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IMITAÇÃO OU COERÇÃO? CONSTITUIÇÕES ESTADUAIS E CENTRALIZAÇÃO FEDERATIVA NO BRASIL

¿Imitación o coerción? Constituciones estatales y centralización federativa en Brasil

Resumo

As constituições estaduais brasileiras emulam a Carta Federal, mimetizando sua estrutura e reproduzindo literalmente suas normas. A difusão vertical de normas constitucionais prevalece sobre a horizontal, ou seja, os estados são mais influenciados pela Constituição Federal do que influenciam uns aos outros. Em parte, essa difusão top-down ocorre por imitação, mas é também determinada por coerção, reforçada por decisões judiciais. A originalidade no constitucionalismo estadual brasileiro surge mais em diferentes maneiras de emular a Constituição Federal do que pela criação de normas próprias, fazendo do constitucionalismo estadual mais uma evidência do centralismo dessa federação, ao menos no que concerne à produção de normas jurídicas. O artigo analisa tal fenômeno comparando quantitativamente os textos constitucionais estaduais e federal e avaliando as condições históricas de sua elaboração.

Palavras-chave:
difusão constitucional; constitucionalismo estadual; federalismo; descentralização; relações intergovernamentais.

Resumen

Las constituciones estatales brasileñas emulan la Carta Federal, copiando su estructura y reproduciendo literalmente sus normas. La difusión vertical de las normas constitucionales prevalece sobre la horizontal, es decir, los estados están más influenciados por la Constitución Federal de lo que se influyen mutuamente. En parte, esta difusión de arriba hacia abajo ocurre por imitación, pero también está determinada por la coerción, reforzada por decisiones judiciales. La originalidad en el constitucionalismo estatal brasileño surge más en diferentes formas de emular la Constitución Federal que mediante la creación de sus propias normas, haciendo del constitucionalismo estatal una prueba adicional del centralismo de esta federación, al menos en lo que se refiere a la producción de normas jurídicas. El artículo analiza este fenómeno comparando cuantitativamente los textos constitucionales estatales y federales y evaluando las condiciones históricas de su elaboración.

Palabras clave:
difusión constitucional; constitucionalismo estatal; federalismo; descentralización; relaciones intergubernamentales.

Abstract

The Brazilian states’ constitutions emulate the Federal Constitution, mimicking its structure and reproducing its norms word for word. Vertical diffusion of constitutional norms prevails over horizontal diffusion of norms, that is, states are more influenced by the federal constitution than they are by each other. In part, this top-down diffusion occurs through imitation, but it is also determined by coercion, reinforced by judicial decisions. Originality in Brazilian state constitutionalism owes more to the different ways of emulating the Federal Constitution than to the creation of its own norms, making state constitutionalism additional evidence of the centralism of this federation, at least in regard to the production of legal standards. This article analyzes this phenomenon by quantitatively comparing the state and federal constitutional texts and assessing the historical conditions of their drafting.

Keywords:
constitutional diffusion; state constitutionalism; federalism; decentralization; intergovernmental relations.

1. INTRODUÇÃO

Federações são um espaço privilegiado para a difusão de políticas e instituições e, consequentemente, para o estudo de tais processos. O pertencimento a um conjunto de entes políticos geograficamente próximos, articulados por afinidades diversas, laços institucionais e relações intergovernamentais cria a oportunidade para que experiências sejam emuladas entre o governo federal e as unidades subnacionais, bem como destas entre si, em movimentos verticais (top-down e bottom-up) e horizontais. A forma como tal difusão ocorre em federações, contudo, variará em função do tipo de federalismo vigente.

Estudos sobre difusão de políticas, práticas e instituições em contexto federativo são especialmente prolíficos nos e sobre os Estados Unidos, mas há também pesquisas que abarcam outras federações, lidando com a difusão de políticas entre União e estados (Karch, 2006KARCH, Andrew. National intervention and the diffusion of policy innovations. American Politics Research, v. 34, n. 4, p. 403-426, jul. 2006.), entre estados ou cantões (Gilardi e Füglister, 2008GILARDI, Fabrizio; FÜGLISTER, Katharina. Empirical modeling of policy diffusion in federal states: the dyadic approach. Swiss Political Science Review, v. 14, n. 3, p. 413-50, 2008.) ou entre estados e municípios ou condados (Shipan e Volden, 2008SHIPAN, Charles R.; VOLDEN, Craig. The mechanisms of policy diffusion. American Journal of Political Science, v. 52, n. 4, p. 840-857, out. 2008.), por exemplo.

No Brasil e sobre ele, os estudos pioneiros de difusão têm-se dedicado à disseminação internacional de políticas bem-sucedidas de participação (Oliveira, 2016OLIVEIRA, Fabiana L. Agenda suprema: interesses em disputa no controle de constitucionalidade das leis no Brasil. Tempo Social, v. 28, n. 1, p. 105-133, abr. 2016., 2017OLIVEIRA, Osmany P. Promovendo conexões transnacionais: As redes e a difusão do Orçamento Participativo. Revista Brasileira de Políticas Públicas e Internacionais, v. 2, n. 1, p. 4-35, jul. 2017.) e, principalmente, à difusão nacional de políticas sociais e participativas de âmbito municipal, temas sobre os quais há um maior número de trabalhos e pesquisadores (Coêlho, 2012COÊLHO, Denilson Bandeira. Political competition and the diffusion of conditional cash transfers in Brazil. Brazilian Political Science Review, v. 6, n. 2, p. 56-87, 2012.; Coêlho, Cavalcante e Turgeon, 2016COÊLHO, Denilson Bandeira; CAVALCANTE, Pedro; TURGEON, Mathieu. Mecanismos de difusão de políticas sociais no Brasil: uma análise do Programa Saúde da Família. Revista de Sociologia e Política, v. 24, n. 58, p. 145-165, jun. 2016.; Spada, 2014SPADA, Paolo. The diffusion of participatory governance innovations: a panel data analysis of the adoption and survival of participatory budgeting in Brazil. In: LATIN AMERICAN STUDIES ASSOCIATION, 32., 2014. Chicago: Lasa, 2014. p. 1-53.; Sugiyama, 2007SUGIYAMA, Natasha. Theories of policy diffusion: social sector reform in Brazil. Comparative Political Studies, v. 41, n. 2, p. 193-216, 2007., 2012SUGIYAMA, Natasha. Bottom-up policy diffusion: national emulation of a conditional cash transfer program in Brazil. Publius, v. 42, n. 1, p. 25-51, jan. 2012.; Wampler, 2008WAMPLER, Brian. A difusão do Orçamento Participativo brasileiro: “boas práticas” devem ser promovidas? Opinião Pública, v. 14, n. 1, p. 65-95, 2008.). Segundo Oliveira e Faria (2017)OLIVEIRA, Osmany P.; FARIA, Carlos A. P. Policy transfer, diffusion, and circulation: research traditions and the state of the discipline in Brazil. Novos Estudos Cebrap, v. 36, n. 1, p. 13-32, 2017., o campo de estudos sobre difusão no Brasil se encontra em um estágio embrionário; os autores identificam apenas 13 artigos publicados no Brasil que tratam da difusão de políticas públicas, e apenas quatro se dedicam ao estudo “intrafederativo”.

Devido à incipiência do campo no Brasil e ao maior foco em políticas municipais, faltam estudos sobre a difusão que atentem para o nível estadual de governo e, ainda mais, que considerem não apenas políticas sociais e de participação iniciadas no âmbito local, mas também a difusão de normas constitucionais ou legais que balizarão a formulação de outras políticas e a própria dinâmica governamental como um todo.

Particularmente no que concerne à difusão de normas constitucionais, a literatura é ainda mais escassa. Um dos únicos estudos recentes que lida diretamente com esse tema, o de Elkins (2010)Elkins, Zachary; Ginsburg, Tom; Melton, James. The endurance of national constitutions. Cambridge: Cambridge University Press, 2009., considera-o no contexto internacional, com a difusão de normas constitucionais entre países, não numa federação. E a literatura sobre constitucionalismo estadual, por sua vez, não incorpora as teorias sobre difusão. É o preenchimento dessa lacuna que este artigo visa, articulando três campos até aqui apartados: (1) estudos sobre difusão; (2) federalismo; e (3) constitucionalismo - com destaque para um tema inexplorado pelos três campos, o constitucionalismo estadual.

2. TIPOS DE FEDERAÇÃO E DIFUSÃO CONSTITUCIONAL

Certa perspectiva acerca das federações as define como “caracteristicamente não centralizadas; isto é, os poderes do governo dentro delas, em vez de serem concentrados em um único centro, são difundidos entre muitos centros, cuja existência e autoridade são garantidas pela constituição geral” (Elazar, 1987ELAZAR, Daniel. Exploring federalism. Tucaloosa: The University of Alabama Press, 1987.:34; itálico nosso). Desse ponto de vista, esperar-se-ia numa federação, em vez de hierarquia, uma divisão de competências horizontal entre entes federativos. Contudo, a própria horizontalidade concerne a um tipo particular de federação - um sistema federal “horizontal” (Halberstam, 2008HALBERSTAM, Daniel. Comparative federalism and the role of the Judiciary. In: WHITTINGTON, Keith E.; KELEMEN, R. Daniel; CALDEIRA, Gregory A. The Oxford handbook of law and politics. Nova York: Oxford University Press, 2008. p. 142-164.:145), no qual cada governo tem “a capacidade de formular, executar e adjudicar suas próprias políticas”. Nem todas as federações, contudo, são sistemas horizontais, como supõe Elazar em sua definição.

Muitos sistemas federais são “verticais” e neles “o governo central frequentemente necessita que os governos constituintes transponham as políticas do governo central para leis estaduais mais específicas, administrem as políticas do governo central e adjudiquem o direito do governo central” (Halberstam, 2008HALBERSTAM, Daniel. Comparative federalism and the role of the Judiciary. In: WHITTINGTON, Keith E.; KELEMEN, R. Daniel; CALDEIRA, Gregory A. The Oxford handbook of law and politics. Nova York: Oxford University Press, 2008. p. 142-164.:145). Nestes há menos competição entre entes e um processo de maior integração - não necessariamente de cooperação. É de se esperar que governos subnacionais emulem políticas e normas do governo central, de maneira que as constituições estaduais (CEs) espelhem em boa medida a federal.

De fato, numa federação como a brasileira - ao menos desde a concentração promovida durante a Era Vargas a partir de 1930 -, centralizada e conforme com o modelo vertical de federalismo, constituições estaduais tendem a mimetizar a federal. Embora não ocorra mera repetição do texto nas Cartas dos 26 estados e do Distrito Federal, encontram-se CEs muito similares à Lei Suprema do país e, consequentemente, em algum grau similares entre si (ainda que nem todas copiem da mesma forma o texto federal). Observe-se que as CEs foram todas elaboradas no prazo de um ano após a promulgação da Constituição Federal (CF), por sua expressa determinação e seguindo seus princípios. Por isso mesmo se esperam cartas estaduais inspiradas na federal, cujas normas são difundidas verticalmente muito mais por coerção e imitação do que por aprendizado ou competição entre estados, nos termos de Shipan e Volden (2008SHIPAN, Charles R.; VOLDEN, Craig. The mechanisms of policy diffusion. American Journal of Political Science, v. 52, n. 4, p. 840-857, out. 2008.:841-843).

Esses autores observam quatro mecanismos de difusão de políticas: aprendizado, competição econômica, imitação e coerção. O primeiro deles, o aprendizado, decorre de uma avaliação acerca da política, de seu contexto e de suas consequências por parte do ente governamental que a adota, considerando-se a experiência prévia de outros entes, importando mais a política propriamente dita do que os atores que a adotaram antes. É exatamente o oposto da imitação, em que se encampa uma certa política justamente porque determinado ator a adotou anteriormente; e como se entende que esse ator deve ser emulado, imitam-se suas iniciativas, sem maior atenção crítica ao mérito específico delas.

Já a competição econômica é um mecanismo de difusão em que a adoção de determinada política por um governo decorre de sua preocupação com as externalidades decorrentes de sua adoção por outros entes. Desse modo, adotá-la seria uma forma de, por meio da competição com os demais, proteger-se. Por exemplo, se outros estados oferecem um incentivo fiscal às empresas e o meu não o faz, provavelmente será penalizado com a perda de investimentos; desse modo, ofereço o mesmo incentivo para competir com eles.

Por fim, a coerção é um mecanismo de difusão em que a adoção de políticas por um ente governamental ocorre por ser ele compelido a fazê-lo por outros entes. No plano internacional, as sanções econômicas são um instrumento de coerção frequente; no plano doméstico, uma das formas possíveis é condicionar a transferência de recursos de uma esfera superior de governo para as inferiores à adoção de uma certa política - como faz o Brasil por meio do Sistema Único de Saúde. Também é possível compelir juridicamente governos a adotar certas políticas e normas, estipulando uma normatividade legal no nível superior que restrinja ou mesmo determine as normas a serem adotadas nos níveis inferiores. É este o caso do constitucionalismo federal brasileiro, em que a Carta federal define numa relação top-down o que estados e municípios devem fazer com suas próprias normas constitucionais e legais.

Os mecanismos identificados por Shipan e Volden, nossa referência para esta discussão, não são unanimemente identificados como formas de difusão na literatura - que aliás, diverge bastante quanto a isso. Elkins e Simmons (2005Elkins, Zachary; SIMMONS, Beth. On waves, clusters, and diffusion: a conceptual framework. The Annals of the American Academy of Political and Social Science, v. 598, p. 33-51, mar. 2005.), por exemplo, consideram mecanismos de difusão apenas a adaptação (que abarcaria a competição econômica) e o aprendizado (que incluiria a imitação como um aprendizado de baixo custo). A coerção, contudo, é considerada por eles uma forma de coordenação, categoria de disseminação de políticas diferente da difusão e que abarcaria também a cooperação. A diferenciação se funda na suposição de que a difusão ocorreria apenas em situação de interdependência descoordenada entre os atores que adotam as práticas ou as políticas. Os autores não justificam o porquê dessa distinção excludente, pois apenas afirmam que a difusão não pode admitir (ao menos no plano internacional) qualquer “colaboração, imposição ou esforço programado” (Elkins e Simmons, 2005Elkins, Zachary; Ginsburg, Tom; Melton, James. The endurance of national constitutions. Cambridge: Cambridge University Press, 2009.:38) dos atores envolvidos. É uma exigência sem muito sentido heurístico, ainda mais numa federação, em que formas coordenadas de relacionamento - por meio dos quais políticas e práticas não apenas se “disseminam”, mas se “difundem” - são inerentes à interdependência dos membros. Eis por que os mecanismos de Shipan e Volden nos parecem mais adequados.

O caráter vertical e top-down do federalismo brasileiro não implica a impossibilidade de alguma variação e inovação - particularmente no âmbito da formulação e implementação estadual de políticas públicas estipuladas centralmente (Machado, 2014MACHADO, José A. Federalismo, poder de veto e coordenação de políticas sociais no Brasil pós-1988. Organizações & Sociedade, v. 21, n. 69, p. 335-350, jun. 2014.). No caso de iniciativas legislativas dos estados, entretanto, tal espaço é alvo frequente de questionamentos judiciais que tendem a reforçar a tendência vertical e centralizadora, pois as competências legislativas dos estados são muito reduzidas na Constituição de 1988. Segundo a Carta, enquanto compete à União legislar sobre 29 temas diferentes e aos municípios legislar sobre assuntos de interesse local, os estados poderão legislar apenas sobre questões específicas das matérias de competência da União que forem definidas por lei complementar federal (Art. 22, parágrafo único); sobre outras 26 matérias, União e estados legislam concorrentemente - portanto, havendo conflito, prevalece a legislação federal (Art. 24, §4o). A única competência legislativa específica dos estados brasileiros determinada pela Carta de 1988 é a de instituir regiões metropolitanas (Art. 25, §3o).

Como neste artigo tratamos especificamente da centralização atinente à capacidade de produzir normas jurídicas (entre as quais estão as constitucionais), o mimetismo constitucional é tomado como indicador da centralização neste âmbito, ratificando o centralismo da federação brasileira já observado por outros estudiosos em outros campos (Almeida, 2005ALMEIDA, Maria H. T. Recentralizando a federação? Revista de Sociologia e Política, n. 24, p. 29-40, jun. 2005.; Arretche, 2009ARRETCHE, Marta. Continuidades e descontinuidades da Federação Brasileira: de como 1988 facilitou 1995. Dados, Rio de Janeiro, v. 52, n. 2, p. 377-423, jun. 2009., 2012, 2013; Machado, 2014MACHADO, José A. Federalismo, poder de veto e coordenação de políticas sociais no Brasil pós-1988. Organizações & Sociedade, v. 21, n. 69, p. 335-350, jun. 2014.). Celina Souza (2005SOUZA, Celina. Federalismo, desenho constitucional e instituições federativas no Brasil pós-1988. Revista de Sociologia e Política, n. 24, p. 105-121, 2005.:111) observa:

[...] regras sobre as competências, recursos e políticas públicas das entidades subnacionais são capítulos detalhados da Constituição, deixando pouca margem de manobra para iniciativas específicas [...]. Os estados acabam sendo quase apenas entes gestores do Direito Federal. […] a maioria das constituições estaduais é uma mera repetição dos mandamentos federais. As poucas tentativas de criar regras não explicitamente especificadas pela Constituição Federal, mas não proibidas, foram declaradas inconstitucionais pelo STF.

Isso contrasta com o modelo norte-americano, antípoda do brasileiro e principal referência para a literatura sobre constitucionalismo estadual (Tarr e Porter, 1987TARR, G. Alan; PORTER, Mary C. State constitutionalism and state constitutional law. Publius, v. 17, n. 1, p. 1-12, 1987.; Dinan, 2006DINAN, John J. The American state constitutional tradition. Lawrence: University Press of Kansas, 2006.; Kahn, 1993KAHN, Paul W. Interpretation and authority in state constitutionalism. Harvard Law Review, v. 106, n. 5, p. 1147-1168, mar. 1993.; Kincaid, 1988KINCAID, John. State constitutions in the federal system. Annals of the American Academy of Political and Social Science, v. 496, p. 12-22, mar. 1988.; May, 1987MAY, Janice C. Constitutional amendment and revision revisited. Publius, v. 17, n. 1, p. 153-179, inverno1987.), onde há constituições estaduais bastante díspares entre si e muito diferentes da nacional (Lutz, 1994Lutz, Donald S. Toward a theory of constitutional amendment. American Political Science Review, v. 88, n. 2, p. 355-370, jun. 1994.), a ponto de que, no debate sobre reformas constitucionais no nível estadual, emerge a questão de que talvez se devesse aproximar as Cartas dos estados do modelo nacional (Tarr, 1998TARR, G. Alan. Models and fashions in state constitutionalism. Wisconsin Law Review, p. 729-746, 1998.; 2001TARR, G. Alan. The state of state constitutions. Louisiana Law Review, v. 62, n. 1, p. 3-16, 2001.) - o que, para alguns, seria um equívoco (Hammons, 1999HAMMONS, Christopher W. Was James Madison wrong? Rethinking the American preference for short, framework-oriented constitutions. The American Political Science Review, v. 93, n. 4, p. 837-849, dez. 1999.), pois no âmbito estadual constituições mais prolixas e, portanto, distintas do enxuto modelo madisoniano seriam mais duráveis; e se durabilidade for bom indicador da adequação do texto constitucional, seriam recomendáveis textos destinados a durar - longos e detalhados, capazes de expressar acordos mais inclusivos (Elkins et al., 2009Elkins, Zachary; Ginsburg, Tom; Melton, James. The endurance of national constitutions. Cambridge: Cambridge University Press, 2009.).

O caráter sumário da constituição federal estadunidense, contudo, oblitera que o constitucionalismo norte-americano compreende não apenas a Carta nacional, mas a ela conjuntamente com as estaduais. Nos termos de Kincaid (1988KINCAID, John. State constitutions in the federal system. Annals of the American Academy of Political and Social Science, v. 496, p. 12-22, mar. 1988.:13; tradução nossa):

Embora o termo “Constituição Americana” seja frequentemente utilizado como sinônimo de “Constituição dos Estados Unidos”, a constituição americana operacional consiste da Constituição federal e das cinquenta constituições estaduais. Juntos, estes 51 documentos compreendem um sistema complexo de governo constitucional para uma república de repúblicas.

Isso indica por que a Carta federal americana, apesar de curta e de difícil emendamento, seja tão duradoura, contrariando a expectativa de Elkins, Ginsburg e Melton (2009Elkins, Zachary; Ginsburg, Tom; Melton, James. The endurance of national constitutions. Cambridge: Cambridge University Press, 2009.), de que textos menores são menos propensos a durar. A incompletude de seu texto (Lutz, 1988Lutz, Donald S. The United States Constitution as an incomplete text. The Annals of the American Academy of Political and Social Science, v. 496, p. 23-32, mar. 1988.) e a rigidez que dificulta seu emendamento são compensadas pela complementaridade e flexibilidade das CEs. Assim, características favoráveis à durabilidade, como extensão, adaptabilidade e inclusividade, provêm do conjunto, mas não do texto nacional considerado isoladamente. É esse todo - principalmente mediante cartas estaduais - que abarca problemas diversos, modifica-se com o tempo e inclui interesses distintos, ajustando-se a peculiaridades regionais. Para além dos textos, o constitucionalismo americano em seu conjunto se completa nos estados atendendo à interpretação das cortes (Kahn, 1993KAHN, Paul W. Interpretation and authority in state constitutionalism. Harvard Law Review, v. 106, n. 5, p. 1147-1168, mar. 1993.:1148). Assim, o aggiornamento constitucional não resulta somente de interpretações novas da Suprema Corte a dispositivos e princípios constitucionais federais, mas também de interpretações inovadoras que tribunais estaduais dão a princípios do sistema constitucional em seu conjunto, não se restringindo ao caráter único de cada peculiar experiência estadual (Kahn, 1993KAHN, Paul W. Interpretation and authority in state constitutionalism. Harvard Law Review, v. 106, n. 5, p. 1147-1168, mar. 1993.:1152-1156; Elazar, 1982ELAZAR, Daniel. The principles and traditions underlying state constitutions. Publius, v. 12, n. 1, p. 11-25, inverno1982.).

Essas características do modelo norte-americano, porém, colocam-no no extremo de um contínuo que tem o Brasil na outra ponta. Caso mais similar ao brasileiro é o alemão, de constituição federal mais detalhada e federalismo vertical (Halberstam, 2008HALBERSTAM, Daniel. Comparative federalism and the role of the Judiciary. In: WHITTINGTON, Keith E.; KELEMEN, R. Daniel; CALDEIRA, Gregory A. The Oxford handbook of law and politics. Nova York: Oxford University Press, 2008. p. 142-164.). As constituições dos Länder foram aprovadas em ao menos três diferentes ondas (Gunlicks, 1998GUNLICKS, Arthur B. Land constitutions in Germany. Publius, v. 28, n. 4, p. 105-125, outono1998.; Lorenz e Reutter, 2012LORENZ, Astrid; REUTTER, Werner. Subconstitutionalism in a multilayered system: a comparative analysis of constitutional politics in the German Länder. Perspectives on Federalism, v. 4, n. 2, p. 148-169, 2012.). A primeira, logo após a derrota do país na Segunda Grande Guerra, entre 1946 e 1947, sob a ocupação das forças aliadas. As regiões sob controle americano e francês aprovaram suas constituições antes mesmo da elaboração da Lei Fundamental (portanto, sem inspirar-se nela). A segunda onda ocorreu nas regiões sob controle britânico, que aguardaram a promulgação da Constituição Federal, em 1949. Redigidas sob influência de países diferentes, seguindo procedimentos distintos, sob a égide de características regionais próprias (cinco Länder, aliás, foram desenhados artificialmente pelos aliados, sem relação necessária com territórios historicamente estabelecidos) e obedecendo a timings diversos, essas constituições das duas primeiras ondas contemplaram diversidade considerável. Considerando apenas o tamanho, as constituições da segunda onda têm, em média, metade da extensão daquelas da primeira (Lorenz e Reutter, 2012LORENZ, Astrid; REUTTER, Werner. Subconstitutionalism in a multilayered system: a comparative analysis of constitutional politics in the German Länder. Perspectives on Federalism, v. 4, n. 2, p. 148-169, 2012.:152).

A terceira onda ocorreu quase meio século depois, no início dos anos 1990, com uma nova Carta em Schleswig-Holstein, na Alemanha Ocidental, inspirando as novas constituições dos Länder oriundos da parte Oriental, originando constituições mais longas do que as da segunda onda (Lorenz e Reutter, 2012LORENZ, Astrid; REUTTER, Werner. Subconstitutionalism in a multilayered system: a comparative analysis of constitutional politics in the German Länder. Perspectives on Federalism, v. 4, n. 2, p. 148-169, 2012.:52) e que incorporavam mais detalhes e temáticas, como direitos sociais e aspirações estatais. Elas ensejaram revisões de constituições das duas primeiras ondas que, desta feita, incorporaram traços da Lei Fundamental (inclusive suas emendas), foram influenciadas pela política dos partidos nacionais e ajustaram-se a decisões da Corte Constitucional Federal (Gunlicks, 1998GUNLICKS, Arthur B. Land constitutions in Germany. Publius, v. 28, n. 4, p. 105-125, outono1998.:110-112). Assim, embora inicialmente as constituições dos Länder fossem mais diferentes entre si e com relação à Lei Fundamental, ao longo do tempo emularam aspectos de outros estados e do constitucionalismo federal - para além de apenas o completarem, num processo de difusão tanto vertical como horizontal.

No Brasil, o mimetismo constitucional tem como possível corolário um emendamento diretamente influenciado pela modificação da Constituição do país, tanto no atinente ao ritmo como ao conteúdo, pois as CEs foram conformadas em boa medida à imagem e semelhança da Federal pelo poder constituinte decorrente. Afinal, se a Carta brasileira condiciona os textos estaduais, mudanças num âmbito poderiam acarretar adaptações no outro. Quanto ao ritmo, esperar-se-ia que o emendamento estadual ocorresse seguidamente ao federal, incidindo sobre matérias correlatas, em especial políticas públicas (policies) constitucionalizadas, pois são matérias mais propícias a serem objeto de emendamento. Isso, contudo, ocorre apenas parcialmente, como constatou Absher-Bellon (2015)ABSHER-BELLON, Gabriel L. Constituições estaduais pós-1989: o processo de emendamento e seus determinantes. Dissertação (mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Ciência Política, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2015. em estudo sobre as cartas estaduais.

Souza (2005SOUZA, Celina. Federalismo, desenho constitucional e instituições federativas no Brasil pós-1988. Revista de Sociologia e Política, n. 24, p. 105-121, 2005.) mostra que o centralizado federalismo brasileiro suscita questionamentos judiciais de dispositivos das CEs ausentes da Federal. Assim, inovações dos formuladores constitucionais estaduais que reforçariam a autonomia estadual são escrutinadas pelo STF, mediante controle de constitucionalidade federal de normas constitucionais estaduais. Consequentemente, espera-se que parte do emendamento estadual seja resposta à declaração da inconstitucionalidade de dispositivos estaduais pela corte suprema. Ademais, espera-se que decisões de tribunais dos estados sobre a constitucionalidade de leis estaduais e emendas à carta estadual vis-à-vis a Constituição Federal acarretem resposta das Assembleias Legislativas, mediante emendas constitucionais corretivas e modificações legais. Se isso ocorrer, teremos novo reforço do centralismo, com a difusão da normatividade federal para o plano estadual - parte como obra do STF, parte provocada pela atuação das cortes estaduais. Fabiana Oliveira (2016OLIVEIRA, Fabiana L. Agenda suprema: interesses em disputa no controle de constitucionalidade das leis no Brasil. Tempo Social, v. 28, n. 1, p. 105-133, abr. 2016.:117) analisou todas as Ações Diretas de Inconstitucionalidade entre 1988 e 2014. Segundo a autora, do “total de ADIs julgadas no período, 61% correspondem a diplomas de origem estadual, 28% de origem federal, 9% oriundos do Judiciário (decisões ou resoluções administrativas) e 2% têm outra origem, incluindo municípios, Ministério Público e conselhos profissionais”. Esses números demonstram que o enquadramento da produção legal dos estados tem sido o principal objeto do controle concentrado de constitucionalidade no Brasil. Esses números são próximos aos encontrados por Canello (2016CANELLO, Júlio. Judicializando a Federação? O Supremo Tribunal Federal e os atos normativos estaduais. 2016. Tese (doutorado em ciência política) - Instituto de Estudos Sociais e Políticos, Universidade do Estado do Rio de Janeiro.:114).

Há muito debate na literatura sobre o papel das Cortes nacionais na centralização política em federações, em particular no que concerne a constituições subnacionais (Williams e Tarr, 2004WILLIAMS, Robert F.; TARR, G. Alan. Subnational constitutional space: a view from the states, provinces, regions, länder, and cantons. In: TARR, G. Alan; WILLIAMS, Robert F.; MARKO, Josef (Ed.). Federalism, subnational constitutions, and minority rights. Westport: Praeger Publishers, 2004. p. 3-24.:7-11). Segundo Halberstam (2008HALBERSTAM, Daniel. Comparative federalism and the role of the Judiciary. In: WHITTINGTON, Keith E.; KELEMEN, R. Daniel; CALDEIRA, Gregory A. The Oxford handbook of law and politics. Nova York: Oxford University Press, 2008. p. 142-164.:147), muitos questionam a capacidade das cortes centrais como árbitros em conflitos federativos, basicamente por duas causas: primeiramente, “o papel do governo central” como criador, financiador e nomeador do judiciário nacional torná-lo-ia “aliado natural do governo central no controle dos estados”. Ademais, como o judiciário nacional é “encarregado da interpretação das leis do governo central”, ele adquiriria “um viés estrutural em favor de uma interpretação expansiva do direito do governo central”. Entretanto, ao menos no atinente à experiência americana, Halberstam observa um papel mais equilibrado e oscilante da Suprema Corte, sugerindo atuação mais independente que a esperada pelos que supõem uma tendência à centralização por via judiciária. Os Estados Unidos, contudo, são uma federação horizontal, como nota o próprio Halberstam; em federações verticais, como a alemã ou a brasileira, pode-se esperar situação distinta.

Neste artigo, contudo, não foi testada a hipótese de uma centralização constitucional por via judicial - o que ocorrerá na continuidade desta pesquisa. Identificamos que os principais autores de Ações Diretas de Inconstitucionalidade contra normas constitucionais estaduais são os governadores de estado. Decisões judiciais motivadas por ações de governadores tiveram o condão de ajustar dispositivos das constituições estaduais ao preconizado pela Constituição Federal. Com isso, mesmo sendo atores estaduais, governadores, disputando com suas Assembleias Legislativas questões constitucionais, produziram uma dinâmica reforçadora do centralismo constitucional. O achado é consistente com o observado por Fabiana Oliveira (2016OLIVEIRA, Osmany P. Mecanismos da difusão global do Orçamento Participativo: indução internacional, construção social e circulação de indivíduos. Opinião Pública, v. 22, n. 2, p. 219-249, 2016.:125); a autora nota que os governadores são “os campeões de normas que ampliavam as prerrogativas do funcionalismo público [...], sendo também comuns, em decorrência das constituições estaduais, questionamentos às promoções de servidores e à transformação de cargos públicos” (grifos nossos). Canello (2016CANELLO, Júlio. Judicializando a Federação? O Supremo Tribunal Federal e os atos normativos estaduais. 2016. Tese (doutorado em ciência política) - Instituto de Estudos Sociais e Políticos, Universidade do Estado do Rio de Janeiro.) também identifica esse fenômeno. Tendo em vista o escopo deste artigo, não desenvolveremos aqui essa discussão. Aqui apresentamos um levantamento que precede tal estudo, uma apreciação conjunta do constitucionalismo estadual brasileiro. Nosso objetivo é identificar suas principais características e o grau de semelhança dos textos entre si, bem como destes com o texto da CF, aferindo a direção da difusão constitucional - se mais vertical ou horizontal.

Por um lado, tal levantamento permitirá aferir não apenas o quanto os textos constitucionais estaduais derivam logicamente da Carta Federal, mas também o quanto eles o repetem literalmente - ou quase. Isso é importante porque, numa primeira apreciação, poder-se-ia considerar que não haveria muito o que o judiciário federal (o STF, no caso) precisasse decidir no sentido de conformar o direito constitucional subnacional ao nacional, pois a pura e simples repetição do texto - por imitação - já produziria efeitos normativos, sem necessidade da coerção judiciária. Embora isso seja verdadeiro, embute um problema de segunda ordem.

As constituições estaduais repetem normas da Constituição Federal não apenas por imitação, mas também por coerção. Há dois tipos de normas da Carta Federal emulados pelas estaduais: as “normas de imitação” e as “normas de reprodução” (Leoncy, 2007LEONCY, Léo Ferreira. Controle de constitucionalidade estadual: as normas de observância obrigatória e a defesa abstrata da Constituição do estado-membro. São Paulo: Saraiva, 2007.:118). Enquanto as primeiras são aquelas que o constituinte estadual voluntariamente copia do texto federal, as segundas são acatadas por serem “normas federais de absorção compulsória” (ministro Octávio Galloti, RCL 370, apud Leoncy, 2007LEONCY, Léo Ferreira. Controle de constitucionalidade estadual: as normas de observância obrigatória e a defesa abstrata da Constituição do estado-membro. São Paulo: Saraiva, 2007.:118). Tratando-se de “absorção compulsória”, o constituinte estadual não teria sobre elas poder decisório, cabendo-lhe apenas incorporar ao texto subnacional o que consta do nacional. A depender do montante e da importância das normas federais de absorção compulsória, tem-se uma medida do grau de centralização constitucional existente na federação e do quanto a difusão de normas constitucionais na federação brasileira se dá por meio de coerção.

Não é tarefa trivial, contudo, distinguir normas de absorção compulsória e de imitação. A CF não deixa isso claro e mesmo doutrinadores do direito são vagos na abordagem do tema (Leoncy, 2007LEONCY, Léo Ferreira. Controle de constitucionalidade estadual: as normas de observância obrigatória e a defesa abstrata da Constituição do estado-membro. São Paulo: Saraiva, 2007.; Ferraz, 2014FERRAZ, Anna Candida da Cunha. O sistema de defesa da constituição estadual: aspectos do controle de constitucionalidade perante Constituição do estado-membro no Brasil. Revista de Direito Administrativo, n. 246, p. 13-49, dez. 2014.; Horta, 1985HORTA, Raul Machado. Organização constitucional do federalismo. Revista de Informação Legislativa, v. 22, n. 87, p. 5-22, jul./set. 1985.). Nos termos de Ferraz (2014:17), “a reprodução das normas constitucionais de observância obrigatória na Constituição Estadual se impõe - embora não haja regra específica a respeito - porque, ainda que não transcritas, tais normas valem para todo o Estado”. E não havendo regra específica, a determinação do que são normas de reprodução obrigatória cabe ao Judiciário - notadamente, ao STF, que estipula (usualmente, caso a caso) o que deve ou não ser repetido pelas CEs. Portanto, a redação das Cartas estaduais, definindo o que seria ou não incorporado, resultou ou da mera emulação do texto constitucional federal, ou de decisões judiciais que paulatinamente construíram uma doutrina do que deveria ser a constituição total do país.

No caso da emulação, a própria dificuldade de o constituinte decorrente ter certeza sobre o que deve ou não ser repetido leva-o a tomar o texto federal como base para a redação da constituição estadual, num mecanismo de pura imitação em que o “argumento de autoridade” do constituinte federal prevalece sobre as pretensões e autonomia decisória dos constituintes estaduais. Em uma entrevista para esta pesquisa, o relator da Constituição do Estado de São Paulo, Roberto Purini, que afirmou desconhecer a distinção entre normas de imitação e absorção obrigatória, confirmou que o “ponto de partida” da constituição estadual foi a Carta Federal e que “mais de 90% é de absorção obrigatória”. Inclusive, a Assembleia Legislativa paulista, que elaboraria a carta, formou um “Grupo Pró-Constituinte”, para acompanhar os trabalhos no âmbito federal, de modo a poder depois aplicar em nível estadual o que fosse identificado ali (Entrevista, 21/3/2017, Bauru, SP).

Por fim, o caráter centralizado da federação brasileira não advém apenas de um modelo abstrato de constituição. Ele decorre de seguidas escolhas políticas, ao longo da história nacional, escoradas na percepção de que o Brasil é regionalmente desigual, cabendo ao governo central e suas instituições corrigirem tal assimetria. Assim, a centralização se torna instrumento para a coordenação e a cooperação entre níveis de governo, favorecendo estados desprivilegiados social, econômica, administrativa e politicamente, oferecendo-lhes uma base comum para enfrentar seus problemas. Numa federação com estados e municípios tão desiguais como a brasileira, a provisão dessa base comum pelo governo central resulta, paradoxalmente, antes de demandas de entes mais fracos do que de pura imposição do centro (Abrucio, 2005ABRUCIO, Fernando L. A coordenação federativa no Brasil: a experiência do período FHC e os desafios do governo Lula. Revista de Sociologia Política, n. 24, p. 41-67, jun. 2005.; Segatto e Abrucio, 2016SEGATTO, Catarina I.; ABRUCIO, Fernando L. A cooperação em uma federação heterogênea: o regime de colaboração na educação em seis estados brasileiros. Revista Brasileira de Educação, v. 21, n. 65, p. 411-429, abr./jun. 2016.). Porém, o caráter cooperativo do federalismo brasileiro funda-se na preponderância da União, cuja assistência financeira é primordial para que governos subnacionais possam implementar políticas, em especial na área social, como aponta Machado, indicando uma situação típica da difusão coercitiva por meio do financiamento de políticas:

Carentes de receitas públicas para aplicação em políticas sociais, aqueles governos [subnacionais] poderiam se tornar as próprias vítimas da paralisia decisória que poderia decorrer do uso de seu poder de veto como recurso estratégico para travar o desenvolvimento de programas federais. Nos dias atuais do federalismo brasileiro, estados e municípios parecem ganhar mais se comportando como coadjuvantes da União, buscando no máximo ajustes e emendas às suas iniciativas, e não propriamente sua anulação. [Machado, 2014MACHADO, José A. Federalismo, poder de veto e coordenação de políticas sociais no Brasil pós-1988. Organizações & Sociedade, v. 21, n. 69, p. 335-350, jun. 2014.:348; grifo nosso]

Quanto a esse ponto, porém, cabe distinguir: o centralismo brasileiro e a difusão coercitiva de normas e políticas se manifestam de duas formas distintas. Por um lado, estados (e mesmo municípios) replicam no plano regional e local formas institucionais federais definidas constitucionalmente (estruturação dos ramos de governo, da administração pública, do direito), reproduzindo em escala menor as mesmíssimas características do governo federal - o que Couto e Arantes (2008Couto, Cláudio Gonçalves; Arantes, Rogério Bastos. Constitution, government and democracy in Brazil. World Political Science Review, v. 4, n. 2, p. 1-33, 2008.) definem como polity. Por outro lado, tanto no âmbito constitucional como no infraconstitucional, estados e municípios replicam policy, desdobrando regional e localmente políticas públicas formuladas e legisladas no plano federal (Arretche, 2009ARRETCHE, Marta. Continuidades e descontinuidades da Federação Brasileira: de como 1988 facilitou 1995. Dados, Rio de Janeiro, v. 52, n. 2, p. 377-423, jun. 2009.), implementadas pelos entes subnacionais - ainda que com alguma variação (Lotta et al., 2014Lotta, Gabriela S.; GONÇALVES, Renata; BITELMAN, Marina. A coordenação federativa de políticas públicas: uma análise das políticas brasileiras nas últimas décadas. Cadernos Gestão Pública e Cidadania, v. 19, n. 64, p. 2-18, jan./jun.2014.; Soares e Cunha, 2016SOARES, Márcia M.; CUNHA, Edite P. Política de assistência social e coordenação federativa no Brasil. Revista do Serviço Público, v. 67, n. 1, p. 85-108, jan./mar.2016.). Pode-se assim falar tanto numa difusão de policy - no sentido que a literatura sobre difusão de políticas confere à ideia -, como na difusão de polity - no sentido de Couto e Arantes.

Poder-se-ia supor que no nível federal a definição dessas questões passaria pelo crivo estadual por ser discutida no Senado Federal, teoricamente uma “casa dos estados”. A suposição, contudo, não se sustenta, pois “o Senado é uma casa que opera em termos partidários” (Arretche, 2013ARRETCHE, Marta. Quando instituições federativas fortalecem o governo central? Novos Estudos Cebrap, n. 95, p. 39-57, 2013.:54), o que prevalece sobre a lógica estadual na revisão das decisões da Câmara dos Deputados, à qual o Senado se equivale na sustentação dos governos no contexto do presidencialismo de coalizão. Isso foi sobejamente demonstrado em estudos sobre o Senado Federal, como os de Ricci (2008RICCI, Paolo. A produção legislativa de iniciativa parlamentar no Congresso Brasileiro: diferenças e similaridades entre a Câmara dos Deputados e o Senado Federal. In: LEMOS, Leany B. (Org.). O Senado Federal brasileiro no pós-constituinte. Brasília: Senado Federal, Unilegis, 2008. p. 237-271.), Neiva (2011NEIVA, Pedro. Coesão e disciplina partidária no Senado Federal. Dados - Revista de Ciências Sociais, v. 54, n. 2, p. 289-318, 2011.) e Neiva e Soares (2013)NEIVA, Pedro; SOARES, Márcia. Senado brasileiro: casa federativa ou partidária? Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 28, n. 81, p. 97-115, fev. 2013..

Na próxima seção, apresentaremos a metodologia empregada. Na subsequente, procederemos à comparação, identificando em que medida os textos constitucionais estaduais replicam a Constituição Federal ou são parecidos entre si e observando o sentido da difusão das normas constitucionais - se mais vertical ou horizontal. Na última, apresentamos nossas conclusões.

3. AS CONSTITUIÇÕES ESTADUAIS BRASILEIRAS E A CARTA FEDERAL DE 1988

A análise desta seção resultou da coleta, sistematização e análise dos textos de 25 CEs brasileiras, acrescidas da Carta do Distrito Federal. A Constituição do Acre foi desconsiderada pela indisponibilidade do texto original durante a coleta dos dados. Os textos compilados são os originalmente publicados nos diários oficiais; os preâmbulos não foram considerados, pois não são propriamente normas.

Um primeiro problema, sempre que se analisam textos constitucionais, diz respeito à sua extensão, mensurável por diferentes métodos, cada um com suas peculiaridades. Há duas abordagens principais, uma textual, outra estrutural. Na primeira, as constituições são medidas de acordo com características válidas para qualquer tipo de texto (não especificamente constituições), tais como contagem de caracteres, número de linhas (Lorenz, 2005Lorenz, Astrid. How to measure constitutional rigidity: four concepts and two alternatives. Journal of Theoretical Politics, v. 17, n. 3, p. 339-361, 2005.), parágrafos (Anckar e Karvonen, 2002Anckar, Dag; Karvonen, Lauri. Constitutional amendment methods in the democracies of the world. In: NORDIC POLITICAL SCIENCE CONGRESS, 13., 2002. Proceedings… Aalborg: NOPSA, 2002. p. 1-33.), e a medida usualmente utilizada, número de palavras (Berkowitz e Clay, 2005BERKOWITZ, Daniel; CLAY, Karen. American civil law origins: implications for state constitutions. American Law and Economics Review, v. 7, p. 62-84, 2005.; Ginsburg, 2010GINSBURG, Tom. Constitutional specificity, unwritten understandings and constitutional agreement. Public Law and Legal Theory Working Paper, n. 330, nov. 2010.; Lutz, 1994Lutz, Donald S. Toward a theory of constitutional amendment. American Political Science Review, v. 88, n. 2, p. 355-370, jun. 1994.; Negretto, 2012NEGRETTO, Gabriel L. Replacing and amending constitutions: the logic of constitutional change in Latin America. Law and Society Review, n. 46, p. 749-79, 2012.; Tsebelis e Nardi, 2014; Voigt, 2009VOIGT, Stefan. Explaining constitutional garrulity. International Review of Law and Economics, v. 29, n. 4, p. 290-303, 2009.).

Já abordagens estruturais consideram o conteúdo e a organização lógica da constituição, entendida como um conjunto estruturado de normas jurídicas; contabilizam normas, não texto. As formas mais comuns são a mensuração do escopo (Elkins et al., 2009Elkins, Zachary; Ginsburg, Tom; Melton, James. The endurance of national constitutions. Cambridge: Cambridge University Press, 2009.), número de artigos (Montenegro, 1995MONTENEGRO, Alvaro A. Constitutional design and economic performance. Constitutional Political Economy, n. 6, p. 161-169, 1995.), ou dispositivos constitucionais (Arantes e Couto, 2009ARANTES, Rogério Bastos; COUTO, Cláudio Gonçalves. Uma constituição incomum. In: CARVALHO, Maria Alice Rezende de; ARAÚJO, Cícero; SIMÕES, Júlio Assis (Org.). A Constituição de 1988: passado e futuro. São Paulo: Anpocs, 2009. p. 17-51., 2012ARANTES, Rogério Bastos; COUTO, Cláudio Gonçalves. Constitutionalizing policy: the Brazilian Constitution of 1988 and its impact on governance. In: NOLTE, Detlef; SCHILLING-VACAFLOR, Almut (Ed.). New constitutionalism in Latin America: promises and practices. Farnham: Ashgate Publishing Limited, 2012. p. 203-222.; Couto e Arantes, 2003Couto, Cláudio Gonçalves; Arantes, Rogério Bastos. ¿Constitución o políticas públicas? Una evaluación de los años FHC. In: Palermo, Vicente. Política brasileña contemporánea: de Collor a Lula en años de transformación. Buenos Aires: Siglo Veintiuno Editores, 2003. p. 95-154., 2008Couto, Cláudio Gonçalves; Arantes, Rogério Bastos. Constitution, government and democracy in Brazil. World Political Science Review, v. 4, n. 2, p. 1-33, 2008.).

Por um lado, o número de palavras mensura bem objetivamente a variável tamanho, pois a medida é puramente textual e independe das preferências dos constituintes quanto a temas e agrupamentos normativos. Ademais, há problemas linguísticos, pois duas palavras quaisquer possuem o mesmo peso, independentemente da extensão ou significado. Apesar dessas limitações, pondere-se que o número de palavras é indicador bastante útil, mesmo quando se busca identificar questões politicamente substantivas, pois possibilita captar conteúdos da constituição indiretamente (Hammons, 1999HAMMONS, Christopher W. Was James Madison wrong? Rethinking the American preference for short, framework-oriented constitutions. The American Political Science Review, v. 93, n. 4, p. 837-849, dez. 1999.; Lutz, 1994Lutz, Donald S. Toward a theory of constitutional amendment. American Political Science Review, v. 88, n. 2, p. 355-370, jun. 1994.; Tsebelis e Nardi, 2016TSEBELIS, George; NARDI, Dominic J. A long constitution is a (positively) bad constitution: evidence from OECD countries. British Journal of Political Science, v. 46, n. 2, p. 457-478, abr. 2016.), constituindo-se numa proxy da quantidade de matérias abarcadas. Isto é, constituições extensas tendem a possuir mais matérias constitucionalizadas e mais provisões constitucionais.

Já a mensuração da quantidade de dispositivos contempla unidades que são normas jurídicas dotadas de sentido completo, substantivamente relevantes para uma análise política. Ademais, sendo o texto um conjunto de normas jurídicas que refletem escolhas políticas, dá-se um passo metodológico impossível pela mera contabilidade de palavras: identificar e classificar a quantidade e a natureza das matérias constitucionalizadas (Couto e Arantes, 2008Couto, Cláudio Gonçalves; Arantes, Rogério Bastos. Constitution, government and democracy in Brazil. World Political Science Review, v. 4, n. 2, p. 1-33, 2008.; Arantes e Couto, 2009ABRUCIO, Fernando L. A coordenação federativa no Brasil: a experiência do período FHC e os desafios do governo Lula. Revista de Sociologia Política, n. 24, p. 41-67, jun. 2005.).

Neste artigo, a abordagem textual mostrou-se não apenas suficiente, como útil para uma comparação entre textos constitucionais que identificasse a direção da difusão de normas constitucionais. O gráfico 1 e a tabela 1 resumem as estatísticas descritivas.

Gráfico 1
Extensão em dispositivos e palavras das constituições estaduais

Unidade Média Desvio-Padrão Coeficiente de Variação Máximo Mínimo Palavras 31.423,54 6.826,25 21,72% 44.301 14.251 Dispositivos 1.266,73 255,23 20,15% 1.663 610 Fonte: Elaborada pelos autores com base nas Constituições Estaduais da Base MAC.

Ambas as formas de medir a extensão de CEs obtêm resultados similares, algo esperado, pois não há variação linguística entre estados brasileiros ou legisladores constituintes. Ademais, encontramos relação quase perfeitamente linear entre as duas formas de contagem, explicitada no gráfico 2, com índices de correlação de Pearson de 0,976 e ρ de Spearman de 0,962.

Gráfico 2
Dispersão entre palavras e dispositivos

Dada a proximidade entre as medidas, não esperamos alterações significativas entre ambas para determinados tipos de análise. A ressalva é importante, pois, embora as medidas sejam estatisticamente próximas, qualitativamente são bem distintas. Portanto, a contagem de palavras mostra-se metodologicamente adequada para a comparação do tamanho de constituições, além de ser procedimento bem mais simples.

A leitura dos textos constitucionais permite identificar de pronto semelhança não só entre as constituições dos estados, mas também entre elas e a CF, especialmente na estrutura de títulos e capítulos. Tal proximidade é esperada devido à divisão de competências, ao princípio da simetria e porque as constituições estaduais foram escritas posteriormente à Constituição Federal e por determinação desta. Mais que proximidade, verificam-se repetições ipsis literis, seja de dispositivo da CF, seja de trechos de outras constituições estaduais.

Não há definição formal a priori que caracterize agrupamentos temáticos como Título, Capítulo ou Seção, havendo discricionariedade dos constituintes em sua determinação e nomenclatura. Embora assemelhada, a estrutura encontrada nas CEs impede comparações diretas dos agrupamentos maiores, que variam muito. Tal variação contempla temas, nomes e níveis distintos; o que numa constituição é seção, noutra pode ser título, ou vice-versa. Identificamos cerca de 150 Títulos, 400 Capítulos e 600 Seções singulares nas constituições.

Há casos, entretanto, de imensa semelhança. Por exemplo, quando comparamos os trechos das constituições que especificam o Processo Legislativo encontramos textos muito próximos não só em conteúdo, mas também na estrutura formal. A forma mais comum foi:

Art. A. - O processo legislativo compreende a elaboração de:

I - emendas à Constituição;

II - leis complementares;

III - leis ordinárias;

IV - leis delegadas;

V - decretos legislativos;

VI - resoluções.

Art. B - A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:

I - de um terço, no mínimo, dos membros da Assembleia Legislativa;

II - do Governador do Estado;

III - de mais [...] das Câmaras Municipais do Estado;

[...]

Embora a numeração dos artigos em questão mude, em todos os estados são sequenciais e mesmo a ordem dos incisos e parágrafos não difere muito. Além da similitude da ordem e da estrutura formal, a redação é semelhante. Mesmo quando não são idênticos, utilizam-se sinônimos ou mera inversão da ordem discursiva. O caput do art. A é idêntico nas 26 constituições levantadas, bem como seus três primeiros incisos. O art. B segue também o mesmo padrão, mas há poucos casos em que regras de aprovação de emenda constitucional diferem. É a mesma organização dos arts. 59 e 60 da CF, ocorrendo apenas a transposição de termos “federais” para “estaduais” (de presidente da República para governador), num claro caso de normas de absorção compulsória e, portanto, de difusão coercitiva.

Outro exemplo desse mimetismo é referente às normas constitucionais que estabelecem o número de vereadores. Na Constituição Federal, o art. 29 estipula que a quantidade de vereadores nas câmaras será proporcional à população do município. Comparemos as constituições de cinco estados: Alagoas, Amapá, Amazonas, Paraíba e Rio de Janeiro. Alagoas (art. 18) fez cópia perfeita do texto Federal; as Constituições do Amazonas (art. 122) e Rio de Janeiro (art. 346) estabeleceram que o número de vereadores seguirá a regra disposta pela Constituição Federal; já nas Constituições do Amapá (art. 27) e Paraíba (art. 10) identificamos inovações, isto é, normas que estabelecem regras distintas da disposta na Constituição Federal, mas semelhantes na lógica (número de vereadores proporcional ao número de habitantes). Ao observar emendas às constituições identificamos que em 1999 o Amapá alterou a regra disposta para uma ainda mais díspar da Federal e, em 2006, nova alteração revogou os textos anteriores, determinando que o número de vereadores seguiria o disposto na Constituição Federal. Em 2009 a Constituição Federal é que foi emendada, reagindo a decisão do STF sobre o assunto; e, se originalmente havia apenas três faixas populacionais a determinar o número de vereadores, passou-se então a contar com 24. Finalmente, em 2012 o Rio de Janeiro emendou sua Carta, copiando literalmente o novo texto federal.

Identificamos então cinco comportamentos distintos. A Constituição de Alagoas começou com regra idêntica à Federal, mas após emendamento desta não realizou qualquer alteração. No Amazonas a Carta apenas determinava seguir o disposto na Federal, enquanto no Rio de Janeiro, originalmente semelhante ao Amazonas, uma emenda copiou literalmente a nova redação federal, determinada pela mudança de 2009. No caso dos inovadores, Amapá e Paraíba, o primeiro, após outra tentativa de inovação, limitou-se a seguir o disposto na Constituição Federal, enquanto o segundo não teve qualquer alteração constitucional quanto a isso, permanecendo em desacordo com o texto federal - tornando-o assim letra morta.

Essa variabilidade estadual também se reflete da forma como as divisões são definidas discricionariamente em cada estado, sem que o regime jurídico mude. Por isso, foi necessário reduzir a diversidade de sumários constitucionais a um modelo-padrão comparável, eliminando peculiaridades de redação que ocultam similitudes. Para tal, renomeamos e reagrupamos os artigos das CEs, com o cuidado de verificar a equivalência de conteúdos. O resultado foi a organização de todos os textos constitucionais na seguinte base padronizada de Títulos:

  1. Dos Princípios, Direitos e Garantias Fundamentais.

  2. Do Estado.

  3. Da Organização dos Poderes.

  4. Da Segurança Pública.

  5. Da Tributação e Orçamento.

  6. Da Ordem Econômica.

  7. Da Ordem Social.

  8. Disposições Constitucionais Gerais.

  9. Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

A classificação completa foi em Títulos, Capítulos e Seções; entretanto, como Títulos são mais abrangentes e em menor número, concentramos a análise nesse nível de agrupamento. Para comparar as cartas estaduais e a CF, utilizamos o mesmo critério para recodificá-la.

Dada a diversidade de agrupamentos nas CEs, a recodificação não utilizou uma única constituição como modelo. Também não deduzimos da Constituição Federal o modelo, não só por termos a comparação entre CEs como foco, mas porque ao deduzir da CF enviesaríamos a comparação, pois aquelas seriam encaixadas no modelo pronto da CF. E como cotejaremos as difusões vertical e horizontal de normas constitucionais, tal viés seria indesejável. Assim, indutivamente agregamos artigos e temas presentes nas CEs em agrupamentos equivalentes.

Listamos todos os agrupamentos presentes nas CEs e identificamos nomenclaturas comuns em cada nível, eliminando diferenças de escrita (tempos verbais, ordem direta ou inversa, singular e plural, sinônimos) por uma nomenclatura comum; isolamos os agrupamentos, as subseções e os Títulos de fato distintos e os mais frequentes. Com tal divisão produzimos um modelo de agrupamentos e suas divisões mais frequentes nas CEs de um lado, e agrupamentos únicos ou pouco usuais de outro, organizando um modelo geral com nove títulos, 25 capítulos e 35 seções.

Aplicando a padronização à Constituição Federal, notamos a equivalência do modelo induzido das CEs e a divisão por Títulos na CF original. Isto é, dos 10 Títulos da CF, nove foram equivalentes aos padronizados. As diferenças foram duas: (1) de agregação, pois no caso estadual “Princípios, Direitos e Garantias Fundamentais” ficaram sob Título único; (2) de nomenclatura, pois enquanto a CF conta com o Título “Da Defesa do Estado e das Instituições Democráticas”, na padronização estadual ficou “Da Segurança Pública”, que é um capítulo do referido Título na CF. Assim, o próprio processo de padronização forneceu mais indícios de semelhanças entre as cartas estaduais e a federal, indicando que inclusive no atinente à estrutura formal o constitucionalismo estadual brasileiro emula o federal, com pequenas variações.

4. MENSURAÇÃO DAS SEMELHANÇAS

Para avaliar o grau de semelhança entre os textos constitucionais neste artigo, adotamos apenas a abordagem textual de classificação, que deixa de lado um estudo qualitativo mais detalhado, bem como a identificação de remissões à Constituição Federal, tal como feito noutros trabalhos (Couto e Arantes, 2003Couto, Cláudio Gonçalves; Arantes, Rogério Bastos. ¿Constitución o políticas públicas? Una evaluación de los años FHC. In: Palermo, Vicente. Política brasileña contemporánea: de Collor a Lula en años de transformación. Buenos Aires: Siglo Veintiuno Editores, 2003. p. 95-154., 2008Couto, Cláudio Gonçalves; Arantes, Rogério Bastos. Constitution, government and democracy in Brazil. World Political Science Review, v. 4, n. 2, p. 1-33, 2008.; Arantes e Couto, 2009ARANTES, Rogério Bastos; COUTO, Cláudio Gonçalves. Uma constituição incomum. In: CARVALHO, Maria Alice Rezende de; ARAÚJO, Cícero; SIMÕES, Júlio Assis (Org.). A Constituição de 1988: passado e futuro. São Paulo: Anpocs, 2009. p. 17-51., 2012ARANTES, Rogério Bastos; COUTO, Cláudio Gonçalves. Constitutionalizing policy: the Brazilian Constitution of 1988 and its impact on governance. In: NOLTE, Detlef; SCHILLING-VACAFLOR, Almut (Ed.). New constitutionalism in Latin America: promises and practices. Farnham: Ashgate Publishing Limited, 2012. p. 203-222.). Para realizá-la, cotejando textos constitucionais, lançamos mão de um software de análise textual, o WCopyFind, software aberto desenvolvido para identificar plágios, mas com aplicação expandida devido à sua versatilidade.

O programa coteja pares de documentos, comparando trechos do texto. São três os parâmetros relevantes de comparação, definidos pelo usuário: (1) número máximo de palavras de um trecho, (2) proporção mínima de palavras iguais num trecho e (3) tamanho máximo de sequências de palavras diferentes aceitável num trecho (aqui denominadas imperfeições). Definido o tamanho máximo dos trechos a serem comparados, dois deles serão considerados iguais se contiverem uma proporção mínima de palavras idênticas e um número máximo de palavras não coincidentes em sequência. Veja-se o seguinte exemplo, cujas frases foram consideradas equivalentes pelo programa:

  1. Perderá o mandato o Deputado ou Senador que infringir qualquer das proibições estabelecidas no artigo anterior.

  2. Perderá o mandato o Deputado Estadual que infringir qualquer das proibições estabelecidas no artigo anterior.

O primeiro trecho pertence à CF; o segundo é da Constituição de Alagoas. O primeiro possui 16 palavras, o segundo, 15. Mesmo com uma diferença de duas palavras nas frases, o software - definidos os parâmetros - identifica essas sentenças como equivalentes. Faz sentido, pois ambos os dispositivos tratam do mesmo assunto, tendo um deles apenas sido adaptado ao contexto estadual pela mudança de dois termos.

Ao reproduzir esse algoritmo para a totalidade dos documentos, o software identifica a quantidade de palavras encontradas em sentenças que identificou como equivalentes por haver apenas pequenas variações. Nas constituições estudadas analisamos 351 pares de documentos, cotejando cada constituição com outras 26 (25 estaduais mais a Federal), obtendo um indicador da semelhança entre os textos comparados dois a dois. Ressalte-se que o sentido da comparação faz diferença. Isto é, a semelhança da constituição X com a constituição Y é distinta da semelhança entre a constituição Y com a constituição X, devido à assimetria gerada pelo sentido da comparação, de modo que os 351 pares resultam em 702 observações de análise pareada dos textos. As razões para isso são duas.

A primeira são os indicadores utilizados para mensurar a similitude. Utilizamos dois: (i) a contagem absoluta de palavras em trechos equivalentes e (ii) a proporção dos trechos equivalentes mensurados em palavras no texto. Para a contagem absoluta, computamos o número absoluto de palavras em expressões equivalentes em cada carta, de modo que, no exemplo anterior, teríamos um trecho equivalente de 16 palavras na primeira constituição e de 15 na segunda. Já no cômputo da proporção, como duas constituições não têm tamanho igual, a mesma frase terá pesos distintos em cada uma delas.

A segunda razão decorre da contagem das imperfeições. No exemplo anterior, como observado, a primeira sentença tem 16 palavras, mas sua equivalente possui 15; se contarmos as sentenças inteiras (incluindo os termos não coincidentes - as imperfeições), esses dois valores diferentes serão computados. Porém, se excluirmos as imperfeições nas sentenças (duas na primeira, uma na segunda), teremos trechos equivalentes com 14 palavras cada - isto é, encontraremos sempre valores iguais para trechos equivalentes nos textos comparados.

A tabela 2apresenta os níveis de equivalência entre as constituições quando controlamos por nível federativo. É possível identificar duas variáveis, separadas em três categorias. As variáveis são a equivalência absoluta, e a equivalência relativa. Enquanto a primeira identifica a quantidade de palavras encontradas em sentenças semelhantes, a segunda consiste na proporção dessa quantidade relativamente à extensão do texto constitucional em questão.

Tabela 2
Equivalências entre textos constitucionais

A primeira coluna traz a comparação entre as 26 CEs, perfazendo 650 observações; a segunda e a terceira trazem a comparação (em dois sentidos opostos) das CEs com a da União, cada uma delas com 26 observações. Se União × estados apresenta equivalência de 24,66%, isso significa que, em média, 24,66% de trechos que compõem o texto federal são encontrados em passagens equivalentes nas CEs. Do outro lado temos que em média as CEs possuem 34,81% de suas palavras contidas na CF. Essa diferença ocorre porque a equivalência é proporcional ao tamanho do texto de destino. Dito doutra forma, a área de intersecção entre a CF e as cartas estaduais ocupa porção maior destas últimas do que da primeira.

Outro ponto - central aqui - é que, no geral, as CEs apresentaram menor semelhança quando comparadas entre si do que quando cotejadas com a Constituição Federal, indicando que as cartas estaduais mimetizam bastante a Federal (embora não o façam igualmente) sem, todavia, emularem umas às outras. Essa menor semelhança horizontal do que vertical ocorre tanto em termos relativos como absolutos (gráfico 3).

Gráfico 3
Equivalência média entre níveis federativos

Ao contrário da equivalência absoluta, a equivalência relativa difere consideravelmente no sentido da comparação, devido à disparidade de tamanho entre os textos comparados. Por exemplo, as constituições fluminense e potiguar se equiparam em número absoluto de palavras equivalentes quando comparadas à CF (14.554 e 13.909, respectivamente), porém, devido à extensão significativamente maior da Carta do Rio de Janeiro, tais palavras representam fração menor de seu texto: 32,85%, contra 58,74% para o RN.

Para melhor identificar e classificar a semelhança entre os textos constitucionais, também consideramos os temas. Em virtude da padronização das constituições, foi possível identificar e descrever como as semelhanças se distribuem entre diferentes assuntos.

Gráfico 4
Equivalência entre níveis federativos por título

Quando comparamos os textos por Títulos, identificamos que a equivalência não se distribui de maneira uniforme. Do gráfico 4 vemos que o “Título 1 - Dos Direitos e Garantias Fundamentais” e o “Titulo 4 - Da Segurança Pública” são aqueles em que há menor similitude entre as constituições estaduais e a Federal. Isto é esperado, pois o Título 4 da CF trata da Defesa do Estado, que no caso das CEs se resume apenas à Segurança Pública. Similarmente, a diferença no Título 1 também é esperada, pois este versa sobre questões mais básicas do direito dos cidadãos, que não pertencem às competências estaduais. Ou seja, nesses temas, diferentes competências de distintos níveis de governo pesaram para o contraste.

É no “Título 5 - Da Tributação e Orçamento” que os estados, em média, apresentam maior semelhança com a CF, seguido pelo “Títulos 3 - Da Organização do Governo”, e pelo “Título 2 - Do Estado”. Essa proximidade entre os Títulos destacados indica que as CEs emulam a Federal nesses temas, notadamente na questão dos Tributos e Orçamento, em que a União não deixa espaço à auto-organização dos estados. Há, porém, alguma variação, tanto que neste título a maior semelhança, da Constituição do Piauí, traz equivalência de 83,84% (2.641 palavras), enquanto a menor, de Roraima, tem equivalência de 37,29% (279 palavras).

Restringindo-se a comparação às constituições estaduais, o resultado é parecido: os Títulos com maior equivalência média são 5, 3 e 2 (Tributação e Orçamento, Organização dos Poderes e Do Estado). Contudo, a similaridade é menor do que quando cada constituição estadual é pareada com a Federal e o padrão de equivalência não é constante: alguns temas são tratados igualmente, enquanto noutros não há proximidade. Ou seja, embora as CEs emulem a Federal, não o fazem da mesma forma; a diversidade constitucional estadual reside na diferença de como se imita a Carta Federal.

Há também considerável semelhança horizontal entre os Títulos 2 e 3, revelando algo recorrente nas constituições estaduais: organizar os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário estaduais, bem como os de seus municípios de forma similar. Enquanto a organização dos poderes estaduais consta do Título 3, a municipal está no Título 2. Para ilustrar a questão temos as seguintes sentenças. A primeira extraída do Título 3 da Constituição do Pará e a segunda do Título 2 da Constituição do Mato Grosso:

Perderá o mandato o Governador que assumir outro cargo [...] observado o disposto no Art. 38, I, IV e V, da Constituição Federal.

Perderá o mandato o Prefeito que assumir outro cargo [...] observado o disposto no Art. 38, I, IV, e V, da Constituição Federal.

Em todos os temas o grau de semelhança das CEs sempre foi maior com a CF do que entre elas, com a única exceção do Título 4 (Da Segurança Pública), em que há igualdade - o que fica claro ao se comparar a primeira e a segunda barras de cada um dos títulos no gráfico 4. Contudo, se a difusão de normas constitucionais é mais forte vertical do que horizontalmente - e no sentido top-down -, a maneira como a emulação vertical ocorre varia horizontalmente, como indicado no gráfico pelo tamanho menor das terceiras colunas de todos os títulos, se comparadas às segundas. Reiterando, constituições estaduais copiam a Federal desigualmente.

Por fim, testamos a hipótese de que o fator regional produziria semelhança entre as constituições, devido à proximidade sociocultural e em consonância com a literatura sobre constitucionalismo estadual (Kincaid, 1988KINCAID, John. State constitutions in the federal system. Annals of the American Academy of Political and Social Science, v. 496, p. 12-22, mar. 1988.; Williams e Tarr, 2004WILLIAMS, Robert F.; TARR, G. Alan. Subnational constitutional space: a view from the states, provinces, regions, länder, and cantons. In: TARR, G. Alan; WILLIAMS, Robert F.; MARKO, Josef (Ed.). Federalism, subnational constitutions, and minority rights. Westport: Praeger Publishers, 2004. p. 3-24.) e difusão de políticas em federações (Daley e Garand, 2005DALEY, Dorothy M.; GARAND, James C. Horizontal diffusion, vertical diffusion, and internal pressure in state environmental policymaking, 1989-1998. American Politics Research, v. 33, n. 5, p. 615-644, set. 2005.; Berry e Berry, 1999BERRY, Frances Stokes; BERRY, William D. Innovation and diffusion models in policy research. In: SABATIER, Paul A. (Ed.). Theories of the policy process. Boulder: Westview Press, 1999. p. 169-200.), que convergem quanto a esse ponto, esperando similaridades dentro de regiões relativamente homogêneas. Efetuamos três comparações: intrarregionais, inter-regionais e regionais-federal. Verificamos que no caso brasileiro o pertencimento regional é irrelevante para a semelhança entre textos constitucionais intrarregionalmente, inter-regionalmente ou relativamente à Constituição Federal. Observe-se no gráfico 5 que todas as regiões se assemelham mais à União do que entre si ou internamente. Replicada a análise separadamente por títulos, o resultado é idêntico. Por sugestão de um parecerista, comparamos os estados possivelmente mais importantes (cinco mais ricos e cinco mais populosos) com o resto. Embora ligeiramente menos similares à União que os demais, a diferença não foi tão expressiva: equivalência absoluta com a União de 9.880 palavras entre os mais importantes contra 10.654 do conjunto (relativa 29,7% × 34,8%). A diferença relativa maior que a absoluta indica que esses estados têm, em média, constituições mais extensas. Esses achados ratificam as demais observações da pesquisa, confirmando que o Brasil é uma federação em que a difusão de normas ocorre mais verticalmente do que horizontalmente, top-down, a despeito inclusive de eventuais características regionais comuns dos estados-membros.

Gráfico 5
Equivalência média regionalmente

5. CONCLUSÃO

As atuais constituições estaduais brasileiras se parecem mais com a Constituição Federal do que entre si, demonstrando que a diversidade constitucional do federalismo brasileiro advém mais de diferenças entre estados do que deles com relação ao governo federal. Isso indica o sentido vertical descendente de difusão das normas constitucionais no federalismo brasileiro, ratificando o centralismo normativo de nossa federação; num sistema mais horizontal, esperar-se-ia uma difusão horizontal de normas constitucionais estaduais por imitação, aprendizado ou competição (Shipan e Volden, 2008SHIPAN, Charles R.; VOLDEN, Craig. The mechanisms of policy diffusion. American Journal of Political Science, v. 52, n. 4, p. 840-857, out. 2008.). Nos termos de Tarr e Porter (1987TARR, G. Alan; PORTER, Mary C. State constitutionalism and state constitutional law. Publius, v. 17, n. 1, p. 1-12, 1987.:9), “o federalismo horizontal se refere ao processo de interação e emulação entre os estados, de modo que as políticas desenvolvidas em um estado afetam o desenvolvimento das políticas em outros estados”. Num sistema mais horizontal, a própria equivalência de competências dos entes subnacionais ensejaria maior convergência entre os estados do que deles com a União.

Decerto, a confecção simultânea das CEs, no prazo de um ano após a promulgação da CF, por sua determinação expressa e devendo seguir seus princípios, fez com que o modelo comum de referência tenha mesmo sido a Carta federal, e não as cartas dos demais estados, tornando a emulação horizontal não só difícil como improvável - mesmo porque a difusão por aprendizado tende a ocorrer com o tempo (Shipan e Volden, 2008SHIPAN, Charles R.; VOLDEN, Craig. The mechanisms of policy diffusion. American Journal of Political Science, v. 52, n. 4, p. 840-857, out. 2008.:851-852; Mitchell e Stewart, 2014MITCHELL, Joshua L.; STEWART, La Shonda M. Emulation, learning, or competition? Examining inter-county anti-smoking laws in the state of Missouri. Public Administration Quarterly, v. 38, n. 3, p. 317-346, outono2014.). É possível, entretanto, que o subsequente processo de emendamento estadual possa produzir alguma emulação horizontal - hipótese a ser aferida noutra etapa desta pesquisa. Outra hipótese a ser testada (e com sentido oposto) é se, mediante a adjudicação das CEs pelo STF, padroniza-se verticalmente o que inicialmente foi, em algum grau, diverso horizontalmente, como sugerido por Canello (2016CANELLO, Júlio. Judicializando a Federação? O Supremo Tribunal Federal e os atos normativos estaduais. 2016. Tese (doutorado em ciência política) - Instituto de Estudos Sociais e Políticos, Universidade do Estado do Rio de Janeiro.) ao analisar a atuação do procurador-geral da República no controle de constitucionalidade de normas estaduais.

Não cabe, porém, dissociar o timing de elaboração das CEs brasileiras do modelo federativo constitucional do país, bastante centralizado e verticalizado, indutor ele mesmo da difusão coercitiva de normas constitucionais e legais. Nele não se esperaria algo distinto da elaboração de uma Carta federal que, além de anteceder temporalmente as CEs, também as precedesse jurídica e politicamente. Tal modelo opõe-se não apenas ao do federalismo horizontal norte-americano - em que as constituições estaduais antecederam historicamente a elaboração da federal e, mesmo depois refeitas, preservaram características próprias. Mesmo no caso alemão, de um federalismo vertical, houve maior espaço para a inovação constitucional dos governos estaduais. Ao menos duas das ondas do constitucionalismo estadual germânico ocorreram após grandes rupturas: a primeira, após a Segunda Guerra Mundial; a terceira, após a queda do Muro de Berlim. Em ambas as cartas estaduais rompiam com o passado, enquanto as brasileiras representaram a implantação em nível regional do que foi centralmente estipulado. Lorenz e Reutter (2012LORENZ, Astrid; REUTTER, Werner. Subconstitutionalism in a multilayered system: a comparative analysis of constitutional politics in the German Länder. Perspectives on Federalism, v. 4, n. 2, p. 148-169, 2012.:155) apontam que as cartas estaduais alemãs estimulam a inovação da política constitucional nacional, introduzindo uma dinâmica bottom-up no constitucionalismo federal - como laboratórios de inovação constitucional, propiciando uma difusão em sentido oposto àquele verificado no Brasil. Embora o modelo brasileiro se aproxime mais do alemão que do americano, é bem mais centralizado do que aquele, considerando não apenas o timing do constitution-making, mas o arranjo constitucional-federativo, em que as cartas estaduais tiveram que absorver compulsoriamente muitas de suas provisões - caracterizando uma difusão de normas por meio de coerção, mais efetiva na difusão vertical e top-down, como mostram Shipan e Volden (2008SHIPAN, Charles R.; VOLDEN, Craig. The mechanisms of policy diffusion. American Journal of Political Science, v. 52, n. 4, p. 840-857, out. 2008.:853).

Tal modelo se reflete não só na inibição de iniciativas particulares dos estados no campo legislativo, mediante decisões do STF. Revela-se já na elaboração das CEs, pelo pouco espaço deixado aos estados para um constitucionalismo próprio, distinto do definido nacionalmente. Não é, como no caso americano, um constitucionalismo estadual complementar ao ordenamento constitucional da União, compondo uma constituição total, nem, como no caso alemão, um espaço para inovação e emulação recíproca. Uma das poucas (e parciais) exceções a isso é o Rio Grande do Sul, de tradição autonomista (Oliven, 1989OLIVEN, Ruben G. O Rio Grande do Sul e o Brasil: uma relação controvertida. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 3, n. 9, p. 5-14, 1989.), cuja Carta assemelha-se à Constituição Federal menos até do que a do Distrito Federal - ente peculiar por seu próprio lugar na federação, um híbrido de estado e município, além de capital do país.

O considerável centralismo do modelo constitucional brasileiro precede política e juridicamente tendência análoga noutros âmbitos - mesmo porque, regulados por normas constitucionais, como notado por Arretche (2009ARRETCHE, Marta. Continuidades e descontinuidades da Federação Brasileira: de como 1988 facilitou 1995. Dados, Rio de Janeiro, v. 52, n. 2, p. 377-423, jun. 2009.), que identifica já no texto original da Constituição de 1988 as condições normativas que ditarão a centralização iniciada nos anos 1990: políticas sociais definidas centralmente; normas fiscais e tributárias estipuladas pela União, determinando obrigações de estados e municípios; restrições (ainda que, por anos, ineficazes) à competição tributária entre estados (a “guerra fiscal”); e incapacidade legislativa autônoma das unidades subnacionais em variados campos. Por isso, contrastando com a posição de Cavalcante (2011CAVALCANTE, Pedro. Descentralização de políticas públicas sob a ótica neoinstitucional: uma revisão de literatura. Rev. Adm. Pública, v. 45, n. 6, p. 1781-1804, dez. 2011.), para quem os isomorfismos mimético e normativo são os que melhor descrevem casos de descentralização na América Latina, consideramos que no caso brasileiro, ao menos no que concerne à difusão constitucional na federação, é o isomorfismo coercitivo o que melhor explica o processo: o ente hierarquicamente superior (a União) determinou restritivamente o conteúdo das constituições dos entes subnacionais.

Ressalve-se, algum espaço de expressão da autonomia estadual ocorre no nível infraconstitucional; nem tanto em inovações legislativas de maior alcance, mas sobretudo na formulação e implementação estadual de políticas cujas grandes diretrizes são estipuladas centralmente (Arretche, 2009ARRETCHE, Marta. Continuidades e descontinuidades da Federação Brasileira: de como 1988 facilitou 1995. Dados, Rio de Janeiro, v. 52, n. 2, p. 377-423, jun. 2009., 2012ARRETCHE, Marta. Democracia, federalismo e centralização no Brasil. Rio de Janeiro: FGV Editora; Fiocruz; São Paulo: Centro de Estudos da Metrópole, 2012., 2013ARRETCHE, Marta. Quando instituições federativas fortalecem o governo central? Novos Estudos Cebrap, n. 95, p. 39-57, 2013.; Lotta et al., 2014Lotta, Gabriela S.; GONÇALVES, Renata; BITELMAN, Marina. A coordenação federativa de políticas públicas: uma análise das políticas brasileiras nas últimas décadas. Cadernos Gestão Pública e Cidadania, v. 19, n. 64, p. 2-18, jan./jun.2014.). Essa autonomia se evidencia nos resultados diversos que políticas aplicadas pelos estados obtêm em campos como saúde e educação, para além dos efeitos de desigualdades de desenvolvimento e riqueza estaduais. Ou seja, a opção dos governantes estaduais por alternativas variadas na implementação das políticas públicas produz alguma diversidade não só de ações, mas de resultados.

Qualquer discussão sobre as características do federalismo brasileiro e sobre a difusão de políticas e instituições deve considerar este aspecto pouco observado do ordenamento institucional: a emulação normativa mediante coerção constitucional. Maior atenção a esse aspecto proporcionará avanços analíticos às investigações não apenas acerca do constitucionalismo, do federalismo e das relações intergovernamentais, mas especialmente da difusão federal de normas e políticas públicas. É importante atentar para essas duas dimensões em conjunto, pois as normas legais e constitucionais difundidas serão a base sobre a qual se erigirão nos estados muitas políticas públicas criadas localmente. Por isso, ao determinar uma difusão coercitiva de normas constitucionais idênticas às suas nos estados (mais do que apenas normas coerentes com seus preceitos), a carta de 1988 amarra de antemão os desígnios dos estados-membros aos da União, reduzindo significativamente o espaço para a autonomia regional e local e, portanto, para um efetivo autogoverno.

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  • 1
    Identificamos três programas centrais nos estudos brasileiros de difusão. São eles: Orçamento Participativo (OP), Programa Bolsa Escola (PBE) e Programa Saúde da Família (PSF).
  • 2
    CF, ADCT: “Art. 11. Cada Assembleia Legislativa, com poderes constituintes, elaborará a Constituição do Estado, no prazo de um ano, contado da promulgação da Constituição Federal, obedecidos os princípios desta. Parágrafo único. Promulgada a Constituição do Estado, caberá à Câmara Municipal, no prazo de seis meses, votar a Lei Orgânica respectiva, [...] respeitado o disposto na Constituição Federal e na Constituição Estadual”.
  • 3
    Tarr (1998:730) é um dos raros casos da literatura sobre constitucionalismo subnacional que faz referência direta aos estudos sobre difusão para a compreensão do fenômeno da emulação constitucional, e apenas de passagem.
  • 4
    Existem também “normas de extensão proibida”, que a Constituição Estadual não pode copiar da Constituição Federal (Leoncy, 2007:132) por abarcarem a jurisdição exclusiva da União.
  • 5
    Decisão do STF na ADI no 2.076 estabeleceu que o preâmbulo de uma constituição “não contém norma jurídica”, pois “não se situa no âmbito do Direito, mas no domínio da política, refletindo posição ideológica do constituinte”. Nessa ADI, o Partido Social Liberal (PSL) arguiu que a menção à “proteção de Deus” no preâmbulo da CF-1988 era “ato normativo de supremo princípio básico com conteúdo programático e de absorção compulsória pelos Estados”.
  • 6
    Base de textos constitucionais organizada com apoio na Metodologia de Análise Constitucional (MAC) de Cláudio Gonçalves Couto e Rogério Bastos Arantes.
  • 7
    Os Níveis Exatos de Significância são de 5,8 x 10-18 e 1,53 x 10-15 para Correlação de Pearson e Spearman, respectivamente..
  • 8
    Por exemplo, a Constituição do Ceará contém o “Título VIII — Das Responsabilidades Culturais, Sociais e Econômicas”, este contém, além de outros, o “Capítulo X — Da Política Urbana” e “Capítulo XI — Da Política Agrícola e Fundiária”. Na Constituição do Tocantins encontramos o seguinte “Título XII — Da Política Agrícola, Fundiária e da Reforma Agrária”.
  • 9
    Por exemplo, não há diferença entre “Da Tributação e do Orçamento” e “Dos Tributos e dos Orçamentos”.
  • 10
    O software se encontra disponível no seguinte endereço eletrônico: <http://plagiarism.bloomfieldmedia.com/wordpress/software/wcopyfind/>. Acesso em: 20 jul. 2016.
  • 11
    Neste caso, o parâmetro (3) foi de duas palavras.
  • 12
    As análises intrarregionais são menos precisas que as inter-regionais em função da quantidade reduzida de observações.
  • 13
    Segundo Arretche (2009:404), “já em 1988, a União estava autorizada a legislar sobre todas as políticas estratégicas, mesmo que estas fossem implementadas pelos governos subnacionais”. Os itálicos são da própria autora.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar-Apr 2018

Histórico

  • Recebido
    30 Mar 2017
  • Aceito
    15 Mar 2018
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