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Tendência temporal e distribuição espacial de homicídios em homens jovens no estado de Mato Grosso, Brasil, 1996-2016

Temporal trend and spatial distribution of homicides in young men in the state of Mato Grosso, Brazil, 1996-2016

Resumo

Introdução

O homicídio é a principal causa de morte de homens jovens, tem causas diversas e seu estudo pode subsidiar medidas de intervenção.

Objetivo

Analisar a tendência temporal e a distribuição espacial de homicídios entre homens jovens nas regiões de saúde do estado de Mato Grosso, Brasil, entre 1996 e 2016.

Método

Estudo ecológico com dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade. Foram calculadas taxas de homicídios entre homens jovens por região de saúde. Foi empregada a regressão linear generalizada de Prais-Winsten.

Resultados

Foram registrados 8.383 homicídios em homens jovens no período estudado, com crescimento médio de 62% das taxas que variaram de 67,4 a 134,5/100 mil homens. A análise espacial revelou diferenças entre as regiões de saúde e aumento das taxas ao longo dos anos na maioria delas (9/16). Sete regiões de saúde apresentaram tendência temporal crescente, e, como no estado, as demais (56,2%) apresentaram tendência estável, porém com manutenção de altas taxas.

Conclusão

Houve crescimento da taxa de homicídios entre homens jovens no Mato Grosso, com diferenças nas tendências e na magnitude das taxas entre as regiões.

Palavras-chave:
homicídio; adulto jovem; adolescente; análise espacial; estudos de séries temporais

Abstract

Background

Homicide is the main cause of death for young men with several causes and its study can support intervention measures.

Objective

To analyze the temporal trend and spatial distribution of homicides among young men in the health regions of the state of Mato Grosso, Brazil, 1996-2016.

Method

This is an ecological study with data from the Mortality Information System. Homicide rates among young men by health region were calculated. Prais-Winsten generalized linear regression was used.

Results

8,383 homicides were registered in young men in the studied period, with an average growth of 62% of the rates that varied from 67.4 to 134.5 / 100 thousand inhabitants. Spatial analysis revealed differences between health regions and increased rates over the years in most of them (9/16). Seven health regions showed an increasing time trend and, as in the state, the others (56.2%) showed a stable trend, but with high rates maintained.

Conclusion

There was an increase in the homicide rate among young men in Mato Grosso, with differences in trends and the magnitude of rates between regions.

Keywords:
homicide; young adult; adolescent; spatial analysis; time series studies

INTRODUÇÃO

A expressão máxima da violência é o homicídio11 Lo CC, Howell JR, Cheng CT. Explaining black-white differences in homicide victimization. Aggress Violent Behav. 2013;18(1):125-34. http://dx.doi.org/10.1016/j.avb.2012.11.006.
http://dx.doi.org/10.1016/j.avb.2012.11....
. O ato de tirar a vida de outra pessoa, seja qual for o motivo, é considerado indicador universal da violência social22 Krug EG, Mercy JA, Dahlberg LL, Zwi AB. World report on violence and health [Internet]. Genebra: World Health Organization; 2002 [citado em 2018 Jun 13]. Disponível em: https://www.who.int/publications/i/item/9241545615
https://www.who.int/publications/i/item/...
. Definido para o setor da saúde como morte por agressão, independentemente da sua tipificação legal, o homicídio pode ainda aparecer na literatura como sinônimo de morte violenta33 Cerqueira D, Lima RS, Bueno S, Neme C, Ferreira H, Coelho D, et al. Atlas da violência 2018 [Internet]. Rio de Janeiro: Fórum Brasileiro de Segurança Pública; 2018 [citado em 2019 Mai 07]. Disponível em: https://www.ipea.gov.br/atlasviolencia/publicacoes/49/atlas-da-violencia-2018
https://www.ipea.gov.br/atlasviolencia/p...
ou morte decorrente de violência interpessoal44 GBD 2015 Mortality and Causes of Death Collaborators. Global, regional, and national life expectancy, all-cause specific mortality for 249 causes of death, 1980-2015: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2015. Lancet. 2016;388(10053):1459-544. http://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(16)31012-1. PMid:27733281.
http://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(16)...
e é o principal responsável pelos elevados índices de mortalidade na população mundial na últimas décadas22 Krug EG, Mercy JA, Dahlberg LL, Zwi AB. World report on violence and health [Internet]. Genebra: World Health Organization; 2002 [citado em 2018 Jun 13]. Disponível em: https://www.who.int/publications/i/item/9241545615
https://www.who.int/publications/i/item/...
,55 United Nations Office on Drugs and Crime. Global study on homicide 2013: trends, contexts, data [Internet]. Viena: United Nations Office on Drugs and Crime; 2014 [citado em 2018 Mai 11]. Disponível em: https://www.unodc.org/documents/gsh/pdfs/2014_GLOBAL_HOMICIDE_BOOK_web.pdf
https://www.unodc.org/documents/gsh/pdfs...
.

Em 2016, foram estimados 468 mil homicídios no mundo, dos quais 80% das vítimas eram do sexo masculino, sendo que as Américas tiveram a maior taxa de homicídios no sexo masculino (31,8/100.000 hab.)66 World Health Organization. World health statistics 2018: monitoring health for the SDGs, sustainable development goals [Internet]. 2018 [citado em 2018 Nov 19]. Disponível em: https://www.who.int/publications/i/item/9789241565585
https://www.who.int/publications/i/item/...
. No mesmo ano, no Brasil, a taxa de homicídios no sexo masculino foi 56,8/100.000 hab., enquanto no estado do Mato Grosso foi de 64,0/100.000 hab77 Ministério da Saúde. Datasus [Internet]. 2018 [citado em 2018 Out 11]. Disponível em: https://datasus.saude.gov.br/
https://datasus.saude.gov.br/...
,88 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. População [Internet]. 2018 [citado em 2018 Jul 30]. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/apps/populacao/projecao/
https://www.ibge.gov.br/apps/populacao/p...
.

Quanto à faixa etária das vítimas, o homicídio também é a principal causa de morte de pessoas entre 15 e 44 anos em todo o mundo55 United Nations Office on Drugs and Crime. Global study on homicide 2013: trends, contexts, data [Internet]. Viena: United Nations Office on Drugs and Crime; 2014 [citado em 2018 Mai 11]. Disponível em: https://www.unodc.org/documents/gsh/pdfs/2014_GLOBAL_HOMICIDE_BOOK_web.pdf
https://www.unodc.org/documents/gsh/pdfs...
. Entre os países da América Latina, o homicídio foi classificado como a primeira ou segunda causa principal de morte precoce em 7 dos 11 países, sendo mais expressiva na Venezuela e no Brasil44 GBD 2015 Mortality and Causes of Death Collaborators. Global, regional, and national life expectancy, all-cause specific mortality for 249 causes of death, 1980-2015: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2015. Lancet. 2016;388(10053):1459-544. http://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(16)31012-1. PMid:27733281.
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. No Brasil, os homicídios são a principal causa de mortalidade de jovens (15 a 29 anos)99 Cerqueira D, Bueno S, Alves PP, Lima RS, Silva ERA, Ferreira H, et al. Atlas da violência 2020 [Internet]. Rio de Janeiro: Fórum Brasileiro de Segurança Pública; 2020 [citado em 2020 Dez 07]. Disponível em: https://www.ipea.gov.br/atlasviolencia/publicacoes
https://www.ipea.gov.br/atlasviolencia/p...
.

Ao delimitar a observação da vitimização por homicídio de homens jovens (15 a 29 anos), as taxas se mostram superiores. Em 2016, a taxa de homicídios foi de 122,6/100.000 homens jovens e Mato Grosso figurou com taxa de 109,2/100.00077 Ministério da Saúde. Datasus [Internet]. 2018 [citado em 2018 Out 11]. Disponível em: https://datasus.saude.gov.br/
https://datasus.saude.gov.br/...
homens jovens.

Evidências científicas sugerem haver diferenciação social da vitimização de jovens do sexo masculino no Brasil e no mundo55 United Nations Office on Drugs and Crime. Global study on homicide 2013: trends, contexts, data [Internet]. Viena: United Nations Office on Drugs and Crime; 2014 [citado em 2018 Mai 11]. Disponível em: https://www.unodc.org/documents/gsh/pdfs/2014_GLOBAL_HOMICIDE_BOOK_web.pdf
https://www.unodc.org/documents/gsh/pdfs...
,1010 Waiselfisz JJ. Mapa da violência 2014: os jovens do Brasil. São Paulo: Secretaria Nacional de Juventude; 2014.,1111 Smith JR. Unequal burdens of loss: examining the frequency and timing of homicide deaths experienced by young black men across the life course. Am J Public Health. 2015;105(3 Suppl):S483-90. http://dx.doi.org/10.2105/AJPH.2014.302535. PMid:25905836.
http://dx.doi.org/10.2105/AJPH.2014.3025...
. Essas diferenças podem estar relacionadas às especificidades regionais, como questões econômicas, urbanização, emprego, renda, entre outros fatores1212 Chabot C, Ouimet M. It is less about wealth or poverty than with equality and formal social control: an analysis of the determinants of the homicide rate in 145 countries of the world. In: Deflem M, editor. Homicide and violent crime. Bingley: Emerald Publishing Limited; 2018. p. 223-40. http://dx.doi.org/10.1108/S1521-613620180000023013.
http://dx.doi.org/10.1108/S1521-61362018...
,1313 Jorge MA. O mistério da região Nordeste: o crescimento da taxa de homicídios no século XXI. Rev Parana Desenvolv [Internet]. 2018;39(134):55-75 [citado em 2018 Set 25]. Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=6547954
https://dialnet.unirioja.es/servlet/arti...
.

Ao considerar a vasta extensão territorial do estado do Mato Grosso e, consequentemente, particularidades em diversos aspectos, é presumível que haja diferentes taxas de homicídio entre as regiões de saúde do estado. Assim, analisar a tendência dos homicídios considerando as regiões de saúde constitui estratégia relevante para compreender o fenômeno segundo localidades e suas realidades específicas, permitindo identificar riscos e, consequentemente, subsidiar possíveis formas de intervenção.

Desta forma, o objetivo deste estudo foi analisar a tendência temporal e a distribuição espacial das taxas de homicídios em homens jovens nas regiões de saúde do estado de Mato Grosso, no período de 1996 a 2016.

MÉTODO

Desenho do estudo

Trata-se de um estudo ecológico, de série temporal e distribuição espacial.

Contexto

Localizado na região Centro-Oeste do Brasil, o estado do Mato Grosso é o terceiro maior em extensão territorial do país e está organizado em 16 regiões de saúde: Alto Tapajós, Araguaia Xingu, Baixada Cuiabana, Centro Norte, Garças Araguaia, Médio Araguaia, Médio Norte, Noroeste, Norte Araguaia Karajá, Norte, Oeste, Sudoeste, Sul, Teles Pires, Vale do Peixoto e Vale do Arinos1414 Mato Grosso. Resolução da Comissão Intergestores Bipartite de Mato Grosso nº 65, de 03 de abril de 2012. Dispõe sobre a instituição de 16 (dezesseis) regiões de saúde no estado de Mato Grosso. Secretaria de Estado de Saúde de Mato Grosso [Internet], Cuiabá, 3 de abril de 2012; p. 1-2 [citado em 2018 Jul 25]. Disponível em: http://www.saude.mt.gov.br/legislacao?origem=19&ano=2012&page=6
http://www.saude.mt.gov.br/legislacao?or...
.

Em 2018, o estado possuía 141 municípios e uma população de 3.441.998 habitantes, sendo 50,7% do sexo masculino, dos quais 28% na faixa etária de 15 a 29 anos. A densidade demográfica era de 3,8 habitantes/km2, e seu Índice de Desenvolvimento Humano, de 0,725, em 11º lugar entre os estados brasileiros1515 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Mato Grosso [Internet]. 2023 [citado em 2018 Out 03]. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/mt/panorama
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.

A Baixada Cuiabana detinha quase 30% da população e a maior densidade demográfica, por incluir os dois municípios mais populosos – Cuiabá e Várzea Grande. Em outro extremo, as regiões Norte Araguaia Karajá, Médio Araguaia, Noroeste, Vale do Arinos, Sudoeste e Araguaia Xingu apresentavam baixa densidade demográfica e concentravam, juntas, pouco mais de 15% da população do estado1515 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Mato Grosso [Internet]. 2023 [citado em 2018 Out 03]. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/mt/panorama
https://cidades.ibge.gov.br/brasil/mt/pa...
. No que tange ao crescimento populacional, as regiões Teles Pires, Médio Araguaia e Noroeste sobressaíram-se, por apresentarem as maiores razões de crescimento, superiores a 3% ao ano1616 Scatena JHG, Oliveira LR, Galvão ND, Neves MAB. O uso de indicadores compostos para classificação das regiões de saúde de Mato Grosso. In: Scatena JHG, Kehrig RT, Spinelli MAS, editores. Regiões de saúde: diversidade e processo de regionalização em Mato Grosso. São Paulo: Hucitec; 2014. p. 169-91..

Fontes de dados

Os dados foram obtidos em 2018 do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), disponíveis no site do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS) do Ministério da Saúde.

Foram incluídos todos os óbitos de indivíduos do sexo masculino na faixa etária de 15 a 29 anos, por local de residência, do estado de Mato Grosso, ocorridos no período de 1996 a 2016, classificados nos códigos X85 a Y35 da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde, décima revisão (CID-10), referentes a óbitos por agressões, intervenções legais e operações de guerra1717 Jorge MHPM, Laurenti R, Gotlieb SLD. O sistema de informações sobre mortalidade - SIM: concepção, implantação e avaliação. In: Ministério da Saúde, organizador. A experiência brasileira em sistemas de informação em saúde. Brasília: Ministério da Saúde; 2009. p. 71-107.,1818 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 1.832, de 03 de novembro de 1994. Transfere para o dia primeiro de janeiro de 1996 a entrada em vigência da CID-l0 em todo o território nacional e dá outras providências. Diário Oficial da União [Internet], Brasília, 3 de novembro de 1994; Seção 1. p. 22. [citado em 2018 Out 22]. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/diarios/1368727/pg-22-secao-1-diario-oficial-da-uniao-dou-de-03-11-1994
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.

A faixa etária selecionada para o estudo foi fundamentada no Estatuto da Juventude do Brasil, que delimita como “jovem” indivíduos de 15 a 29 anos de idade1919 Brasil. Lei nº 12.852, de 5 de agosto de 2013. Institui o Estatuto da Juventude e dispõe sobre os direitos dos jovens, os princípios e diretrizes das políticas públicas de juventude e o Sistema Nacional de Juventude - SINAJUVE. Diário Oficial da União [Internet], Brasília, 6 de agosto de 2013; Seção 1. p. 1. [citado em 2018 Mai 30]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12852.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_at...
.

O período do estudo foi definido com base na disponibilidade e confiabilidade da fonte de dados, uma vez que, a partir de 1996, o SIM sofreu algumas alterações, e os registros passaram a ter maior rigor – nesse ano também foi adotada a CID-10. O ano final da série estudada (2016) foi o mais atual com dados disponíveis no DATASUS no ano em que se realizou a coleta de dados (2018).

Como a população do estudo trata de óbitos de homens jovens nas regiões de saúde, os óbitos com uma destas variáveis (local de residência, idade e/ou sexo) com informações “ignoradas” no DATASUS foram excluídos e totalizaram 21 óbitos no período (0,2%).

Dados populacionais para o período de 1996 a 2016 também foram coletados no sítio eletrônico do DATASUS, embora o responsável por essas informações seja o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Para o ano de 2016, especificamente, como não havia disponível o registro ou estimativa populacional por região de saúde, sexo e faixa etária, foi calculado o percentual da população masculina jovem correspondente de cada região de saúde para o ano de 2015 e aplicado esse percentual sobre a população estimada de Mato Grosso para 2016, a qual foi extraída do sítio do DATASUS.

Indicadores calculados

Extraídos os dados, foram calculadas as taxas de homicídios, dividindo-se o número de óbitos pela população masculina respectiva e multiplicando-se o resultado pela base referencial de 100.000 habitantes de cada ano, conforme a Fórmula 1:

t a x a d e h o m i c í d i o = Ó b i t o s m a s c u l i n o s d e 15 a 29 a n o s r e s i d e n t e s n a R e g i ã o d e S a ú d e / P o p u l a ç ã o m a s c u l i n a d e 15 a 29 a n o s r e s i d e n t e s n a R e g i ã o d e S a ú d e x 100.000 (1)

Análise dos dados

Para a construção dos mapas temáticos, adotou-se a base cartográfica dos municípios do estado de Mato Grosso, em formato shapefile, coletada no sítio eletrônico do IBGE. Os municípios foram dissolvidos em regiões de saúde, e foram calculadas as taxas de homicídios de cada uma delas pontualmente a cada quatro anos (1996, 2000, 2004, 2008, 2012 e 2016). Os procedimentos foram realizados pelo software QGIS 3.6.

Para a análise de tendência, foi utilizada a regressão linear generalizada pelo método de Prais-Winsten, que permite a correção de autocorrelação de primeira ordem. A variação percentual anual (VPA) das taxas e seus respectivos intervalos de confiança de 95% foram estimados a partir das seguintes Fórmulas 2-3:

V P A = [ 1 + 10 b 1 ] x 100 % (2)
I C 95 % = 1 + 10 b 1 m í n i m o x 100 % ; 1 + 10 b 1 m á x i m o x 100 % (3)

Os valores de “b1”, “b1mínimo” e “b1máximo” foram extraídos da análise de regressão e correspondem, respectivamente, à taxa de crescimento anual e aos valores mínimos e máximos do intervalo de confiança do coeficiente “b1”. Para o ajuste da regressão, o logaritmo das taxas foi considerado como variável dependente, e os anos da série (1996 a 2016), como variável independente.

Se VPA for positiva, a série temporal será crescente; se for negativa, será decrescente; ou será estacionária se não houver diferença significante (p > 0,05) entre seu valor e zero1818 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 1.832, de 03 de novembro de 1994. Transfere para o dia primeiro de janeiro de 1996 a entrada em vigência da CID-l0 em todo o território nacional e dá outras providências. Diário Oficial da União [Internet], Brasília, 3 de novembro de 1994; Seção 1. p. 22. [citado em 2018 Out 22]. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/diarios/1368727/pg-22-secao-1-diario-oficial-da-uniao-dou-de-03-11-1994
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. A análise de tendência foi realizada no programa Stata, versão 12.

O projeto foi aprovado, em 21 de março de 2019, pelo Comitê Permanente de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Mato Grosso, sob parecer nº 3.213.411.

RESULTADOS

Em 21 anos, de 1996 a 2016, foram registrados 8.383 homicídios de homens de 15 a 29 anos no estado de Mato Grosso, representando uma média de 399,2 homicídios por ano, 33,3 por mês e 1,1 por dia. As taxas de homicídios variaram de 67,4 óbitos (1996) a 134,5 óbitos (2014) por 100.000 homens jovens. Óbitos com pelo menos uma das variáveis do estudo (local de residência, idade e/ou sexo) com informações “ignoradas” no DATASUS foram excluídos e totalizaram 21 óbitos no período (0,2%).

Comparado ao Brasil, Mato Grosso apresentou maior crescimento das taxas de homicídios de homens jovens, mesmo sendo inferiores às do país no período estudado. Em 2016, houve 31.784 homicídios de homens jovens no Brasil, o que equivale a uma taxa de 122,6 homicídios a cada 100 mil homens jovens, enquanto em 1996 a taxa era de 83,2, revelando um aumento de 47,4%. No estado de Mato Grosso, em 1996, a taxa foi de 67,4, e em 2016, de 109,2 a cada 100 mil homens jovens, o que resultou em aumento de 62% em 21 anos (Figura 1).

Figura 1
Taxa de homicídios* de homens jovens. Brasil e Mato Grosso, 1996-2016. Fonte: elaborada pelas autoras a partir de dados do DATASUS77 Ministério da Saúde. Datasus [Internet]. 2018 [citado em 2018 Out 11]. Disponível em: https://datasus.saude.gov.br/
https://datasus.saude.gov.br/...
. *Por 100.000 habitantes

Das 16 regiões de saúde do estado de Mato Grosso, 7 apresentaram tendência temporal crescente das taxas de homicídio em homens jovens: Alto Tapajós, Centro Norte, Garças Araguaia, Médio Norte, Sul Matogrossense, Teles Pires e Vale do Peixoto. As demais, assim como o estado, tiveram tendência estável e nenhuma apresentou tendência decrescente (Tabela 1).

Tabela 1
Tendência temporal dos homicídios em homens jovens segundo as regiões de saúde. Mato Grosso-Brasil, 1996-2016

Entre as regiões de saúde com tendência crescente, as com maior variação percentual anual foram Garças Araguaia (19,7), Teles Pires (18,4) e Sul Matogrossense (16,6), seguidas de Alto Tapajós, (14,5), Vale do Peixoto (13,2), Médio Norte (11,1) e Centro Norte (11,1) (Tabela 1).

Na Figura 2, é apresentada a distribuição espacial da taxa de homicídios em homens jovens. A região Baixada Cuiabana registrou as taxas mais altas na maioria dos anos, permanecendo todo o período com taxa de homicídios em homens jovens superiores a 90,0/100.000 e maior coeficiente médio no período (156,5). A região Noroeste também não apresentou oscilações importantes, pois registrou taxas de 59,9/100.000 homens jovens em 1996 e de 99,9/100.000 homens jovens nos anos seguintes (Figura 2).

Figura 2
Distribuição espacial da taxa de homicídios em homens jovens segundo as regiões de saúde* e anos selecionados**. Mato Grosso-Brasil, 1996-2016. Fonte: elaborada pelas autoras a partir de dados do DATASUS77 Ministério da Saúde. Datasus [Internet]. 2018 [citado em 2018 Out 11]. Disponível em: https://datasus.saude.gov.br/
https://datasus.saude.gov.br/...
. *1-Alto Tapajós; 2-Araguaia Xingu; 3-Baixada Cuiabana; 4-Centro Norte; 5-Garças Araguaia; 6-Médio Araguaia; 7-Médio Norte; 8-Noroeste; 9-Norte Araguaia Karajá; 10-Norte Matogrossense; 11-Oeste Matogrossense; 12-Sudoeste Matogrossense; 13-Sul Matogrossense; 14-Teles Pires; 15-Vale do Arinos; 16-Vale do Peixoto. **1996, 2000, 2004, 2008, 2012 e 2016

Nenhuma das regiões se manteve com taxas inferiores a 29,9/100.000 homens jovens em todos os anos estudados. Apesar disso, é interessante salientar que a região Norte Araguaia Karajá registrou taxas de homicídios em homens jovens superiores a 60,0/100.000 somente em 2000, mantendo taxas inferiores a 29,9/100.000 nos demais anos. Desta forma, foi a região com menor coeficiente médio (22,5), seguida da região Norte (30,1).

A região Alto Tapajós apresentou taxas de homicídios de homens jovens crescentes de maneira gradativa. Iniciou o período (1996) com taxas inferiores a 29,9/100.000 e terminou o período (2016) com taxas superiores a 120,0/100.000. Com comportamento semelhante, as regiões Centro Norte, Sul e Teles Pires também tiveram taxas menores no início do período em comparação ao final, sem redução das taxas de homicídios nos anos subsequentes (Figura 2).

As demais regiões de saúde apresentaram estabilidade. Porém, é importante notar que o ano de 1996 foi aquele com maior número de regiões (5/16) com taxas inferiores a 29,9/100.000 homens jovens, enquanto 2016 foi o ano que apresentou maior número de regiões de saúde (4/16) com taxas de homicídios superiores a 120,0/100.000.

Destacam-se ainda na Figura 2 os anos de 2000, 2004 e 2008, que revelaram taxas de homicídios em homens jovens entre 60,0 e 89,9/100.000.

DISCUSSÃO

Os achados deste estudo evidenciaram tendência temporal estável da taxa de homicídios em homens jovens em Mato Grosso, porém 7 das 16 regiões de saúde apresentaram tendência crescente e em nenhuma foi observada tendência decrescente. As maiores taxas foram observadas nas regiões mais populosas – Baixada Cuiabana, Sul Matogrossense e Teles Pires; por outro lado, as regiões menos populosas registraram as menores taxas ao longo dos anos, o que pode indicar alguma relação com tamanho populacional, urbanização e mortalidade por homicídios.

Por ser um estado de grandes proporções territoriais e com características diversas, Mato Grosso registrou comportamento diferente das taxas de homicídios em homens jovens em suas regiões de saúde, indicando, provavelmente, causalidades diversas. Essa heterogeneidade torna os estudos acerca de homicídios complexos, pois inclui fatores individuais, culturais, políticos, sociais e econômicos2020 Gawryszewski VP, Sanhueza A, Martinez-Piedra R, Escamilla JA, Souza MFM. Homicídios na região das Américas: magnitude, distribuição e tendências, 1999-2009. Ciên Saúde Colet. 2012;17(12):3171-82. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232012001200003. PMid:23175394.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232012...
, que devem sofrer interferência de políticas públicas para alterar o cenário.

A tendência estável das taxas de homicídios nas regiões Baixada Cuiabana, Noroeste, Oeste e Sudeste não atesta futuro favorável para essas regiões, uma vez que apresentaram as mais altas taxas do estado.

A região Baixada Cuiabana manteve o maior coeficiente médio de taxas de homicídios nos 21 anos de estudo e mantém tendência estável, ou seja, as taxas tendem a continuar altas. Tal característica pode ser explicada pela influência de aspectos estruturais, especialmente de urbanização, pois a região detém quase 30% da população e a maior densidade demográfica do estado. Essa influência na ocorrência da criminalidade foi apontada em um estudo considerado clássico sobre os crimes na cidade de São Paulo entre os anos de 1880 a 1924, no contexto da industrialização e da urbanização dessa cidade2121 Fausto B. Crime e cotidiano: a criminalidade em São Paulo (1880-1924). São Paulo: Brasiliense; 1984..

A elevada ocorrência de violências, inclusive o homicídio, pode ser atribuída ao processo de urbanização e industrialização provocado pelo neoliberalismo econômico impregnado na política nas últimas três décadas. As fortes correntes migratórias com destino às periferias dos grandes centros urbanos, onde as populações vivem em condições de extrema pobreza e desorganização social, estão relacionadas à industrialização e urbanização – estas são consideradas elementos que ampliam os efeitos deletérios dos processos de mudança social2222 Minayo MCS. Conceitos, teorias e tipologias de violência: a violência faz mal à saúde individual e coletiva. In: Sousa ER, organizadora. Impactos da violência na saúde. Rio de Janeiro: EAD/ENSP; 2007. p. 21-35. http://dx.doi.org/10.7476/9788575415887.003.
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A influência da urbanização também pode parecer explicar a tendência crescente nas regiões Sul Matogrossense e Teles Pires, visto que elas abrigam, respectivamente, a terceira e quarta cidades mais populosas do estado1515 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Mato Grosso [Internet]. 2023 [citado em 2018 Out 03]. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/mt/panorama
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Ao observar o produto interno bruto (PIB), vê-se que cerca de 60% da riqueza do estado é produzida justamente nas regiões Baixada Cuiabana, Sul Matogrossense e Teles Pires. Essas duas últimas regiões detêm 26% da população estadual e concentram quase 40% do PIB do estado1616 Scatena JHG, Oliveira LR, Galvão ND, Neves MAB. O uso de indicadores compostos para classificação das regiões de saúde de Mato Grosso. In: Scatena JHG, Kehrig RT, Spinelli MAS, editores. Regiões de saúde: diversidade e processo de regionalização em Mato Grosso. São Paulo: Hucitec; 2014. p. 169-91., mas estão entre as regiões mais violentas, inclusive com tendência crescente da taxa de homicídios em homens jovens. Portanto, os resultados sugerem que a geração de capital não garante regiões menos violentas.

Diferentemente das três regiões referidas, a região Norte Araguaia Karajá é a com menor população de homens jovens no estado1515 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Mato Grosso [Internet]. 2023 [citado em 2018 Out 03]. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/mt/panorama
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e revelou o menor coeficiente médio de taxa de homicídios, além de manter tendência estável. Em estudo1616 Scatena JHG, Oliveira LR, Galvão ND, Neves MAB. O uso de indicadores compostos para classificação das regiões de saúde de Mato Grosso. In: Scatena JHG, Kehrig RT, Spinelli MAS, editores. Regiões de saúde: diversidade e processo de regionalização em Mato Grosso. São Paulo: Hucitec; 2014. p. 169-91. que avaliou o processo de regionalização no estado de Mato Grosso, ao analisar os gastos com saúde, os autores verificaram que apenas a região Norte Araguaia Karajá se situou no melhor estrato entre as regiões do estado, solidificando a perspectiva de relação entre gastos com a saúde e baixas taxas de homicídios.

Por outro lado, o mesmo estudo1616 Scatena JHG, Oliveira LR, Galvão ND, Neves MAB. O uso de indicadores compostos para classificação das regiões de saúde de Mato Grosso. In: Scatena JHG, Kehrig RT, Spinelli MAS, editores. Regiões de saúde: diversidade e processo de regionalização em Mato Grosso. São Paulo: Hucitec; 2014. p. 169-91. evidenciou que as sete regiões localizadas no extremo norte do estado, incluindo Norte Araguaia Karajá, detinham os piores indicadores socioeconômicos. Diferenças em relação à disponibilidade e utilização de serviços de saúde, assim como os gastos com saúde, foram também marcantes segundo os autores1616 Scatena JHG, Oliveira LR, Galvão ND, Neves MAB. O uso de indicadores compostos para classificação das regiões de saúde de Mato Grosso. In: Scatena JHG, Kehrig RT, Spinelli MAS, editores. Regiões de saúde: diversidade e processo de regionalização em Mato Grosso. São Paulo: Hucitec; 2014. p. 169-91., indicando a relação dos determinantes socioeconômicos com as taxas de homicídios.

O desenvolvimento econômico vivido por essas regiões nas últimas três décadas pode ser imbuído da tendência mundial ao neoliberalismo. Um estudo recente2323 McLean C, Long MA, Stretesky PB, Lynch MJ, Hall S. Exploring the relationship between neoliberalism and homicide: a cross-national perspective. Int J Sociol. 2019;49(1):53-76. http://dx.doi.org/10.1080/00207659.2018.1560981.
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relacionou o neoliberalismo com o homicídio e explica que algumas características do neoliberalismo podem influenciar as taxas de homicídios, na medida em que enfatiza a importância da responsabilidade pessoal e, portanto, fomenta uma forma única de individualismo competitivo; com isso, a liberdade econômica pode criar uma condição na qual as instituições engajadas na socialização falharão e a socialização será atenuada. O estudo ressalta ainda que as políticas neoliberais têm sido associadas a cortes no bem-estar e à eliminação de programas que são ideologicamente opostos à responsabilidade individual e à liberdade, o que pode afetar diretamente as populações marginalizadas economicamente2323 McLean C, Long MA, Stretesky PB, Lynch MJ, Hall S. Exploring the relationship between neoliberalism and homicide: a cross-national perspective. Int J Sociol. 2019;49(1):53-76. http://dx.doi.org/10.1080/00207659.2018.1560981.
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O comportamento das taxas de homicídio em jovens nas regiões de saúde de Mato Grosso segue alguns padrões encontrados em outros estudos que apontam maiores taxas em capitais, regiões metropolitanas e grandes cidades2424 Waiselfisz JJ. Mapa da violência 2010: anatomia dos homicídios. São Paulo: Instituto Sangari; 2010.. Porém, o fenômeno da interiorização dos homicídios, observado e discutido nos municípios brasileiros2424 Waiselfisz JJ. Mapa da violência 2010: anatomia dos homicídios. São Paulo: Instituto Sangari; 2010., pode estar influenciando as taxas de homicídios dos próprios estados e, mais especificamente no caso deste estudo, nas regiões de saúde de Mato Grosso.

A tese da interiorização citada por Waiselfisz – Mapa da violência 2004 –, que analisou a distribuição dos homicídios entre 1993 e 20022525 Waiselfisz JJ. Mapa da violência 2004: os jovens do Brasil. São Paulo: Secretaria Especial dos Direitos Humanos; 2004., apontou taxas mais altas de homicídios nas capitais e regiões metropolitanas, porém, a partir de 1999, a taxa de crescimento do interior superou a das capitais e das regiões metropolitanas2525 Waiselfisz JJ. Mapa da violência 2004: os jovens do Brasil. São Paulo: Secretaria Especial dos Direitos Humanos; 2004.. Essa tese pode explicar o que vem ocorrendo nas regiões Alto Tapajós, Centro Norte, Garças Araguaia, Médio Norte e Vale do Peixoto, que resultaram em tendência crescente da taxa de homicídios em contrapartida à região Baixada Cuiabana, que se mostrou com tendência estável.

A mudança nos polos dinâmicos do crescimento dos homicídios é explicada pela emergência de polos de crescimento econômico em municípios do interior de diversos estados do país. Tais polos tornaram-se atrativos para investimentos e migrações em razão da expansão do emprego e da renda, porém converteram-se também pelos mesmos motivos em locais atrativos para a criminalidade, na ausência de esquemas de proteção do Estado2525 Waiselfisz JJ. Mapa da violência 2004: os jovens do Brasil. São Paulo: Secretaria Especial dos Direitos Humanos; 2004..

Em contrapartida, investimentos nas capitais e nas grandes regiões metropolitanas foram declarados prioritários a partir do novo Plano Nacional de Segurança Pública em 1999, sendo canalizados recursos federais e estaduais, principalmente, para aparelhamento dos sistemas de segurança pública nos grandes conglomerados, o que dificultou a ação da criminalidade organizada, que migrou para áreas de menor risco2626 Waiselfisz JJ. Mapa da violência 2012: novos padrões de homicídios no Brasil. São Paulo: Instituto Sangari; 2012.. Ademais, a melhoria na cobertura dos sistemas de coleta de dados de mortalidade, sobretudo no interior do país, diminuiu a subnotificação existente nessa área, de forma que os fenômenos que antes não eram registrados começaram a incidir nas estatísticas de mortalidade2626 Waiselfisz JJ. Mapa da violência 2012: novos padrões de homicídios no Brasil. São Paulo: Instituto Sangari; 2012..

É válido reconhecer que este estudo foi interpretado à luz das limitações comuns decorrentes do uso de dados secundários, seja referente à subnotificação ou à qualidade do registro da causa básica do óbito, representada, principalmente, pelo volume de registros de causas cuja intenção é indeterminada2626 Waiselfisz JJ. Mapa da violência 2012: novos padrões de homicídios no Brasil. São Paulo: Instituto Sangari; 2012.. Contudo, sob esse aspecto, ressalta-se que, no período de 2007 a 2017, houve redução dessas causas no estado de Mato Grosso2727 Cerqueira D, Bueno S, Lima RS, Neme C, Ferreira H, Alves PP, et al. Atlas da violência 2019 [Internet]. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada/Fórum Brasileiro de Segurança Pública; 2019 [citado em 2019 Set 09]. Disponível em: http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/relatorio_institucional/190605_atlas_da_violencia_2019.pdf
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A violência tornou-se tema do campo da saúde pelo impacto que provoca na qualidade de vida individual e coletiva, pelas lesões físicas, psíquicas e morais que acarreta e pelas exigências de atenção e cuidados dos serviços médico-hospitalares2828 Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Impacto da violência na saúde dos brasileiros. Brasília: Ministério da Saúde; 2005.. A perda por homicídio costuma gerar consequências significativas de curto e longo prazos, com custos emocionais e sociais, tanto para a sociedade quanto para os familiares e amigos das vítimas, além dos anos de vida perdidos2929 Costa DH, Schenker M, Njaine K, Souza ER. Homicídios de jovens: os impactos da perda em famílias de vítimas. Physis. 2017;27(3):685-705. http://dx.doi.org/10.1590/s0103-73312017000300016.
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, refletindo, assim, forte impacto na saúde das pessoas.

No Brasil, algumas iniciativas abordam a promoção à saúde de homens jovens e a redução de mortes violentas: Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem3030 Brasil. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas. Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem: princípios e diretrizes. Brasília: Ministério da Saúde; 2009., Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes e Jovens3131 Brasil. Secretaria de Atenção em Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Diretrizes nacionais para a atenção integral à saúde de adolescentes e jovens na promoção, proteção e recuperação da saúde. Brasília: Ministério da Saúde; 2010., Plano Juventude VIVA3232 Brasil. Coordenação-Geral de Relações Institucionais. Plano Juventude Viva: guia de implementação para estados e municípios. Brasília: Secretaria Nacional de Juventude; 2014., Política Nacional de Redução da Morbimortalidade por Acidentes e Violências3333 Lima MLC. Sobre a Política Nacional de Redução da Morbimortalidade por Acidentes e Violências hoje. Ciên Saúde Colet. 2009;14(5):1654-5. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232009000500005. PMid:19851576.
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e Política Nacional de Promoção da Saúde3434 Malta DC, Silva MMA, Albuquerque GM, Lima CM, Cavalcante T, Jaime PC, et al. A implementação das prioridades da Política Nacional de Promoção da Saúde, um balanço, 2006 a 2014. Ciên Saúde Colet. 2014;19(11):4301-12. http://dx.doi.org/10.1590/1413-812320141911.07732014. PMid:25351297.
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Essas iniciativas baseiam-se nos fatores que impulsionam a evolução dos homicídios a partir do conhecimento da conjuntura do problema, cuja multicausalidade representa a indispensabilidade de articulação intersetorial e interdisciplinar, visando à prevenção3535 Román MPD, Lara OP, Minchel MCJ. Alternative reflections on the treatment of violence and crime in Latin America: the prevention of crime as a strategy. Soc Med [Internet]. 2019;12(2):102-8 [citado em 2020 Dez 05]. Disponível em: https://socialmedicine.info/index.php/socialmedicine/article/view/1055
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, que inclui esforços da educação, economia, política, justiça, assistência social, organizações da sociedade civil e terceiro setor, além do setor da saúde.

Verificada neste estudo a tendência crescente ou estável, com altas taxas, nas regiões de saúde e no estado de Mato Grosso, sugere-se a realização de estudos que produzam maiores informações sobre a dinâmica desse fenômeno e que compreendam a influência dos determinantes sociais e econômicos, além de verificar o acesso pela população exposta aos serviços públicos de saúde, educação e segurança. Esse desafio está condicionado à compreensão da multicausalidade dos homicídios e à articulação intersetorial e interdisciplinar que incluem esforços para além do setor da saúde e são essenciais para a construção de políticas públicas, a fim de reverter a tendência e evitar mortes precoces.

  • Como citar: Carlo FS, Oliveira LR, Andrade ACS. Tendência temporal e distribuição espacial de homicídios em homens jovens no estado de Mato Grosso, Brasil, 1996-2016. Cad Saúde Colet, 2023; 31 (2):e31020086. https://doi.org/10.1590/1414-462X202331020086
  • Trabalho realizado no estado de Mato Grosso, Brasil. Manuscrito derivado da dissertação de mestrado de Franciele Silvia de Carlo, intitulada ‘Homicídios em homens jovens no estado de Mato Grosso, Brasil, 1996-2022: tendência e projeção’, defendido, junto ao Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), em 19 de fevereiro de 2020.
  • Fonte de financiamento: nenhuma.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    26 Mar 2020
  • Aceito
    02 Mar 2021
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