivíduo para manter sua qualidade de vida e a prevenção de infecções susceptíveis da fase como ferida operatória (caso exista), cuidado com as mamas e higiene íntima(18). Diante disso, o profissional enfermeiro, como principal agente produtor e disseminador do cuidado, deve estimular o autocuidado colocando em prática a Teoria de Orem, orientando e identificando a capacidade das mulheres para o autocuidado consigo e com seus bebês.

A ideia de que os indivíduos quando capazes devem cuidar de si mesmos é uma das premissas de Orem. A mulher deve passar pelo empoderamento ao longo da gestação a fim de culminar no protagonismo do seu próprio cuidado e do cuidado do filho. Inúmeras podem ser as fontes que influenciam no preparo da mulher para o autocuidado nesse período, entre elas estão: a equipe de saúde, a mídia, os conselhos de mães, avós e amigas leigas. O enfermeiro tem um papel fundamental para essa promoção do bem-estar físico, mental e social de mulheres no puerpério, bem como para a prevenção de agravos relacionados ao recém-nascido comuns do período(6). Para que as orientações do enfermeiro sejam relevantes na vida da mulher, é necessária a formação de vínculo baseado em na relação de confiança entre profissional e paciente.

Por meio da educação em saúde, as mulheres serão influenciadas para mudança de hábitos e comportamentos adequados de saúde e prática de autocuidado e cuidado com o neonato, a fim de melhorar as condições de vida das mulheres no puerpério e estimular o desenvolvimento de conhecimentos, atitudes, valores, práticas, comportamentos e formas de agir(19, 20).

Frente à pandemia, foram elaboradas recomendações para especificar cuidados em puérperas e, como consequência, seus bebês (Quadro 3).

 

 

No pós-parto, o cuidado recebido e o autocuidado são envolvidos por influências, crenças e práticas que são passadas de geração em geração. Essas influências têm origem nos relatos de sucessos e insucessos ocorridos no pós-parto das mulheres da família. É também o momento vivenciado com profundas transformações, expondo a mulher a uma série de agravos. Diante de tantas diversidades sociais que o Brasil apresenta, é necessário que o enfermeiro ajuste suas orientações frente a tais peculiaridades de forma a reduzir as disparidades culturais no cenário da saúde. A competência cultural é uma forma de centrar na integralidade da pessoa de forma a priorizar o cuidado personalizado, de forma a olhar individualmente cada pessoa e a partir da realidade vivenciada, planejar suas ações e orientações.

O puerpério é conhecido como período de “resguardo”, justamente pelas inúmeras modificações que estão ocorrendo no corpo da mulher. Tais modificações são de ordem fisiológica como involução uterina e restabelecimento do canal do parto, transformações corpóreas, metabólicas e hormonais, não excluindo também os aspectos psíquicos e emocionais que atingem a esse grupo, podendo acarretar depressão pós-parto. Nos primeiros dias pós-parto as mulheres experimentam essas rápidas mudanças, podendo aparecer instabilidades frente às situações desconhecidas tanto no cuidado do filho quanto com a família e lar(7).

O autocuidado no puerpério demanda diversos aspectos como alimentação, higiene, cuidados com lacerações ou ferida operatória, seios e amamentação, atividade física, sexual e reconhecimento de sinais de alerta, além das expectativas relacionadas ao cuidar de um outro ser, que demanda paciência e uma rede de apoio que pode estar fragilizada pela pandemia.

A aproximação do profissional de saúde e também a rede de apoio (diminuída a aproximação no período atual) são parte indispensável para a recuperação da mulher. Essa aproximação deve ser realizada de formas diferentes da tradicional, demandando dos profissionais (e das mulheres) criatividade e acima de tudo resiliência(7).

Diante disso, pode haver um déficit de autocuidado das mulheres que pode se estender ao neonato devido ao desconhecimento das boas práticas recomendadas ou pela fragilidade do período. Assim, é necessário que o enfermeiro, como agente fornecedor de cuidado, oriente a mulher de forma eficaz e individualizada sobre as incumbências que lhe é necessária nesta fase. Com uma educação em saúde eficaz, reduz-se as chances da incidência de agravos evitáveis(6).

 

CONCLUSÃO

A teoria de Dorothea Orem demonstra as faces do autocuidado tão necessário neste momento de pandemia e ainda mais neste período vivenciado pela mulher. Com o isolamento social, a consequente redução dos contatos sociais e da rede de apoio, o autocuidado passa a ter uma força ainda maior e redobrada atenção dos profissionais.

A teoria contempla a mulher no ciclo gravídico-puerperal por meio do autocuidado, de forma que entendam suas novas demandas de cuidados pessoais, que já não são os mesmos de antes da gestação e serão novos a cada etapa do ciclo e a cada indivíduo, como, por exemplo, o aumento da ingestão de água, de alimentos benéficos à gestação e puerpério, a abstinência de drogas e bebidas alcoólicas, exercícios físicos leves, etc. Quando se identifica os novos cuidados, as pessoas são capazes de satisfazê-los e quando não são capazes, é necessário procurar ajuda temporária para este fim, assim como mostra a teoria.

Diante de todas as adaptações na assistência à saúde e no cotidiano da mulher no ciclo gravídico-puerperal, Orem pode se tornar uma estratégia para melhor enfrentamento. Utilizando os métodos expostos pela teórica de agir, guiar, apoiar, ensinar e proporcionar ambiente de desenvolvimento pessoal, é possível o enfermeiro prestar uma assistência de qualidade mesmo em meio a tantos desafios além de ajudá-las a reconhecerem suas necessidades e a supri-las de forma eficaz.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES

Coleta de Dados, Redação - Preparação do original: Layla Santana Corrêa da-Silva

Coleta de Dados, Investigação, Redação -Preparação do original: Amanda Marques Bezerra Redação - Revisão e Edição, Supervisão, Validação: Ana Paula de Assis Sales

Gerenciamento do Projeto, Redação - Revisão e Edição, Supervisão, Validação: Verusca Soares de-Souza

Redação - Revisão e Edição, Validação: Maria Angélica Marcheti

 

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