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Angioleiomioma de cavidade nasal: relato de um caso e revisão de literatura

Resumos

Leiomioma de cavidade nasal e seios paranasais é raro. Ele constitui menos de 1% de todos os leiomiomas do corpo humano. Isto se deve à escassez de células musculares no nariz. Estas neoplasias podem ser classificadas em três grupos: leiomioma, angiomioma e leiomioma epitelióide. Somente 15 casos de angiomioma foram encontrados na literatura. O tratamento de escolha é a excisão cirúrgica. Um novo caso e a revisão da literatura são apresentados.

leiomioma; leiomioma vascular; nariz; neoplasias nasais


Liomyomas of the nasal cavity and paranasal sinuses are rare. They make up less than 1% of all leiomyomas in the human body. This is due to the paucity of smooth muscle in the nose. They are classified in three groups: leiomyoma, angiomyoma and epithelioid leiomyoma. Only 15 cases of vascular leiomyomas have been found in the literature. The treatment of choice is surgical excision. Hereby we present a new case and review the literature.

leiomyoma; nasal neoplasms; vascular leiomyoma; nose


RELATO DE CASO

Angioleiomioma de cavidade nasal: relato de um caso e revisão de literatura

Victor Eulalio Sousa CampeloI; M.C. NevesII; M. NakanishiIII; R.L. VoegelsIV

IResidente do segundo ano do HCFMUSP

IIMédico Residente da Divisão de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clínicas da F.M.U.S.P

IIIMédico Pós-Graduando da Divisão de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clínicas da F.M.U.S.P

IVProfessor associado do Departamento de Otorrinolaringologia da F.M.U.S.P

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Victor Eulálio Sousa Campelo R. Cardeal Arcoverde 1183 apto. 154 Jardim Paulista 05407-000 São Paulo SP Tel: (0xx11) 9218-1797 E-mail: vcampelo@yahoo.com.br

RESUMO

Leiomioma de cavidade nasal e seios paranasais é raro. Ele constitui menos de 1% de todos os leiomiomas do corpo humano. Isto se deve à escassez de células musculares no nariz. Estas neoplasias podem ser classificadas em três grupos: leiomioma, angiomioma e leiomioma epitelióide. Somente 15 casos de angiomioma foram encontrados na literatura. O tratamento de escolha é a excisão cirúrgica. Um novo caso e a revisão da literatura são apresentados.

Palavras-chave: leiomioma, leiomioma vascular, nariz, neoplasias nasais.

INTRODUÇÃO

Leiomioma é um tumor benigno de músculo liso, mais comumente encontrado no útero (95%), pele (3%), tratos alimentar e gastrointestinal (1,5%).1,3 Menos de 1% ocorre em estruturas da cabeça e pescoço.1 Maesaka et al. (1966) descreveu o primeiro caso de angioleiomioma nasal.1,3,7,8,11 Desde então, 15 casos de angioleiomiomas nasossinusais foram descritos, sendo 5 deles situados no corneto inferior.1,11 Nós apresentamos um caso de leiomioma vascular, seu tratamento e revisão de literatura.

RELATO DO CASO

V.L.S, 44 anos, sexo feminino, parda, procurou a Divisão de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clínicas da FMUSP queixando-se de uma tumoração avermelhada em fossa nasal esquerda que percebera há aproximadamente 4 anos. A lesão tinha crescimento progressivo lento com episódios de epistaxe de pequeno volume. Após 3 anos, evoluiu com obstrução nasal à esquerda e prurido local. No exame físico e telescopia nasal, observou-se uma lesão de coloração avermelhada com inserção em cabeça do corneto inferior esquerdo, bem delimitada, com aproximadamente 1 x 2cm, obstruindo parcialmente a fossa nasal. A tomografia computadorizada de seios paranasais mostrou lesão nodular arredondada de limites bem definidos na abertura piriforme esquerda, com atenuação de partes moles, apresentando intenso realce após injeção do meio de contraste e com 1,2cm de diâmetro (Figura 1A e 1B). Realizada biópsia da lesão que mostrou aspecto histopatológico sugestivo de leiomioma. Foi então submetida à ressecção endoscópica, sob anestesia geral, da lesão juntamente com a cabeça do corneto inferior, em que se encontrava sua inserção. No exame anatomopatológico, o achado macroscópico foi de um fragmento irregular, acastanhado e elástico, medindo 2,2 x 0,9 x 0,7cm. À microscopia óptica, observou-se lesão nodular constituída por feixes musculares lisos relativamente organizados, entremeados por vasos de paredes espessas, formadas por células musculares lisas dispostas de maneira concêntrica, com lúmens parcialmente patentes. Observam-se também alguns focos de transformação mixóide.


A paciente teve um pós-operatório sem intercorrências e está livre da doença há 10 meses.

DISCUSSÃO

Leiomiomas da cavidade nasal e seios paranasais são extremamente raros, constituindo menos de 1% de todos os leiomiomas do corpo humano. A raridade desse tumor é parcialmente atribuída ao fato da escassez de músculo liso na cavidade nasal fora das paredes dos vasos.1,14 Na cavidade nasal, pode-se encontrar tecido muscular liso nas paredes dos vasos sanguíneos ou nos músculos piloeretores da região anterior do vestíbulo.10 As teorias mais aceitas para o surgimento dessas neoplasias defendem a origem das lesões a partir da proliferação de células das paredes dos vasos, dos músculos piloeretores ou de mesênquima indiferenciado aberrante.6

A classificação histológica dos tumores pela Organização Mundial de Saúde3,10 dividiu os leiomiomas em três grupos: leiomioma, angioleiomioma (leiomioma vascular ou angiomioma) e leiomioma epitelióide (leiomioma bizarro e leiomioblastoma). Angiomiomas podem surgir em tecidos superficiais ou profundos. Em ambos os casos, as neoplasias parecem se desenvolver a partir do músculo liso dos vasos.11 Os leiomiomas vasculares constituem-se de feixes de células musculares lisas relativamente organizadas, entremeados por vasos de paredes espessas. As lesões superficiais consistem predominantemente de vasos com paredes espessas associados com tecido muscular proliferativo. As lesões mais profundas são tipicamente maiores, provavelmente devido ao atraso na detecção, e freqüentemente apresentam alterações histológicas variadas que não são vistas nos tipos superficiais. As alterações incluem aumento de celularidade e acúmulo de substância mixóide. Podem-se observar também fibrose, calcificações e reação de células gigantes.5,11 Morimoto (1973) classificou histologicamente esses tumores em três tipos: (i) capilar ou sólido, (ii) cavernoso e (iii) venoso. Nas extremidades os tumores são predominantemente do tipo sólido; enquanto na região da cabeça e pescoço eles são mais frequentemente do tipo venoso.8,11 O diagnóstico diferencial histopatológico inclui hemangioma, angiofibroma, fibromioma, leiomioblastoma, angiomiolipoma, leiomiossarcoma vascular.11

Há relatos de variantes malignas de tumores desta linhagem, porém eles são raros. A ausência de mitoses parece ser o melhor indicador de benignidade da lesão.11 Varias colorações e testes de imunohistoquímica têm sido usados para identificar leiomiomas vasculares incluindo desmina, vimentina, tricromo de Masson, actina e miosina. No entanto, este espectro de métodos não é necessário para o diagnóstico. Em nosso paciente, a coloração com hematoxifilina-eosina mostrou achados característicos de angioleiomioma.

Estes tumores crescem lentamente e podem persistir por um longo período.1 De acordo com a literatura, os sintomas mais comuns são (considerando o presente caso): obstrução nasal (56,25%), epistaxe (56,25%) e dor facial(25%) e cefaléia (25%).1-4, 6-13

Comparando os dados da literatura, observamos que a localização mais freqüente do angioleiomioma na cavidade nasal foi no corneto inferior. Dos 15 casos descritos (Tabela 1), 5 tiveram sua origem no corneto inferior; e em relação à sintomatologia, a queixa inicial foi o sangramento nasal. De forma semelhante, o presente caso também teve origem no corneto inferior e apresentou como sintoma inicial episódios de epistaxe.

Segundo Barr et al.2 a alta incidência de leiomioma no corneto inferior pode ser atribuída à grande quantidade local de tecido vascular contrátil que contém músculo liso.

Dos 15 casos descritos anteriormente, 13 eram mulheres; o que equivale a um predomínio feminino de 87,5% se incluirmos o presente caso.1,8,11

A idade dos pacientes na época do diagnóstico variou de 25 a 76 anos, com uma média de 55,6 anos.1,3,7,8,11

Estudo radiológico, com tomografia computadorizada ou ressonância nuclear magnética, não auxilia muito na determinação do diagnóstico, mas é importante para estabelecer a extensão da lesão e o planejamento do tratamento.6

O tratamento desses tumores é baseado na ressecção local, não havendo relatos de recidiva após excisão total.3,7,8,11 Bloom (2001) relatou um caso de recidiva após extrusão espontânea do tumor, porém sem recorrência após excisão cirúrgica completa. Esse evento demonstra a potencial recidiva após uma remoção incompleta e a necessidade de excisão completa para garantir um tratamento definitivo. Abordagem cirúrgica, seja por cirurgia endoscópica nasossinusal ou por rinotomia lateral, dependerá da extensão e localização do tumor, bem como da necessidade de melhor controle do sangramento.3,6,8 A nossa paciente foi submetida à ressecção endoscópica da lesão sob anestesia geral. O procedimento foi bem tolerado e sem complicações. A paciente está no décimo mês de pós-operatório com boa evolução e sem sinais de recidiva.

COMENTÁRIOS FINAIS

Leiomioma vascular da cavidade nasal é extremamente raro. A origem exata da neoplasia é ainda incerta, mas a maioria acredita ser proveniente de células musculares das paredes dos vasos sanguíneos. A ressecção é o procedimento de escolha e tem alto índice de cura. O procedimento endoscópico é uma boa opção para os tumores de pequena a moderada extensão.

Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da RBORL em 10 de março de 2005. cod. 93

Artigo aceito em 24 de maio de 2005.

Trabalho realizado na Divisão de Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

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  • Endereço para correspondência:
    Victor Eulálio Sousa Campelo
    R. Cardeal Arcoverde 1183 apto. 154 Jardim Paulista
    05407-000 São Paulo SP
    Tel: (0xx11) 9218-1797
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      31 Mar 2008
    • Data do Fascículo
      Fev 2008

    Histórico

    • Recebido
      10 Mar 2005
    • Aceito
      24 Maio 2005
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