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Ácaros (Acari) de seringueira (Hevea brasiliensis Muell. Arg., Euphorbiaceae) e de euforbiáceas espontâneas no interior dos cultivos

Mites (Acari) from rubber trees (Hevea brasiliensis Muell. Arg., Euphorbiaceae) and spontaneous euphorbiaceous in rubber trees cultivation

Resumos

Foram realizadas coletas trimestrais em 2001 em três cultivos de seringueira no Noroeste do estado de São Paulo. Foram amostradas três seringueiras de cada local. Nas entrelinhas das seringueiras foram coletadas quatro espécies de euforbiáceas espontâneas: Chamaesyce hirta, C. hyssopifolia, Euphorbia heterophylla e Phyllanthus tenellus. Foram coletados 8.954 ácaros de 38 espécies, pertencentes a 31 gêneros de 11 famílias. Tydeidae e Phytoseiidae tiveram maior diversidade de espécies, 9 e 7, respectivamente. As famílias mais abundantes foram Eriophyidae (3.594), Tydeidae (2.825) e Tenuipalpidae (1.027). As espécies mais abundantes nas seringueiras foram: fitófagas - Calacarus heveae Feres, Tenuipalpus heveae Baker, Lorryia sp.2, Lorryia formosa Cooreman e Lorryia sp.1; predadoras - Zetzellia quasagistemas Hernandes & Feres, Pronematus sp., Iphiseiodes zuluagai Denmark & Muma e Euseius citrifolius Denmark & Muma. Entre as euforbiáceas espontâneas, encontrou-se maior abundância de ácaros predadores em C. hirta e E. heterophylla, destacando-se Pronematus sp. e E. citrifolius, sugerindo que estas plantas possam ser importantes na manutenção daqueles predadores nos plantios de seringueira. No entanto, plantas que podem abrigar predadores, mas que também exercem forte competição (nutrientes, água etc.) com a seringueira, não podem ser sugeridas para um programa de manejo de pragas. Estudos sobre competição entre a seringueira e plantas espontâneas precisam ser conduzidos para viabilizar programas eficientes de manejo ambiental, visando o controle dos ácaros-praga da seringueira.

Manejo de pragas; Eriophyidae; Tydeidae; Tenuipalpidae


Quarterly samples were done in 2001 on three rubber tree plantation in the northwest of the state of São Paulo. Three rubber trees of each locality were sampled. Between the rows of rubber tree four species of spontaneous euphorbiaceous were collected: Chamaesyce hirta, C. hyssopifolia, Euphorbia heterophylla and Phyllanthus tenellus. A total of 8.954 mites of 38 species, belonging to 31 genera of 11 families were collected. Tydeidae and Phytoseiidae had the highest diversity of species, 9 and 7, respectively. The most abundant families were Eriophyidae (3.594), Tydeidae (2.825) and Tenuipalpidae (1.027). The most abundant species on the rubber trees were: phytophagous - Calacarus heveae Feres, Tenuipalpus heveae Baker, Lorryia sp.2, Lorryia formosa Cooreman and Lorryia sp.1; predators - Zetzellia quasagistemas Hernandes & Feres, Pronematus sp., Iphiseiodes zuluagai Denmark & Muma and Euseius citrifolius Denmark & Muma. Among the spontaneous euphorbiaceous, predatory mites were abundantly found on C. hirta and E. heterophylla, mainly Pronematus sp. and E. citrifolius, suggesting that these plants could be important in the maintenance of these predators in the rubber tree cultivation areas. However, plants that can shelter predators and at the same time exert strong competition (nutrients, water etc) to rubber trees, can not be recommended for pest management programs. Studies about competition between rubber trees and spontaneous plants need to be conducted for feasible efficient programs of environmental management, aiming at the control of pest mites of rubber tree.

Pest management; Eriophyidae; Tydeidae; Tenuipalpidae


ACAROLOGY

Ácaros (Acari) de seringueira (Hevea brasiliensis Muell. Arg., Euphorbiaceae) e de euforbiáceas espontâneas no interior dos cultivos

Mites (Acari) from rubber trees (Hevea brasiliensis Muell. Arg., Euphorbiaceae) and spontaneous euphorbiaceous in rubber trees cultivation

Marcos R. Bellini I; Reinaldo J.F. Feres II; Renato BuosiIII

IPrograma de Pós-graduação Interunidades (CENA/ESALQ/USP) - Ecologia Aplicada. Depto. Entomologia, Fitopatologia e Zoologia Agrícola, C. postal 9, 13418-900, Piracicaba, São Paulo, Brasil; mrbellini@yahoo.com.br

IIDepto. de Zoologia e Botânica, Univ. Estadual Paulista - UNESP. Rua Cristóvão Colombo 2265, Jardim Nazareth 15054-000, São José do Rio Preto, SP; Pesquisador bolsista CNPq, reinaldo@ibilce.unesp.br

IIIPrograma de Pós-graduação em Biologia Animal, Campus de São José do Rio Preto, UNESP

RESUMO

Foram realizadas coletas trimestrais em 2001 em três cultivos de seringueira no Noroeste do estado de São Paulo. Foram amostradas três seringueiras de cada local. Nas entrelinhas das seringueiras foram coletadas quatro espécies de euforbiáceas espontâneas: Chamaesyce hirta, C. hyssopifolia, Euphorbia heterophylla e Phyllanthus tenellus. Foram coletados 8.954 ácaros de 38 espécies, pertencentes a 31 gêneros de 11 famílias. Tydeidae e Phytoseiidae tiveram maior diversidade de espécies, 9 e 7, respectivamente. As famílias mais abundantes foram Eriophyidae (3.594), Tydeidae (2.825) e Tenuipalpidae (1.027). As espécies mais abundantes nas seringueiras foram: fitófagas – Calacarus heveae Feres, Tenuipalpus heveae Baker, Lorryia sp.2, Lorryia formosa Cooreman e Lorryia sp.1; predadoras - Zetzellia quasagistemas Hernandes & Feres, Pronematus sp., Iphiseiodes zuluagai Denmark & Muma e Euseius citrifolius Denmark & Muma. Entre as euforbiáceas espontâneas, encontrou-se maior abundância de ácaros predadores em C. hirta e E. heterophylla, destacando-se Pronematus sp. e E. citrifolius, sugerindo que estas plantas possam ser importantes na manutenção daqueles predadores nos plantios de seringueira. No entanto, plantas que podem abrigar predadores, mas que também exercem forte competição (nutrientes, água etc.) com a seringueira, não podem ser sugeridas para um programa de manejo de pragas. Estudos sobre competição entre a seringueira e plantas espontâneas precisam ser conduzidos para viabilizar programas eficientes de manejo ambiental, visando o controle dos ácaros-praga da seringueira.

Palavras-chave: Manejo de pragas, Eriophyidae, Tydeidae, Tenuipalpidae

ABSTRACT

Quarterly samples were done in 2001 on three rubber tree plantation in the northwest of the state of São Paulo. Three rubber trees of each locality were sampled. Between the rows of rubber tree four species of spontaneous euphorbiaceous were collected: Chamaesyce hirta, C. hyssopifolia, Euphorbia heterophylla and Phyllanthus tenellus. A total of 8.954 mites of 38 species, belonging to 31 genera of 11 families were collected. Tydeidae and Phytoseiidae had the highest diversity of species, 9 and 7, respectively. The most abundant families were Eriophyidae (3.594), Tydeidae (2.825) and Tenuipalpidae (1.027). The most abundant species on the rubber trees were: phytophagous - Calacarus heveae Feres, Tenuipalpus heveae Baker, Lorryia sp.2, Lorryia formosa Cooreman and Lorryia sp.1; predators - Zetzellia quasagistemas Hernandes & Feres, Pronematus sp., Iphiseiodes zuluagai Denmark & Muma and Euseius citrifolius Denmark & Muma. Among the spontaneous euphorbiaceous, predatory mites were abundantly found on C. hirta and E. heterophylla, mainly Pronematus sp. and E. citrifolius, suggesting that these plants could be important in the maintenance of these predators in the rubber tree cultivation areas. However, plants that can shelter predators and at the same time exert strong competition (nutrients, water etc) to rubber trees, can not be recommended for pest management programs. Studies about competition between rubber trees and spontaneous plants need to be conducted for feasible efficient programs of environmental management, aiming at the control of pest mites of rubber tree.

Keywords: Pest management, Eriophyidae, Tydeidae, Tenuipalpidae

A seringueira, Hevea brasiliensis Muell. Arg., é nativa da Amazônia e foi introduzida em outras regiões brasileiras e outros países. Em 2005, cerca de 79% da produção mundial originou-se do Sudeste asiático, em países como a Tailândia (33%), Indonésia (26%) e Malásia (13%) (IAC 2006). Atualmente, o Brasil é responsável por 1% da produção mundial, destacando-se o estado de São Paulo, que produz cerca de 52 mil toneladas de látex/ano (APTA 2006).

A introdução da cultura da seringueira em novas áreas tornou possível a associação de várias espécies de ácaros com a seringueira plantada em sistema de monocultivo (Feres 2000). Chiavegato (1968) registrou cinco espécies de ácaros sobre esta planta e Silva (1972) as relacionou em trabalho sobre pragas de seringueira. A partir daí, estudos sobre ecologia, diversidade e dinâmica populacional de ácaros associados à seringueira aumenta a cada ano. Feres (2000) registrou 28 espécies e apresentou chave dicotômica para auxiliar na identificação. Ferla & Moraes (2002) registraram 41 espécies no Mato Grosso e também apresentaram uma chave dicotômica. Feres et al. (2002) realizaram estudo sobre a dinâmica populacional de ácaros em três cultivos de seringueira no estado de São Paulo. Bellini et al. (2005a) compararam a dinâmica populacional da acarofauna em dois sistemas diferentes de plantio de seringueira em monocultivo, um deles plantada em consórcio com o palmito gariroba, Syagrus oleracea (Mart.) Becc. (Arecaceae). Vis et al. (2006a) estudaram a dinâmica populacional dos ácaros em seringueira no município de Piracicaba, SP, coletando 38 espécies naquele local.

Duas espécies de ácaros têm merecido grande destaque nos cultivos de seringueira, tornando-se importantes pragas em algumas regiões do país: Calacarus heveae Feres, que causa amarelecimento das folhas e severo desfolhamento em diversos clones de seringueiras (Feres 1992 e 2000, Vieira & Gomes 1999) e Tenuipalpus heveae Baker, que causa bronzeamento, aparentemente seguido de queda das folhas (Pontier et al. 2001).

Nas áreas de cultivo de seringueira são facilmente encontradas plantas de ocorrência natural e crescimento espontâneo. Essas plantas são também conhecidas como plantas espontâneas, invasoras ou daninhas. De acordo com Altieri et al. (2003), a diversificação adequada da vegetação de plantas espontâneas em agroecossistemas pode diminuir de maneira significativa as populações de espécies-praga. Esse fato está relacionado à maior diversidade e disponibilidade de recursos alternativos (pólen, néctar, presas alternativas etc.) para os inimigos naturais.

Feres & Nunes (2001) estudaram três espécies de euforbiáceas herbáceas associadas a cultivos de seringueira e relataram a presença de sete espécies de Phytoseiidae. Zacarias & Moraes (2001) encontraram 25 espécies de ácaros predadores em um levantamento realizado em seringueira e outras onze euforbiáceas nativas no sudeste do estado de São Paulo. Bellini et al. (2005b) realizaram um levantamento em 20 espécies de plantas nativas em duas áreas de cultivo de seringueira e encontraram seis espécies de Phytoseiidae, sendo Euseius citrifolius Denmark & Muma, predador mais comuns em seringueiras cultivadas, também o mais comum na maioria das espécies vegetais avaliadas.

Informações sobre a ocorrência e diversidade de ácaros em cultivos de seringueira, assim como sobre as plantas de ocorrência natural nas áreas de cultivo, são importantes para o estabelecimento de estratégias de manejo. O objetivo desse trabalho foi aprimorar o conhecimento sobre a diversidade de ácaros em seringueiras cultivadas e verificar quais das euforbiáceas espontâneas, de ocorrência comum no interior dos cultivos, podem servir como reservatório para ácaros predadores comuns na seringueira.

Material e Métodos

Foram realizadas quatro coletas em 2001, uma em cada estação do ano (janeiro, abril, julho e outubro) em três cultivos de seringueira localizados no Noroeste do estado de São Paulo: Cedral (20º55'S, 49º26'W), Pindorama (21º13'S, 48º54'W) e Taquaritinga (21º26'S, 48º37'W). Desses, somente o cultivo de Taquaritinga recebeu aplicações periódicas de insetidas-acaricidas (vide Feres et al. 2002).

Foram amostradas três seringueiras de cada local e 40 folíolos de cada planta, coletados até a altura de 7-8 metros com auxílio de podão com cabo telescópico, totalizando 120 folíolos por seringal. Nas entrelinhas das seringueiras de cada local foram coletadas quatro espécies de euforbiáceas herbáceas de ocorrência espontânea ou natural: Chamaesyce hirta (L.) Millsp., Chamaesyce hyssopifolia (L.) Small., Euphorbia heterophylla L. e Phyllanthus tenellus Roxb. Foram amostrados 80 folíolos e 20 inflorescências de E. heterophylla, 150 folíolos e 40 inflorescências de C. hirta, 150 folíolos de C. hyssopifolia e 400 folíolos de P. tenellus. O tamanho das amostras foi estabelecido levando-se em consideração o tamanho relativo dos folíolos dessas plantas: E. heterophylla – folíolos grandes; C. hirta e C. hyssopifolia – folíolos médios; P. tenellus – folíolos pequenos. Para transporte do campo ao laboratório, os folíolos foram acondicionados em sacos de papel (separados por espécie de planta), esses colocados em sacos de polietileno, os quais foram acomodados em caixas isotérmicas de poliestireno, com Gelo-X® em seu interior.

Todos os ácaros encontrados foram montados em lâminas de microscopia com auxílio de microscópio estereoscópico, utilizando-se o meio de Hoyer (Flechtmann 1975). O exame para a identificação e contagem dos espécimes foi feito sob microscópio óptico com contraste de fases.

O material testemunho está depositado na coleção de Acari (DZSJRP) - http://splink.cria.org.br/, do Departamento de Zoologia e Botânica, Universidade Estadual Paulista (UNESP), São José do Rio Preto, SP.

Resultados

Foram coletados 8.954 ácaros de 38 espécies, pertencentes a 31 gêneros de 11 famílias (Tabela 1). Tydeidae e Phytoseiidae apresentaram a maior diversidade de espécies (9 e 7 espécies, respectivamente). Eriophyidae, Tydeidae e Tenuipalpidae foram as famílias mais abundantes, com 3.594, 2.825 e 1.027 indivíduos, respectivamente (Tabela 1).

As espécies de ácaros fitófagos mais abundantes nas seringueiras foram C. heveae, T. heveae, Lorryia sp.2, Lorryia formosa Cooreman e Lorryia sp.1 (Tabela 2). C. heveae e T. heveae apresentaram maior abundância no município de Cedral seguido de Pindorama, com níveis populacionais mais elevados em abril; em Taquaritinga foram coletados poucos indivíduos de T. heveae e nenhum de C. hevea. As espécies Lorryia sp.2, L. formosa e Lorryia sp.1 tiveram grande abundância em cultivos diferentes, em Taquaritinga, Cedral e Pindorama, respectivamente (Tabela 2).

As espécies predadoras mais abundantes foram Zetzellia quasagistemas Hernandes & Feres, Pronematus sp., Iphiseiodes zuluagai Denmark & Muma e E. citrifolius (Tabela 2). Z. quasagistemas e Pronematus sp. foram encontradas em todas as áreas e praticamente em todos os meses de observação, com maiores níveis populacionais em abril e julho em Cedral e Pindorama; em Taquaritinga, os níveis populacionais daqueles predadores foram sempre mais baixos. I. zuluagai ocorreu somente em Taquaritinga e E. citrifolius foi a espécie de predador mais comum nas seringueiras ao longo do ano, com maiores níveis populacionais ocorrendo também em Taquaritinga. (Tabela 2).

Das espécies de ácaros predadores mais abundantes nas seringueiras, somente Pronematus sp. e E. citrifolius também foram abundantes nas euforbiáceas espontâneas, principalmente em C. hirta e E. heterophylla; ambas espécies de predadores foram muito freqüentes em todas as áreas durantes as observações (Tabela 3). I. zuluagai ocorreu somente em Taquaritinga, mas em níveis mais baixos quando comparado à seringueira. Em relação à Z. quasagistemas, somente um único indivíduo daquele predador foi encontrado sobre as euforbiáceas, especificamente sobre E. heterophylla. Em C. hyssopifolia e P. tenellus foi coletado um número bem menor de ácaros predadores. C. hyssopifolia foi encontrada somente na área de Cedral, não sendo encontrado nenhum espécime daquela planta nas outras áreas (Tabela 3).

As espécies de ácaros fitófagos mais abundantes sobre as euforbiáceas espontâneas foram: Lorryia sp.2 e L. formosa sobre C. hirta; Eutetranychus banksi (McGregor), Lorryia sp.2, L. formosa, T. heveae e Oligonychus gossypii (Zacher) sobre E. heterophylla (Tabela 3). A abundância de todas estas espécies de ácaros fitófagos foi consideravelmente menor nas euforbiáceas espontâneas, comparada às seringueiras.

Discussão

O número de espécies, gêneros e famílias de ácaros coletados confirma a riqueza da acarofauna encontrada em cultivos de seringueira. Estes resultados estão de acordo com outros estudos conduzidos nessa e em outras regiões do Brasil (Feres 2000, Bellini et al. 2005a, Vis et al. 2006a).

O maior número de espécies de Tydeidae pode estar relacionado aos hábitos alimentares muito variados dos membros dessa família, que abriga espécies fitófagas, predadoras, micófagas e outras de hábito não conhecido. Os tideídeos podem explorar diferentes tipos de microhábitats em busca de variados tipos de alimento. Uma grande diversidade de tideídeos em seringueiras cultivadas também foi encontrada por Ferla & Moraes (2002), Bellini et al. (2005a) e Vis et al. (2006a). Raciocínio semelhante, provavelmente, também se aplica à grande diversidade de Phytoseiidae encontrada neste estudo. Embora conhecidos principalmente por seu hábito predador, ácaros de algumas espécies dessa família podem consumir outros alimentos além de suas presas, como pólen, fungos e néctar (McMurtry & Croft 1997).

A maior abundância de espécies de Eriophyidae, Tydeidae e Tenuipalpidae deve-se aos altos níveis populacionais atingidos por algumas das espécies desses fitófagos. Grande abundância de ácaros das famílias Eriophyidae (C. heveae) e Tenuipalpidae (T. heveae) também foi registrada por Feres et al. (2002), Ferla & Moraes (2002) e Bellini et al. (2005a). De qualquer forma, a grande abundância de ácaros fitófagos em um agroecossistema pode estar relacionada à baixa heterogeneidade ambiental e a grande disponibilidade de alimento, como é o caso de um monocultivo de seringueira. Em agroecossistemas, espécies fitófagas têm maiores possibilidades de atingir grandes níveis populacionais devido à menor diversidade de inimigos naturais (Altieri et al. 2003). A baixa abundância de C. heveae e T. heveae em Taquaritinga, provavelmente foi causada pelo uso intensivo de acaricidas naquele local, o que também foi observado por Feres et al. (2002).

A grande abundância observada de espécies de Tydeidae (Lorryia sp.2, L. formosa e Lorryia sp.1), também foi relatada por Vis et al. (2006a), que registrou considerável abundância para duas espécies do gênero Lorryia. Uma característica interessante em relação às espécies de Lorryia observada no presente estudo foi quanto à ocupação de microhábitats. Em nenhuma das situações observadas, L. formosa, Lorryia sp.1 e Lorryia sp.2 foram igualmente abundantes na mesma área ao mesmo tempo. Estas espécies ocupam praticamente o mesmo microhábitat, concentrando-se principalmente na base dos folíolos e nas junções da nervura central com as secundárias. Nas áreas em que L. formosa, Lorryia sp.1 e Lorryia sp.2 ocorreram no mesmo período, uma delas sempre foi numericamente mais abundante. A sobreposição de nicho (Ricklefs 1996) em relação ao tempo e espaço, gerando competição, pode ser o fator determinante desta situação.

Z. quasagistemas, o predador que correspondeu sozinho a aproximadamente 75% da abundância total dos predadores nas seringueiras do presente estudo, pode contribuir para manter baixos os níveis populacionais de T. heveae. Esta espécie, citada como Zetzellia aff. yusti por Bellini et al. (2005a), foi o predador mais abundante naquele estudo, sendo que vários exemplares foram observados alimentando-se de T. heveae. Embora seja muito abundante nas seringueiras, Z. quasagistemas praticamente não foi encontrada nas euforbiáceas espontâneas, sugerindo que essas espécies de plantas provavelmente não sirvam como bons reservatórios para esse predador.

No caso de I. zuluagai, informações da literatura indicam que esse predador pode vir a ser importante em cultivos de seringueira vizinhos de plantações de citros, pois foi registrado em níveis consideráveis no presente estudo no seringal de Taquaritinga, que é circundado por plantação de citros. O mesmo havia sido observado por Feres et al. (2002), entretanto I. zuluagai não tem sido encontrada em cultivos de seringueiras em outras situações.

Pronematus sp. e E. citrifolius foram as espécies de predadores de maior abundância sobre as euforbiáceas C. hirta e E. heterophylla. O fato de espécies do gênero Euseius e Pronematus serem consideradas generalistas quanto ao hábito alimentar pode ter contribuído para a permanência dessas espécies praticamente durante todo ano nas áreas de cultivo; a diversidade de alimento (ácaros fitófagos, pólen, etc) foi sempre muito comum sobre C. hirta e E. heterophylla. Pólen, por exemplo, também pode ser uma boa fonte de alimento alternativo para aqueles predadores. Diferentes espécies de Euseius têm apresentado bom desenvolvimento quando alimentadas com pólen de diferentes espécies de plantas (McMurtry & Croft 1997). A espécie de Pronematus encontrada neste estudo também poderia aceitar pólen como alimento. Vis et al. (2006b) observou alta taxa de oviposição quando uma espécie não identificada de Pronematus foi alimentada com pólen de Typha angustifolia L.

Em relação a C. hyssopifolia e P. tenellus, o número muito reduzido de ácaros predadores registrados sobre elas pode ser devido à falta de abrigo ou alimento para os predadores. Essa possibilidade parece particularmente provável em relação a P. tenellus, que apresenta folhas pequenas e sem nervuras proeminentes. Deve-se considerar também que C. hyssopifolia foi coletada apenas em Cedral, reduzindo a chance de que predadores fossem coletados sobre ela. Por outro lado, a constatação de alguns poucos ácaros predadores sobre uma planta não significa que ela possa funcionar como reservatório (Bellini et al. 2005b). Em C. hyssopifolia e P. tenellus, por exemplo, o registro de Pronematus sp. e E. citrifolius pode ter sido acidental ou casual, chegando até elas pela queda de folhas de uma seringueira vizinha ou no processo de deslocamento ou dispersão.

Espécies de Pronematus também têm sido comumente encontradas em seringueira e E. citrifolius parece ser o fitoseídeo mais importante na região onde este trabalho foi realizado (Feres 2000, Feres et al. 2002, Bellini et al. 2005a). É possível que Pronematus sp. e E. citrifolius possam, na realidade, ter exercido um papel importante sobre as populações dos ácaros fitófagos nas seringueiras. Vis et al. (2006b) verificou que a taxa de oviposição diária de uma espécie não identificada de Pronematus e de E. citrifolius foi de aproximadamente um ovo/dia quando ambas as espécies de predadores foram alimentadas com C. heveae e T. heveae. Na revisão feita por Gerson et al. (2003) existem trabalhos que citam espécies de Pronematus como predadores de ácaros eriofiídeos e tenuipalpídeos.

A princípio, os resultados deste trabalho indicam que C. hirta e E. heterophylla podem ser importantes na manutenção de Pronematus sp. e E. citrifolius nos plantios de seringueira, principalmente devido à freqüência com que essas plantas são encontradas nos seringais. Além disso, são plantas de grande capacidade reprodutiva e difícil controle (Lorenzi 1991). No entanto, algumas plantas também podem funcionar como reservatórios de pragas em áreas de cultivo. Emden (1965) citou 442 referências relacionando plantas espontâneas como reservatório de pragas. Freqüentemente, muitos dos ácaros fitófagos encontrados sobre as plantas espontâneas não causam qualquer dano à cultura principal, podendo servir de alimento aos ácaros predadores encontrados sobre elas.

Sobre E. heterophylla foram encontrados 38, 17 e 13 exemplares de E. banksi, T. heveae e O. gossypii, respectivamente. A ocorrência de E. banksi em seringueira não é problemática. Mesmo sendo uma espécie comum nesses cultivos, até o momento não foi observado nenhum dano aparente causado por essa espécie, mesmo em grandes níveis populacionais. Já T. heveae e O. gossypii são espécies que podem causar danos à seringueira (Fazolin & Pereira 1989, Flechtmann 1989, Pontier et al. 2001). Deve-se analisar, portanto, se os pequenos níveis populacionais dessas espécies sobre E. heterophylla correspondem à ocorrência acidental ou não. Posteriormente, C. hirta e E. heterophylla poderiam contribuir para que populações de Pronematus sp. e de E. citrifolius fossem mantidas nos cultivos na época de queda natural das folhas da seringueira. Além disso, C. hirta e E. heterophylla poderiam se tornar importantes em programas de manejo em viveiros de mudas, cultivos de plantas jovens, e que envolvessem multiplicação desses ácaros.

Além de se conhecer quais plantas podem abrigar ácaros predadores e fitófagos em áreas de cultivo de seringueira, é preciso determinar estratégias de manejo que não interfiram no desenvolvimento da cultura principal e que não afetem o equilíbrio do sistema. Plantas que podem abrigar predadores, mas que também exercem forte competição (nutrientes, água etc.) com a seringueira, não podem ser sugeridas para um programa de manejo de pragas. Sendo assim, estudos sobre competição entre a seringueira e plantas espontâneas, precisam ser conduzidos de forma a viabilizar programas de manejo ambiental eficientes e adequados, visando o controle dos ácaros-praga da seringueira.

Agradecimentos

À FAPESP pelo apoio financeiro (Processos nos. 98/7099-0, 00/05475-7 e 00/12179-5}. Parte do Programa BIOTA/FAPESP (www.biota.org.br)

Received 28/III/07. Accepted 30/VI/08.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Set 2008
  • Data do Fascículo
    Ago 2008

Histórico

  • Aceito
    30 Jun 2008
  • Recebido
    28 Mar 2007
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