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Modelo digital de elevação na caracterização de solos desenvolvidos de basalto e material arenítico

Geoprocessing for the characterization of soils developed from basalt and sand material

Resumos

Os levantamentos de solos são na maioria antigos e pouco detalhados, geralmente nos níveis exploratório e de reconhecimento. Isso pode ser explicado pelo fato de que o método tradicional de levantamento de solos é lento e caro, requerendo grande número de observações de campo. Assim, o presente trabalho teve como objetivo caracterizar unidades de mapeamento de solos das regiões de Ibaté e São Carlos, SP, desenvolvidos de materiais basálticos e areníticos em função da declividade e altitudes correspondentes, com base em modelo digital de elevação (MDE). Primeiramente, foi feito um mapa de solos semidetalhado pelo método tradicional. Posteriormente, utilizando-se curvas de nível da região, foi elaborado o MDE, do qual foram extraídos mapas com diferentes classes de declividade e elevação. Por meio da tabulação cruzada, foi determinada a incidência de cada solo nas respectivas classes de declives e altitudes. Cada solo apresentou comportamento diferenciado em relação às classes de declive. Contudo, nas faixas limítrofes de declividade pode ocorrer sobreposição de dois ou mais solos. Na referida região, o Latossolo Amarelo encontra-se predominantemente nas regiões mais altas e de relevo plano; entretanto, solos pouco intemperizados, como os Neossolos Litólicos, aparecem em diferentes faixas de declividade. Conclui-se que o conhecimento da distribuição dos solos no relevo é de grande importância, pois facilita a execução do levantamento de solos. O modelo de elevação apresenta semelhanças com o mapa de solos, podendo auxiliar na sua determinação. As variações de solo, no entanto, são mais complexas, não dispensando as observações de campo.

modelo digital de elevação; classes de solo; sistema de informação geográfica


Brazilian soil surveys are mostly outdated, with few details, usually based on discovery and recognition. This fact can be ascribed to the traditional, slow and expensive soil survey method, requiring a great number of field observations. Thus, faster and cheaper soil mapping techniques must be developed. The objective of this study was to characterize soil mapping units in the region of Ibaté and São Carlos, state of São Paulo, measuring slopes and altitudes, based on a digital elevation model (DEM). First a semi-detailed soil map was drawn based on the traditional methodology. Then, the DEM was elaborated using contour lines of the region, from which maps with different slope and elevation classes were extracted. By cross tabulation each soil was determined in each slope and elevation class. Each soil responded differently in relation to the slope classes. However, an overlapping of two or more soils can occur in the limit ranges. In the study area, the Typic Haplustox can be found predominantly in higher and plain areas. Low weathered soils such as the Typic Udorthent are however found at different slope levels. It was concluded that knowledge on the soil distribution in the relief is very important for soil surveys. The DEM have similarities with the soil map and can contribute with some information. Soil variations are however extremely complex, which makes field observations indispensable.

Digital elevation model; Geographic information system; Soil classes


NOTA

Modelo digital de elevação na caracterização de solos desenvolvidos de basalto e material arenítico1 1 Trabalho retirado da Tese de Mestrado do primeiro autor apresentada à Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz" – ESALQ. Recebido para publicação em dezembro de 2005 e aprovado em agosto de 2007.

Geoprocessing for the characterization of soils developed from basalt and sand material

José Geraldo de Abreu Sousa JuniorI; José Alexandre M. DemattêII

IMestre em Solos e Nutrição de Plantas do Departamento de Ciência do Solo, Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz– ESALQ/USP. Av. Pádua Dias 11, Caixa Postal 09, CEP 13418-900 Piracicaba (SP). E-mail: josegeraldojunior@hotmail.com

IIProfessor Associado do Departamento de Ciência do Solo, ESALQ/USP. E-mail: jamdemat@esalq.usp.br

RESUMO

Os levantamentos de solos são na maioria antigos e pouco detalhados, geralmente nos níveis exploratório e de reconhecimento. Isso pode ser explicado pelo fato de que o método tradicional de levantamento de solos é lento e caro, requerendo grande número de observações de campo. Assim, o presente trabalho teve como objetivo caracterizar unidades de mapeamento de solos das regiões de Ibaté e São Carlos, SP, desenvolvidos de materiais basálticos e areníticos em função da declividade e altitudes correspondentes, com base em modelo digital de elevação (MDE). Primeiramente, foi feito um mapa de solos semidetalhado pelo método tradicional. Posteriormente, utilizando-se curvas de nível da região, foi elaborado o MDE, do qual foram extraídos mapas com diferentes classes de declividade e elevação. Por meio da tabulação cruzada, foi determinada a incidência de cada solo nas respectivas classes de declives e altitudes. Cada solo apresentou comportamento diferenciado em relação às classes de declive. Contudo, nas faixas limítrofes de declividade pode ocorrer sobreposição de dois ou mais solos. Na referida região, o Latossolo Amarelo encontra-se predominantemente nas regiões mais altas e de relevo plano; entretanto, solos pouco intemperizados, como os Neossolos Litólicos, aparecem em diferentes faixas de declividade. Conclui-se que o conhecimento da distribuição dos solos no relevo é de grande importância, pois facilita a execução do levantamento de solos. O modelo de elevação apresenta semelhanças com o mapa de solos, podendo auxiliar na sua determinação. As variações de solo, no entanto, são mais complexas, não dispensando as observações de campo.

Termos de indexação: modelo digital de elevação, classes de solo, sistema de informação geográfica.

SUMMARY

Brazilian soil surveys are mostly outdated, with few details, usually based on discovery and recognition. This fact can be ascribed to the traditional, slow and expensive soil survey method, requiring a great number of field observations. Thus, faster and cheaper soil mapping techniques must be developed. The objective of this study was to characterize soil mapping units in the region of Ibaté and São Carlos, state of São Paulo, measuring slopes and altitudes, based on a digital elevation model (DEM). First a semi-detailed soil map was drawn based on the traditional methodology. Then, the DEM was elaborated using contour lines of the region, from which maps with different slope and elevation classes were extracted. By cross tabulation each soil was determined in each slope and elevation class. Each soil responded differently in relation to the slope classes. However, an overlapping of two or more soils can occur in the limit ranges. In the study area, the Typic Haplustox can be found predominantly in higher and plain areas. Low weathered soils such as the Typic Udorthent are however found at different slope levels. It was concluded that knowledge on the soil distribution in the relief is very important for soil surveys. The DEM have similarities with the soil map and can contribute with some information. Soil variations are however extremely complex, which makes field observations indispensable.

Index terms: Digital elevation model, Geographic information system, Soil classes.

INTRODUÇÃO

Os processos de tomada de decisão no setor agrícola geralmente têm como base mapas pedológicos. Esses mapas podem ser utilizados em combinação com outros fatores, auxiliando no planejamento agrícola – como talhonamento, ambientes de produção (Joaquim et al., 1994), amostragem de terra para fins de fertilidade, racionalização na aplicação de fertilizantes, programas de conservação dos solos e sistemas de uso da terra –, visando sempre o aumento de produtividade utilizando o solo de forma sustentável.

As relações entre os solos e as formas da paisagem têm sido por longo tempo à base do mapeamento de solos. Tradicionalmente, utiliza-se a análise estereoscópica de fotografias aéreas para delineamento manual das unidades de solo-paisagem que posteriormente são constatadas no campo. Por outro lado, a análise digital do terreno introduz algumas vantagens em relação ao método tradicional para separação dessas unidades: é uma alternativa rápida e econômica que pode ser aplicada para quantificação e classificação do relevo, permitindo a definição automática ou semi-automática das unidades morfológicas da paisagem (Irvin et al., 1997; Reis et al., 2004).

Apesar de a caracterização da relação solo/paisagem ser importante como base conceitual no processo de mapeamento de solos, os trabalhos existentes não contemplam estudos pormenorizados sobre relevo, altitude e solos, limitando-se a características gerais dos solos. Dessa forma, verifica-se a importância de trabalhos como o de Ippoliti et al. (2005), os quais obtiveram bons resultados no delineamento de pedopaisagens em uma microbacia no município de Viçosa (MG), baseando-se no modelo digital de elevação e no cálculo dos atributos do relevo (elevação, declividade e curvatura). Esses resultados demonstram, portanto, a necessidade de caracterização de diferentes regiões, tendo-se medidas mais detalhadas sobre a variabilidade de solos e suas respectivas paisagens.

Assim, o presente trabalho teve como objetivo caracterizar unidades de mapeamento de solos das regiões de Ibaté e São Carlos, SP, desenvolvidos de materiais basálticos e areníticos em função da declividade e altitudes correspondentes, com base em modelo digital de elevação, visando-se aprimorar essa técnica ainda pouco utilizada, mas com possibilidade de ser realizada em outras regiões, tornando o mapeamento do solo mais acurado, menos oneroso e mais rápido do que o realizado pelos métodos tradicionais.

MATERIAL E MÉTODOS

Descrição da área de estudo

A área localiza-se no Estado de São Paulo, nos municípios de Ibaté e São Carlos. É delimitada pelas coordenadas geográficas 21 ° 46 ' 55 '' S / 48 ° 09 ' 42 '' W e 22 ° 10 ' 08 '' S / 47 ° 48 ' 33 '' W. Apresenta aproximadamente 9.000 ha cultivados com cana-de-açúcar em altitudes variando de 500 a 950 m. O clima da região, segundo Köppen, é do tipo Cwa (subtropical com inverno seco e verão quente/úmido); a precipitação e temperatura média anual são de 1.500 mm e 23 °C, respectivamente.

A litologia é representada principalmente pelas formações Serra Geral, Botucatu e Pirambóia (Grupo São Bento) e Cobertura da Serra de Santana e Similares (Grupo Taubaté). As rochas da Formação Serra Geral são vulcânicas de derrames basálticos; a Formação Botucatu, arenitos eólicos; e a Formação Pirambóia, arenitos oriundos de depósitos fluviais e de planícies de inundação (Bistrichi et al., 1981).

Foram alocados pontos para observação no campo pelo método da transeção (toposseqüências), tendo por objetivo identificar os limites de solos. Foram amostrados 100 pontos com trado em três profundidades (0–20, 40–60 e 80–100 cm), designadas de camadas A, B e C, respectivamente. As amostras foram analisadas quimicamente, para determinar pH (CaCl2, H2O e KCl), teor de matéria orgânica, P, K, Mg, Ca, Al e H + Al, segundo método descrito em Raij et al. (2001), e granulometricamente, para determinar os teores de areia (grossa e fina), silte e argila (Camargo et al., 1987), sendo apresentadas em Sousa Junior (2005). Para ajudar na caracterização de alguns solos, foi determinado o Fe2O3 pelo método do ataque sulfúrico (Camargo et al., 1986).

A partir dos resultados das análises dos solos, das observações de campo e de todo o conjunto de informações da região, foram demarcados 12 perfis, nos quais foram realizadas a descrição morfológica de acordo com Lemos & Santos (1996) e definidas as unidades taxonômicas, para finalmente se elaborar o mapa semidetalhado pelo método convencional, o qual serve de base para este estudo. A classificação dos solos foi realizada seguindo os critérios estipulados pelo Sistema Brasileiro de Classificação de Solos (Embrapa, 1999).

Modelagem de dados altimétricos e correlação com solos

Utilizando-se curvas de nível, foi gerado um modelo digital de elevação do terreno (MDE). Na geração deste modelo foi usada a Rede Irregular de Triangulações (Irregular Triangulated Networks – TIN), que reproduz elevações ao plotar pontos em vértices de triângulos. Foi empregado o software ArcMap 8.3 (ESRI, 2000) módulo 3D Analyst. Segundo alguns autores (Felgueiras & Câmara, 2005), a grade triangular permite maior exatidão na análise quantitativa dos dados do que a retangular; ela também é considerada melhor para representar as feições do relevo, pois captura sua complexidade sem a necessidade de grande quantidade de dados.

A partir da derivação do modelo digital do terreno foram geradas as declividades da área. A classificação das declividades foi realizada primeiramente, conforme sugerido por Embrapa (1999), sendo elas: 0–3 cm m-1 (plano), 3–8 cm m-1 (suave ondulado), 8–20 cm m-1 (ondulado), 20–45 cm m-1 (forte ondulado), 45–75 cm m-1 (montanhoso) e 75–100 cm m-1 (escarpado). Com o objetivo de verificar em que faixas de declividade realmente os solos podem ser caracterizados, foi gerada uma classificação com 23 classes, da seguinte maneira: variando de 1 em 1 cm m-1 até 20 cm m-1 e depois repetindo as classes de 45–75 cm m-1 e 75–100 cm m-1.

Foram geradas 30 classes de elevação para o MDE, variando de 565 a 865 m de altitude, em intervalos de 10 em 10 m. Com a finalidade de quantificar a ocorrência dos solos em relação à elevação e declividade do terreno, efetuou-se a tabulação cruzada dos planos de informação (PI) referentes ao mapa de solos versus classes de declividade, e mapa de solos versus classes de elevação. Esse dispositivo permitiu calcular as áreas das interseções entre as classes e o mapa de solo.

Foram avaliados e caracterizados os solos da região, com respectivas posições no relevo e classes de declividade. Com base na análise das informações de declividade, foi elaborada uma tabela final com as faixas de declividade mais ocorrentes e os respectivos solos para a referida região.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Distribuição dos Solos da Região

O estabelecimento da distribuição cartográfica das classes de solos presentes foi realizado pelo método convencional, como estabelecido por Embrapa (1995). Conforme o levantamento realizado na área de estudo, foi gerado um mapa com as classes de solos identificadas na região (Figura 1). O mapa indica uma área bastante heterogênea, predominando ao norte, nos topos, os Latossolos e, próximos aos canais de drenagem, os Argissolos. No sul da região surgem os solos ricos em ferro, Latossolo Vermelho e Nitossolo Vermelho, justamente pela presença do material de origem: o basalto. Toda a parte sul é demarcada por uma encosta predominantemente de basalto, ocorrendo o Cambissolo Háplico e o Neossolo Litólico. Na parte maior ao sul e inferior à encosta, surgem solos com material mais arenoso, misturados a solos argilosos.


Na maior parte da área predomina o Latossolo Amarelo, abrangendo aproximadamente 30 % da área, seguido de Argissolo Vermelho (12,1 %), Neossolo Litólico (10,5 %) e Nitossolo Vermelho (10,2 %). Essa distribuição está de acordo com a representatividade dos solos tropicais, em que predominam aqueles com maior relação infiltração/deflúvio, com horizontes diagnósticos B latossólicos (Bw). O LA apresentou-se em declividade máxima de 10,8 cm m-1 (Quadro 1), com baixo desvio-padrão. Entretanto, a média geral da declividade que melhor representa esta unidade é de 2,3 cm m-1.


Também comum e importante é a presença dos Argissolos com drenagem moderada e caracterizados pelo horizonte diagnóstico B textural (Bt). Esses solos, por sua vez, encontram-se em declividades superiores a 20 cm m-1, o que é coerente, por ser um solo com drenagem moderada. Os Cambissolos (CX) – solos pouco profundos com horizonte diagnóstico B incipiente (Bi) – estão localizados em áreas de declividade acentuada, próximo a 30 cm m-1, porém semelhantes a alguns Argissolos (PVA), que também são encontrados em declividades acentuadas. Por outro lado, a média do CX é maior, chegando a 7,7 cm m-1. Isso indica que áreas dos CX também podem ocorrer em declividades similares à dos Argilosos (Quadro 1).

Classes de solos vs relevo

O termo relevo refere-se às formas do terreno que compõem a paisagem. Sua ação reflete-se diretamente sobre a dinâmica da água, tanto no sentido vertical (infiltração) como lateral (escorrimento superficial – enxurradas e dentro do perfil), e indiretamente (temperatura e umidade), por meio da incidência diferenciada da radiação solar, do decréscimo das temperaturas com o aumento das altitudes, bem como sobre os seres vivos e o tipo de vegetação (Oliveira et al., 1992).

O MDE pode auxiliar na identificação de unidades de paisagem. Verifica-se tendência de aparecimento de determinadas classes de solos em posições específicas do relevo para a região estudada (Figura 1). Observa-se que a mancha do LAd na parte norte, bem como o PVd ao longo do canal de drenagem, é bastante semelhante (Figura 1) – essa tendência mostra a utilidade do referido MDE. Por outro lado, também se observam vários pontos onde não há variação significativa do modelo, e sim no mapa de solos. Isso leva a crer que as variações no campo são mais complexas e exigem verificações de campo ou de outros métodos auxiliares.

Constata-se que a paisagem é composta predominantemente por formas suave onduladas (48,0 %) e plana (40,7 %), e somente 9,9 e 1,4 % encontram-se em um terreno ondulado e fortemente ondulado, respectivamente (Figura 1 e Quadro 1).

A princípio, a distribuição da área dentro dessas faixas de declividade sugeridas por Embrapa (1999) levaria a crer na existência de poucas classes de solo na região, devido à pouca variação do relevo. No entanto, há grande variação de solos dentro da área de estudo (Figura 1), corroborando a necessidade do maior detalhamento dessas declividades, para averiguar em quais faixas podem ocorrer mudanças de solos e se, em mesmas declividades, pode haver diferentes classes de solos. A classificação sugerida por Embrapa (1999) deve ser mantida por ser de caráter geral e nacional, porém informações regionais devem ser obtidas e discutidas.

Classes de solos vs declividade

Analisando a distribuição dos solos ao longo das classes de declividade sugeridas por Embrapa (1999), nota-se que a grande maioria dos solos está entre as duas primeiras faixas: plano e suave ondulado (Quadro 1). Apenas os Cambissolos e os Neossolos Litólicos são encontrados em percentagens expressivas em outras faixas, podendo-se diferenciá-los dos outros solos por esta característica. Os solos que ocorrem em terrenos íngremes são submetidos ao rejuvenescimento (ablação), por meio dos processos erosivos naturais. Nas áreas cuja vegetação revela menor disponibilidade de água e, ou, maior transitoriedade de residência das águas pluviais, as reações de hidrólise e dissolução processam-se em condições hídricas menos favoráveis à sua manifestação e, em contrapartida, é intensificada a ação dos fenômenos de umedecimento e secagem dos constituintes coloidais orgânicos. Disso resultam solos relativamente menos profundos e evoluídos (Oliveira et al., 1992).

Verifica-se que os LVAs não foram encontrados em declividades maiores que 15,9 cm m-1 (Quadros 1 e 2), concordando com os resultados obtidos por Lacerda et al. (2005), que correlacionaram dados de declividade, solo, geologia e vegetação nativa do Distrito Federal e verificaram que os Latossolos se encontram em declividades de até 10 cm m-1. No entanto, Ippoliti et al. (2005), utilizando ferramentas de SIG (MDE) para delineamento de geoformas e pedopaisagens no município de Viçosa, MG, verificaram a presença de Latossolos Vermelho-Amarelos cambissólicos em declives maiores que 45 cm m-1. Estes mesmos autores constataram a presença de Cambissolos Háplicos latossólicos nesta mesma declividade. Já na área avaliada deste trabalho, os CXs foram identificados em declividade máxima de 29,6 cm m-1. Essas variações indicam a necessidade de caracterização regional da paisagem como base para futuros levantamentos.


Os LVs foram encontrados de forma equivalente entre 0–3 e 3–8 cm m-1 de declive, com aproximadamente 50 % de ocorrência em cada uma delas. Reis et al. (2004), utilizando-se também de técnicas de geoprocessamento para investigação detalhada de relacionamentos entre relevo e classes de solo no município de Bandeirantes, Paraná, verificaram que 37,4 % dos LVs da área em estudo encontravam-se entre 0 e 3 cm m-1 de declividade. Isso demonstra a variabilidade regional que ocorre na correlação entre solo e declive.

O Nitossolo apresentou percentagem significativa de sua área (17 %) distribuída em regiões onduladas (Quadro 1), concordando com Oliveira et al. (1992). Estes autores afirmam que esta classe de solo com perfil raso ou pouco profundo pode ocorrer em vertentes declivosas dos planaltos basálticos. Reis et al. (2004) encontraram a maior parte do NV (38,8 %) distribuída em terreno ondulado do Paraná. Por outro lado, a mesma unidade de mapeamento, o NV, também ocorre predominantemente (69 %) em áreas de 3–8 cm m-1 na região de São Carlos (Quadro 1).

Analisando os Argissolos, nota-se que, conforme o matiz vai ficando mais amarelo, aumenta-se a incidência desses solos nas áreas mais altas e planas, e, conforme o matiz vai se tornando mais vermelho, aumenta a proporção desses solos em relevo suave ondulado, nas posições mais baixas. Isso se deve à influência de diferentes materiais de origem no processo de formação desses solos. Nas partes mais altas há grande influência dos arenitos, e nas posições inferiores, dos diabásios.

Como se pode observar, as classes de declividade sugeridas por Embrapa (1999) não denotam uma faixa específica de declive na qual possa ser inferida com maior segurança a possibilidade de ocorrência de determinado solo, o que se deve ao fato de a maioria dos solos aparecer em apenas duas faixas: 0–3 e 3–8 cm m-1 de declive. Dessa forma, estas faixas foram "destrinchadas" para se obter maior número de classes de declive, na tentativa de definir melhor as classes de solos de acordo com a declividade do terreno (Quadro 1).

Verifica-se, pelas classes da Embrapa (1999), que o Neossolo Quartzarênico concentra-se quase que em sua totalidade entre 0 e 8 cm m-1 de declividade. O detalhamento (Quadro 1) indica que 75 % de sua ocorrência está situada entre 2 e 6 cm m-1 de declividade. Nesses solos, os perfis são homogêneos, limitando-se a diferenciação à expressão de um horizonte A formado de materiais sumamente arenosos; na fração areia, o quartzo é o mineral dominante (Resende et al., 2005). São solos excessivamente drenados, por isso sua maior ocorrência em locais planos a suave ondulados.

Com base nas faixas de declividade da Embrapa (1999), infere-se que o RL ocorre predominantemente (58 % do total) em declives entre 8 e 20 cm m-1. Contudo, analisando o quadro 1 detalhadamente, verifica-se que este solo ocorre de maneira uniforme por quase todas as declividades, havendo ocorrência equivalente dele em declividades entre 5 e 7 cm m-1. O Cambissolo concentrou-se entre 4 e 10 cm m-1 de declividade, diferentemente das classes sugeridas pela Embrapa, onde este solo se concentrava entre 3 e 20 cm m-1.

Procurou-se relacionar cada classe de solo com a declividade mais propícia de sua ocorrência nessa região (Quadro 1). Para isso, levaram-se em consideração os menores intervalos de declividade nos quais ocorressem pelo menos 50 % de determinada classe de solo de forma bem distribuída e com a menor variação (Quadro 2). A utilização desse tipo de informação pode auxiliar na tomada de decisões em futuras interpretações de solos da referida região tanto em campo como fotointerpretativamente, além de outros métodos que necessitem de conhecimentos relativos à declividade vs solos.

Classes de solos vs elevação

Apesar de aparentemente a maioria dos solos variar muito quanto à altitude que aparece no relevo, nota-se tendência de determinados solos ocorrerem de forma predominante em certas posições (Quadro 3). Na parte mais alta da paisagem há predominância do LA, concentrando-se aproximadamente 40 % entre as altitudes de 815 e 835 m. Esta classe de solo também está presente em altitudes mais baixas (745–755 m), porém em quantidades pouco significativas (0,22 %). Outro forte indicador da alta incidência do LA é que, na região mapeada, 1.302 ha (15 % do total) encontram-se entre 825 e 865 m de altitude, e nesta área o LA está presente em 1.200 ha. Verifica-se que este solo ocorre em 2.625 ha (29 % da área total), numa elevação média de 824 m de altitude.


Analisando as outras subordens dos Latossolos, verifica-se que o LVA ocorre em posições mais baixas do relevo (775–805 m), em média a 782 m , e o LV a 766 m. Este último, por sua vez, mostra-se mais bem distribuído ao longo da paisagem, aparecendo em percentagens similares entre 725 e 775 m (Quadro 3). Esses resultados concordam com os obtidos por Miklos (1992), que, estudando uma transeção no reverso da Cuesta Basáltica do Planalto Ocidental, verificou a presença de LVA em altitudes médias de 800 m e de LV em 700 m. Lepsch et al. (1977), estudando a região de Echaporã, SP, obtiveram resultados semelhantes aos deste trabalho e verificaram a presença de LV nas partes mais altas e planas da paisagem (700 m).

Assim como os Latossolos, os Argissolos de coloração mais amarela (PA) predominaram em posições mais altas do relevo, e os mais vermelhos, PVAs seguidos dos PVs, nas posições mais baixas. Os PAs ocorrem em altitude média de 786 m, enquanto os PVAs em 768 m e os PVs em 754 m (Quadro 3). Dos » 9.000 ha mapeados, 1.302 ha (15 % do total) encontram-se entre 825 e 865 m, e o LA está presente em 1.200 ha desta área. Este solo também se encontra distribuído em outras altitudes, porém em quantidades pouco expressivas.

Analisando a declividade e elevação em que ocorre o Neossolo Quartzarênico (Quadros 2 e 4, respectivamente), verifica-se que o RQ ocorre predominantemente em terrenos planos a suave ondulados e em altitudes mais baixas, sendo isso característico da região, onde ocorrem depósitos de materiais arenosos no sopé dos morros testemunhos de basalto. Na região destacam-se as cuestas arenítico-basálticas. O limite entre a Depressão Periférica e as Cuestas Basálticas é a frente escarpada, formando paredões, esculpidos em arenitos e basaltos das formações Serra Geral, Botucatu e Pirambóia. Este paredão, extremamente íngreme, que em algumas posições do relevo atinge quase a verticalidade, é representado por exposições de basalto e arenito Botucatu-Pirambóia.

Comparando os resultados deste trabalho com os obtidos por Prado (1995), que estudou a distribuição dos solos na paisagem em diversas regiões do Brasil, nota-se que a ocorrência dos solos em determinadas posições do relevo varia muito de região para região. Numa transeção feita no Estado de Rondônia, por exemplo, observou-se que a associação dos solos RQ + RL ocorria predominantemente nas partes mais altas (600 m). Por outro lado, nas regiões mais baixas e planas ocorreram associações de LA + AQ (200 m). Neste local também foram observados morros testemunhos em altitudes de 200 a 400 m, desenvolvendo solos como PVA + NV + RL.

CONCLUSÕES

1. Na região estudada, os LAs ocorrem principalmente nas partes mais altas do relevo (815–835 m); os RQs, nas posições mais baixas (685–725 m); e os PVAs, nas intermediárias.

2. As relações entre solos e classes de declive são dependentes e devem ser devidamente caracterizadas regionalmente. Na área de estudo sugerem-se as seguintes classes de declive e os respectivos solos: 2–4 cm m-1 (LV); 1–4 cm m-1 (LVA); 1–3 cm m-1 (LA); 3–7 cm m-1 (NV); 3–6 cm m-1 (PV e PVA); 2–5 cm m-1 (PA); 0–6 cm m-1 (RQ); 5–9 cm m-1 (CX); e 5–45 cm m-1 (RL).

3. O MDE auxilia de maneira eficaz no mapeamento de solo, tornando-o mais acurado, não dispensando, entretanto, o apoio de campo.

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  • 1
    Trabalho retirado da Tese de Mestrado do primeiro autor apresentada à Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz" – ESALQ. Recebido para publicação em dezembro de 2005 e aprovado em agosto de 2007.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      25 Abr 2008
    • Data do Fascículo
      Fev 2008

    Histórico

    • Recebido
      Dez 2005
    • Aceito
      Ago 2007
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