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Evolução dos índices dopplervelocimétricos da artéria cerebral média em fetos de gestantes normais

Evolution of doppler indices and velocities of the middle cerebral artery in fetuses of normal pregnant women

Resumos

OBJETIVO: observar a evolução dos índices de resistência, pulsatilidade, velocidade máxima, velocidade diastólica final e tempo de aceleração da artéria cerebral média fetal entre a 22ª e a 38ª semana de gestação. MÉTODOS: foi feito estudo observacional prospectivo e longitudinal no qual 33 fetos de gestantes normais foram avaliados entre a 22ª e a 38ª semana de gestação. A idade gestacional foi determinada pela data da última menstruação e/ou pelo exame ultra-sonográfico do primeiro trimestre. Os exames ultra-sonográficos com Doppler foram feitos por um único observador, que utilizou aparelho modelo Image Point 1800 (Hewlett Packard), com transdutor multifreqüencial. Para a aquisição do traçado Doppler da artéria cerebral média, o indicador de amostra foi calibrado para um volume de amostra de 1 mm³ e colocado na artéria cerebral média anterior o mais próximo da calota craniana. O ângulo de insonação foi mantido entre 5º e 19º e o filtro foi ajustado na freqüência de 50-100 Hz. Os recém-nascidos foram avaliados no intuito de comprovar que os fetos eram vigorosos e adequados para a idade gestacional. RESULTADOS: os resultados obtidos para o índice de resistência e pulsatilidade revelaram que a evolução dos valores no período entre a 22ª e a 38ª semana é descrita por uma equação do 2O grau, representando uma parábola. Os valores medianos para o índice de resistência foram de 0,81 na 22ª semana e 0,75 na 38ª semana. O índice de pulsatilidade foi de 1,59 na 22ª semana e 1,45 na 38ª semana. A velocidade sistólica máxima aumentou progressivamente ao longo da gestação, com valores de 26,3 cm/s na 22ª semana e 57,7 cm/s na 38ª semana. A velocidade diastólica final teve aumento progressivo a partir de 26 semanas (5,21 cm/s) até o termo (14,6 cm/s). O tempo de aceleração mostrou aumento significativo apenas entre 26 e 30 semanas, cujos valores foram de 0,04 s na 26ª semana e 0,05 s na 30ª semana. CONCLUSÃO: concluiu-se que os índices de resistência, pulsatilidade e velocidade sistólica máxima apresentaram valores variáveis de acordo com a idade gestacional e são semelhantes ao observado na maioria dos estudos anteriores. O tempo de aceleração apresentou pequenas modificações nas semanas gestacionais avaliadas.

Artéria cerebral média; Ultra-sonografia; Dopplervelocimetria; Gravidez normal


PURPOSE: to study the evolution of the resistance and pulsatility indices, maximum velocity, final diastolic velocity and time of acceleration of the middle cerebral artery of fetuses between 22 and 38 weeks of gestation. METHODS: a prospective and longitudinal observational study was conducted on 33 fetuses of normal pregnant women evaluated between 22 and 38 weeks of pregnancy. The gestational age was determined on the basis of the date of the last menstruation and/or by ultrasound examination during the first trimester. Doppler ultrasound examination was performed by a single observer using an Image Point 1800 (Hewlett Packard) apparatus equipped with a multiple frequency transducer. For the acquisition of the Doppler tracing of the middle cerebral artery, the sample indicator was calibrated for a sample volume of 1 mm³ and placed on the anterior middle cerebral artery as close as possible to the skullcap. The insonation angle was kept between 5º and 19º and the filter was adjusted to a frequency of 50-100 Hz. The newborn infants were evaluated in order to confirm that the fetuses were vigorous and adequate for gestational age. RESULTS: the results obtained for the resistance and pulsatility indices revealed a 2nd-degree equation, representing a parabola whose values for the resistance index were 0.81 during the 22nd week and 0.75 during the 38th week. The pulsatility index was 1.59 during the 22nd week and 1.45 during the 38th week. Maximum systolic velocity increased progressively along pregnancy, with values of 26.3 cm/s during the 22nd week and 57.7 cm/s during the 38th week. Final diastolic velocity increased progressively from the 26th week (5.21 cm/s) to term (14.6 cm/s). Acceleration time increased significantly only between 26 and 30 weeks, with values of 0.04 s during the 26th week and 0.05 s during the 30th week. CONCLUSION: it was concluded that the evolution of the resistance and pulsatility indices and of maximum systolic velocity were similar to those of most studies described in the literature. Acceleration time presented few modifications during the evaluated gestational weeks.

Middle cerebral artery; Ultrasonography; Doppler velocimetry; Normal pregnancy


TRABALHOS ORIGINAIS

Evolução dos índices dopplervelocimétricos da artéria cerebral média em fetos de gestantes normais

Evolution of doppler indices and velocities of the middle cerebral artery in fetuses of normal pregnant women

Antonio Gadelha da Costa; Francisco Mauad Filho; Patricia Spara; Procópio de Freitas; Adilson Cunha Ferreira; Jorge Garcia; Luciano Pinheiro Filho

Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Antonio Gadelha da Costa Rua Iguape, 603, Apto. 53 - Jardim Paulista 14090-090 - Ribeirão Preto - São Paulo. E-mail: gadelha@netsite.com.br

RESUMO

OBJETIVO: observar a evolução dos índices de resistência, pulsatilidade, velocidade máxima, velocidade diastólica final e tempo de aceleração da artéria cerebral média fetal entre a 22ª e a 38ª semana de gestação.

MÉTODOS: foi feito estudo observacional prospectivo e longitudinal no qual 33 fetos de gestantes normais foram avaliados entre a 22ª e a 38ª semana de gestação. A idade gestacional foi determinada pela data da última menstruação e/ou pelo exame ultra-sonográfico do primeiro trimestre. Os exames ultra-sonográficos com Doppler foram feitos por um único observador, que utilizou aparelho modelo Image Point 1800 (Hewlett Packard), com transdutor multifreqüencial. Para a aquisição do traçado Doppler da artéria cerebral média, o indicador de amostra foi calibrado para um volume de amostra de 1 mm3 e colocado na artéria cerebral média anterior o mais próximo da calota craniana. O ângulo de insonação foi mantido entre 5o e 19o e o filtro foi ajustado na freqüência de 50-100 Hz. Os recém-nascidos foram avaliados no intuito de comprovar que os fetos eram vigorosos e adequados para a idade gestacional.

RESULTADOS: os resultados obtidos para o índice de resistência e pulsatilidade revelaram que a evolução dos valores no período entre a 22ª e a 38ª semana é descrita por uma equação do 2O grau, representando uma parábola. Os valores medianos para o índice de resistência foram de 0,81 na 22ª semana e 0,75 na 38ª semana. O índice de pulsatilidade foi de 1,59 na 22ª semana e 1,45 na 38ª semana. A velocidade sistólica máxima aumentou progressivamente ao longo da gestação, com valores de 26,3 cm/s na 22ª semana e 57,7 cm/s na 38ª semana. A velocidade diastólica final teve aumento progressivo a partir de 26 semanas (5,21 cm/s) até o termo (14,6 cm/s). O tempo de aceleração mostrou aumento significativo apenas entre 26 e 30 semanas, cujos valores foram de 0,04 s na 26ª semana e 0,05 s na 30ª semana.

CONCLUSÃO: concluiu-se que os índices de resistência, pulsatilidade e velocidade sistólica máxima apresentaram valores variáveis de acordo com a idade gestacional e são semelhantes ao observado na maioria dos estudos anteriores. O tempo de aceleração apresentou pequenas modificações nas semanas gestacionais avaliadas.

Palavras-chave: Artéria cerebral média. Ultra-sonografia. Dopplervelocimetria. Gravidez normal.

ABSTRACT

PURPOSE: to study the evolution of the resistance and pulsatility indices, maximum velocity, final diastolic velocity and time of acceleration of the middle cerebral artery of fetuses between 22 and 38 weeks of gestation.

METHODS: a prospective and longitudinal observational study was conducted on 33 fetuses of normal pregnant women evaluated between 22 and 38 weeks of pregnancy. The gestational age was determined on the basis of the date of the last menstruation and/or by ultrasound examination during the first trimester. Doppler ultrasound examination was performed by a single observer using an Image Point 1800 (Hewlett Packard) apparatus equipped with a multiple frequency transducer. For the acquisition of the Doppler tracing of the middle cerebral artery, the sample indicator was calibrated for a sample volume of 1 mm3 and placed on the anterior middle cerebral artery as close as possible to the skullcap. The insonation angle was kept between 5o and 19o and the filter was adjusted to a frequency of 50-100 Hz. The newborn infants were evaluated in order to confirm that the fetuses were vigorous and adequate for gestational age.

RESULTS: the results obtained for the resistance and pulsatility indices revealed a 2nd-degree equation, representing a parabola whose values for the resistance index were 0.81 during the 22nd week and 0.75 during the 38th week. The pulsatility index was 1.59 during the 22nd week and 1.45 during the 38th week. Maximum systolic velocity increased progressively along pregnancy, with values of 26.3 cm/s during the 22nd week and 57.7 cm/s during the 38th week. Final diastolic velocity increased progressively from the 26th week (5.21 cm/s) to term (14.6 cm/s). Acceleration time increased significantly only between 26 and 30 weeks, with values of 0.04 s during the 26th week and 0.05 s during the 30th week.

CONCLUSION: it was concluded that the evolution of the resistance and pulsatility indices and of maximum systolic velocity were similar to those of most studies described in the literature. Acceleration time presented few modifications during the evaluated gestational weeks.

Keywords: Middle cerebral artery. Ultrasonography. Doppler velocimetry. Normal pregnancy.

Introdução

A ultra-sonografia com Doppler tem sido um dos métodos propedêuticos mais utilizados na avaliação fetal. A evolução tecnológica trouxe consigo o desenvolvimento de aparelhos ultra-sonográficos sofisticados, que permitiram a obtenção de sonogramas Doppler capazes de reproduzir as modificações hemodinâmicas dos vasos maternos e fetais em face de fatores que venham comprometer o binômio materno-fetal.

Vários vasos têm sido estudados para avaliar a hemodinâmica fetal e dentre os principais merecem destaque as artérias cerebrais, umbilicais, aorta torácica e abdominal e os compartimentos venosos, quais sejam, a veia umbilical, o ducto venoso e a veia cava inferior. A artéria cerebral média é vaso de grande importância, por irrigar grande parte do território cerebral, sendo sua origem na artéria carótida interna. É responsável pelo fluxo sangüíneo da região cortical e subcortical, incluindo o córtex ao nível da fissura de Sylvius e áreas mais profundas como o putâmen e o globo pálido1.

Nas avaliações ultra-sonográficas do território vascular cerebral fetal com uso da técnica Doppler, a artéria cerebral média é o principal vaso estudado. Apresenta a vantagem de ser encontrado facilmente durante o exame ultra-sonográfico2 e, devido a sua localização anatômica, permite a obtenção de ângulos adequados entre o feixe sonoro e o vaso avaliado, obtendo-se, desta forma, sonogramas sem artefatos3,4.

Vários autores preocupam-se com a construção de curvas de normalidade dos índices Doppler da artéria cerebral média, procurando contribuir com o estudo hemodinâmico do feto e suas repercussões diante de doenças que venham comprometer o bem-estar fetal. Neste contexto estão incluídos o estudo longitudinal de Åström et al.5, sobre os índices de pulsatilidade, resistência e relação sístole/diástole da artéria cerebral média; os estudos transversais sobre o índice de pulsatilidade de Arduine e Rizzo6 e Mari e Deter7, e o estudo transversal de Kurmanavicius et al.8 sobre a velocidade média deste vaso fetal entre a 19a e a 40a semana de gestação.

No entanto, observa-se que estes diferem entre si, principalmente pelo tipo de estudo e parâmetros Doppler avaliados. Assim sendo, o estudo de Åström et al.5 teve a característica de ser longitudinal, porém não foi incluída a avaliação da velocidade sistólica máxima. O estudo transversal de Arduine e Rizzo6 envolveu 1556 pacientes, mas o único parâmetro avaliado foi o índice de pulsatilidade.

Mari e Deter7 reuniram em um mesmo estudo gestantes normais e com restrição de crescimento intra-uterino e os fetos normais foram avaliados de forma transversal. Além disso, o único parâmetro avaliado também foi o índice de pulsatilidade.

O estudo suíço de Kurmanavicius et al.8 teve como objetivo a construção da curva de normalidade da velocidade sistólica máxima da artéria cerebral média e envolveu 331 gestantes entre a 19ª e a 40ª semana de gestação, entretanto, teve a característica de ser estudo transversal e ter sido realizado por vários observadores.

O estudo brasileiro e transversal de Carmo et al.9 envolveu 701 gestantes, entretanto o cálculo da idade gestacional não foi confirmado pela ultra-sonografia de primeiro trimestre. Outra característica desse estudo foi a avaliação de apenas dois parâmetros Doppler, a saber, o índice de pulsatilidade e a velocidade sistólica máxima da artéria cerebral média fetal.

Desta forma, o objetivo deste trabalho foi consolidar a observação da evolução dos índices de resistência, pulsatilidade, velocidade sistólica máxima, velocidade diastólica final e tempo de aceleração da artéria cerebral média de fetos normais entre a 22ª e a 38ª semana de gestação.

Pacientes e Métodos

Foi feito um estudo prospectivo longitudinal no qual foram incluídas 33 grávidas normais, com idade entre 15 e 41 anos. O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.

Todas as pacientes selecionadas tinham gestação única, idade gestacional compreendida entre a 22ª e a 38ª semana, calculada pela data da última menstruação e/ou comprimento cabeça-nádega obtido entre a 8ª e a 12ª semana de gestação. Não eram portadoras de enfermidades maternas associadas e/ou próprias da gestação, como também não eram usuárias de fumo, álcool ou drogas. Os fetos não eram portadores de malformação fetal e apresentaram crescimento adequado ao longo da gestação.

Devido à obediência aos critérios de inclusão e exclusão acima relacionados, das 91 pacientes inicialmente selecionadas, apenas 33 foram incluídas no estudo. Por se tratar de estudo longitudinal, todas as pacientes incluídas foram avaliadas na 22a, 26a, 30a, 34a e 38a semana de gestação.

O primeiro exame ultra-sonográfico foi feito entre a 8ª e a 12ª semana de gestação, no intuito de se determinar a idade gestacional pelo comprimento cabeça-nádega. Os exames subseqüentes foram realizados a partir de 22 semanas, com intervalo de quatro semanas, até a 38ª semana de gestação.

Os exames foram realizados por um único observador, utilizando o aparelho ultra-sonográfico modelo Image Point 1800 (Hewlett Packard), com transdutor multifreqüencial. A paciente foi posicionada em decúbito dorsal, posição semi-sentada, em ângulo de 15° e 30° entre a mesma e a mesa de exame, evitando-se, deste modo, a compressão da veia cava10. A seguir, procedia-se à formação das imagens e ao mapeamento Doppler. As aferições do efeito Doppler foram feitas no momento de repouso fetal, em período em que a freqüência cardíaca fetal fosse normal.

Para a aquisição do traçado Doppler da artéria cerebral média foi feito, inicialmente, corte axial da cabeça fetal ao nível do tálamo e cavo do septo pelúcido. Em seguida movia-se o transdutor até observar, por uma inclinação cranial, o polígono de Willis e a pulsação das duas artérias cerebrais médias. Com o auxílio do Doppler de amplitude (angio Doppler) pôde-se visualizar a maior parte do trajeto da artéria a ser estudada, acionando-se, em seguida, o Doppler espectral, obtendo-se as ondas de velocidade de fluxo. O indicador de amostra foi calibrado para um volume de amostra de 1,0 mm3 e colocado na artéria cerebral média anterior o mais próximo possível da calota craniana, antes da sua bifurcação11.

Para evitar artefatos nas ondas de fluxo obtidas, foi feita a correção do ângulo entre o feixe sonoro e o fluxo sangüíneo para valores entre 5o e 19o. O filtro foi ajustado na freqüência de 50-100 Hz, evitando assim a possibilidade de perda do componente diastólico7.

Os cálculos dos parâmetros estudados foram feitos automaticamente, com a imagem congelada, tendo sido acionadas três medidas e o resultado final foi obtido pela média aritmética dos valores adquiridos.

Todos os recém-nascidos incluidos neste estudo foram avaliados e se mostraram vigorosos, com Apgar acima de 7 no primeiro e quinto minuto, assim como adequados para a idade gestacional. Os recém-nascidos com índice de Apgar abaixo de 7 e/ou não adequados para a idade gestacional foram excluídos.

As variáveis dependentes analisadas foram o índice de resistência, índice de pulsatilidade, velocidade sistólica máxima, velocidade diastólica final e tempo de aceleração da artéria cerebral média. A variável independente foi a idade gestacional entre a 22ª e 38ª semana de gestação. Para cada variável foi aplicada a análise de variância (ANOVA) e a análise de regressão. Em todas as análises estatísticas foi utilizado como nível de significância p<0,05.

Resultados

Os valores encontrados para o índice de resistência da artéria cerebral média tiveram distribuição normal. Por meio da análise de regressão foi possível estabelecer modelo matemático que correspondeu a uma equação do segundo grau, cuja representação gráfica é de uma parábola (Figura 1). Observou-se que a variável índice de resistência variou de acordo com a variável idade gestacional, e os valores encontrados foram de 0,81 na 22ª semana, 0,85 na 26a semana e 0,75 na 38a semana (Tabela 1).


O índice de pulsatilidade da artéria cerebral média também apresentou distribuição normal. Por meio da análise de regressão foi possível estabelecer um modelo matemático que, como no índice de resistência, correspondeu também a uma equação do segundo grau, representada graficamente por um parábola (Figura 1). Observou-se que o índice de pulsatilidade variou de acordo com a idade gestacional, e os valores encontrados foram de 1,59 na 22ª semana, 1,81 na 30a semana e 1,45 na 38a semana de gravidez (Tabela 1).

A velocidade sistólica máxima da artéria cerebral média teve distribuição normal. Por meio da análise de regressão obteve-se modelo matemático que correspondeu a uma equação do primeiro grau, cuja representação gráfica é uma reta (Figura 1). A velocidade sistólica máxima da artéria cerebral média aumentou em função da idade gestacional, e os valores encontrados foram de 26,3 na 22ª semana, 43,8 na 30ª semana e 57,7 na 38ª semana de gestação (Tabela 1).

Os valores encontrados para a velocidade diastólica final da artéria cerebral média tiveram distribuição normal. Pela análise de regressão obteve-se uma equação do segundo grau, representada graficamente por uma parábola (Figura 1). Os resultados obtidos para este parâmetro foram de 5,15 na 22ª semana, 6,73 na 30ª semana e 14,6 na 38ª semana de gestação (Tabela 1).

Os valores encontrados do tempo de aceleração da artéria cerebral média, parâmetro ainda não descrito na avaliação fetal, tiveram distribuição normal. Aumentaram ao longo da gestação, entretanto, ao contrário dos outros parâmetros avaliados, apresentaram pequenas variações. Por meio da análise de regressão obteve-se modelo matemático que correspondeu a uma equação do primeiro grau, cuja representação gráfica é uma reta (Figura 2). O tempo de aceleração foi de 0,04 na 22ª semana, 0,05 na 30ª semana e 0,06 na 38ª semana de gestação (Tabela 1).


A freqüência cardíaca fetal foi normal em todos os exames realizados e variou de 122 a 158 batimentos por minuto.

Discussão

A literatura é rica em curvas de normalidade para parâmetros Doppler da artéria cerebral média fetal. Entretanto, os estudos avaliados apresentam várias metodologias, diferindo quanto ao tipo de estudo, população estudada, parâmetro utilizado para o cálculo da idade gestacional, parâmetro Doppler avaliado em cada estudo, equipamento utilizado e número de observadores.

O presente estudo apresentou como característica importante a confirmação da idade gestacional pelo comprimento cabeça-nádega entre 8 e 12 semanas, dando maior fidedignidade à idade gestacional na qual foram feitas as avaliações Doppler12,13.

Os exames foram feitos por um único observador, no mesmo equipamento, evitando assim a variação interobservador e interequipamento. Em cada paciente examinada foram feitas três aferições dos índices Doppler da artéria cerebral média, utilizando-se como dado final, para cada índice, a média aritmética dos três valores obtidos.

Todas as medidas Doppler foram obtidas com a correção do ângulo entre o feixe sonoro e o vaso estudado para valores que variaram entre 5o e 19o, distanciando-se significativamente do ângulo 90o, obtendo-se, desta forma, sonogramas estáveis, sem artefatos e, conseqüentemente, com medidas precisas dos diversos índices avaliados.

No estudo longitudinal de Åström et al.5, o ângulo de insonação da artéria cerebral média foi de 5o a 10o, entretanto o cálculo da idade gestacional não foi feito no primeiro trimestre e a velocidade sistólica máxima e tempo de aceleração não foram avaliados. Arduine e Rizzo6, em estudo transversal, utilizaram ângulo de insonação abaixo de 500, avaliando apenas o índice de pulsatilidade. No estudo transversal de Kurmanavicius et al.8 também foram utilizados ângulos de insonação adequados (entre 0o e 20o), para a avaliação da velocidade sistólica máxima, entretanto a coleta de dados foi feita em vários equipamentos e por vários examinadores.

Em 1987, Kirkinen et al.3 já observavam que havia diminuição nos valores do índice de resistência na gestação a termo. Os estudos intensificaram-se nesta área, e dois anos após, Åström et al.5 mostraram que o índice de resistência da artéria cerebral média foi de 0,87 entre a 28ª e a 29ª semana, diminuindo para 0,72 na 40a semana. Em 2000, Meyberg et al.14 enfocaram o índice de resistência da artéria cerebral média ao longo da gestação com redução significativa deste índice no terceiro trimestre, cujos valores decresceram de 0,88 para 0,67 entre a 28ª e a 40ª semana de gravidez. Comparando os valores do índice de resistência da artéria cerebral média obtidos no nosso estudo com os descritos na literatura, observou-se que este parâmetro também decresceu na gravidez a termo.

Com relação ao índice de pulsatilidade, observou-se valor menor nos extremos das idades gestacionais avaliadas, isto é, na 22ª e na 38ª semana de gestação. Os valores obtidos para este índice, no presente estudo, foram de 1,59 na 22a semana, 1,81 na 30a semana e 1,45 na gestação a termo. Os resultados obtidos por Arduine e Rizzo6, em estudo transversal que abrangeu 1556 gestantes normais entre a 20ª e a 42ª semana de gravidez, são concordantes com nossos achados. Estes autores também encontraram menores valores para o índice de pulsatilidade na 22ª semana e a termo, com valores de 1,91 na 22a, aumentando para 1,98 na 30a e decrescendo no termo, com valores que variaram de 1,73 na 38a semana para 1,48 na 42a semana.

Com o objetivo de construir curva de normalidade para o índice de pulsatilidade da artéria cerebral média, Carmo et al.9, em estudo transversal que envolveu 701 pacientes, observaram que os valores do índice de pulsatilidade foram de 1,6 na 20a semana, estabilizando entre a 27ª e a 30ª semana, época em que o valor foi de 2,1, e finalmente reduzindo para 1,2 na 40a semana.

A explicação para a diminuição da impedância no fluxo sangüíneo da artéria cerebral média na 22ª e 38ª semana de gestação pode ser encontrada nos estudos de Dobbing e Sands15, quando relataram que em seres humanos ocorre maior multiplicação celular no cérebro entre a 15ª e a 20ª semana de gravidez, no início do terceiro trimestre e provavelmente no final do segundo ano de vida pós-natal. Acredita-se que a multiplicação celular observada nestes períodos está relacionada a metabolismo aumentado no cérebro, ocorrendo, portanto, diminuição da impedância do fluxo sangüíneo nos compartimentos vasculares cerebrais.

Nos últimos anos têm aumentado os estudos sobre o comportamento da velocidade sistólica máxima da artéria cerebral média em face dos estados anêmicos fetais, observando-se aumento deste índice em fetos aloimunizados com anemia moderada e grave16.

Kurmanavicius et al.8 relataram a acurácia e a utilidade clínica da velocidade sistólica máxima da artéria cerebral média na prática obstétrica, tendo observado que em grávidas normais este índice aumenta em função da idade gestacional. Estes autores observaram valores velocimétricos de 26,0 cm/s na 22a semana e 60,1 cm/s na 38a semana de gestação. Estes dados são semelhantes aos encontrados na nossa casuística, cujos valores quantitativos encontrados foram de 26,3 cm/s na 22a semana e 57,7 cm/s na 38a semana de gestação.

A literatura é pobre em relação ao estudo da velocidade diastólica final da artéria cerebral média fetal. Entretanto, Noordam et al.4 já faziam referência à velocidade diastólica final em estudo caso-controle, no qual compararam fetos com restrição de crescimento intra-uterino com fetos normais, observando que dentre o índice de pulsatilidade e a velocidade diastólica final, este último foi o mais sensível na detecção de restrição de crescimento intra-uterino em relação ao grupo de gestantes normais. Os valores obtidos no nosso estudo não mostraram existir diferenças entre os valores da 22a e 26a semanas. Entretanto, a partir da 26a semana a velocidade diastólica final aumentou, tendo sido 6,73 cm/s na 30a semana e 14,6 cm/s na 38a semana de gestação.

Quanto ao tempo de aceleração não encontramos, na literatura pesquisada, relatos sobre este parâmetro na artéria cerebral média fetal. Por outro lado, é notável a importância que o tempo de aceleração possui nas avaliações das estenoses da artéria renal de adultos, tendo-se encontrado acurácia de 87%, sensibilidade de 100% e especificidade de 83% no diagnóstico de estenose da artéria renal, quando seus valores são maiores que 0,0717.

É importante salientar que o tempo de aceleração está relacionado à velocidade sistólica máxima, tendo em vista que, para a mesma freqüência cardíaca fetal, quando esse parâmetro aumenta ocorre diminuição do tempo de aceleração. Os valores encontrados para este parâmetro na nossa casuística não mostraram grandes diferenças entre as semanas gestacionais avaliadas. Entretanto, observou-se aumento significante entre a 26a e a 30a semana de gestação, cujos valores foram de 0,04 s e 0,05 s, respectivamente.

Tendo em vista os resultados obtidos, queremos enfatizar a importância dos índices de resistência e pulsatilidade da artéria cerebral média nos estudos sobre vitalidade fetal. Deve-se salientar, no entanto, a aplicabilidade da velocidade sistólica máxima da artéria cerebral média nas avaliações de fetos anêmicos, principalmente na doença hemolítica perinatal. O presente trabalho foi feito por estudo do tipo coorte, determinando os valores desse parâmetro em fetos normais entre a 22ª e a 38ª semana de gestação, cuja idade gestacional foi calculada pela ultra-sonografia no primeiro trimestre.

Quanto ao tempo de aceleração, parâmetro ainda não descrito na literatura em obstetrícia, apresentou pequenas modificações nas semanas gestacionais avaliadas. O mesmo ocorreu com a freqüência cardíaca fetal. Este achado vem mostrar que os fetos estudados são normais quanto a sua integridade cardiovascular, pois a energia ventricular necessária para irrigar cada grama de tecido fetal foi praticamente constante ao longo da gestação.

Recebido em: 28/11/2002

Aceito com modificações em: 23/6/2003

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Out 2003
    • Data do Fascículo
      Jul 2003

    Histórico

    • Aceito
      23 Jun 2003
    • Recebido
      28 Nov 2002
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