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Avaliação da expressão da proteína bcl-2 no carcinoma de mama: estudo em punção aspirativa por agulha fina; correlação com grau histológico em espécimes cirúrgicos correspondentes

Bcl-2 protein expression evaluation in breast cancer: study on fine needle aspirates; correlation with histologic grade in corresponding surgical material

Resumos

INTRODUÇÃO: O gene bcl-2 codifica uma proteína envolvida no processo de controle da apoptose. Inicialmente descrito em linfomas e posteriormente em tecidos epiteliais, sua expressão é freqüentemente encontrada em carcinomas de mama, associada a fatores de prognóstico favorável. Como a punção aspirativa por agulha fina (PAAF) tem sido utilizada como um método confiável na investigação de carcinomas de mama, acessamos a expressão de bcl-2 em material assim obtido e correlacionamos sua positividade com o grau histológico, avaliado em material cirúrgico correspondente, das respectivas pacientes, seguindo a classificação de SBR (Scarff, Bloom e Richardson). OBJETIVOS: Avaliar a expressão de bcl-2 em PAAF e correlacionar com grau histológico. METODOLOGIA: A positividade do bcl-2 foi analisada, por imunocitoquímica, em 118 casos consecutivos de PAAF e correlacionada com grau histológico em material cirúrgico correspondente, segundo classificação de SBR. RESULTADOS: A positividade para bcl-2 foi encontrada em 77 de 118 casos de PAAF (65,25%) e foi inversamente proporcional ao grau histológico (84,37%, p = 0,0022). CONCLUSÃO: A expressão de bcl-2 em PAAF correlaciona-se com fator de bom prognóstico. O índice de positividade encontrado, assim como a correlação inversa com grau histológico, está de acordo com dados publicados previamente. O fácil e rápido manejo do material obtido por PAAF permite a aplicação de técnicas complementares, de maneira confiável, como demonstra este estudo. A positividade do bcl-2 correlacionada com baixo grau histológico, assim como com outros fatores de bom prognóstico, pode, no futuro, proporcionar informação preditiva e prognóstica para pacientes candidatas a tratamento quimioterápico neo-adjuvante.

Mama; Carcinoma; Biópsia por agulha fina; bcl-2; Imunocitoquímica; Prognóstico


INTRODUCTION: The bcl-2 gene encodes a protein that is involved in cell death regulation. Initially described in lymphomas, and later in epithelial tissues, its expression is often found in breast cancer, in association with favorable prognostic factors. Because fine-needle aspiration (FNA) biopsy has been established as a reliable method for the diagnosis and biologic characterization of breast cancer, we assessed bcl-2 expression on FNAs from primary breast cancer and evaluated its correlation with the corresponding histologic grade, scored on the subsequent surgical specimen, following the Scarff, Bloom and Richardson method (SBR). OBJECTIVES: To evaluate the bcl-2 protein expression on FNAs and correlate it with histologic grade on paraffin embedded material. METHODS: Bcl-2 expression was evaluated retrospectively by immunocytochemistry on 118 consecutive FNAs from patients with primary breast cancer. Histologic grade was assessed according to the SBR classification, on surgical specimen material from the same patients that underwent surgical resection of the lesion. A correlation was established. RESULTS: Bcl-2 was expressed in 77 of 118 FNAs (65.25%) and was correlated with histologic grade (p = 0,0022). CONCLUSIONS: Bcl-2 expression, evaluated by immunocytochemistry on FNAs from primary breast carcinoma, correlates with favorable prognostic factor. The positivity rate, as well as the inverse histologic grade correlation, is in agreement with previous published data. As FNA biopsy is used increasingly as a primary tool in the diagnosis of breast carcinoma, bcl-2 evaluation by immunocytochemistry on FNA may provide, in a near future, in addition to other biologic variables, useful information for prognostic and predictive purposes, particularly in patients considered as candidates for neo-adjuvant treatment.

Breast; Carcinoma; Fine needle aspiration; bcl-2; Immunocytochemistry; Prognosis


ARTIGO ORIGINAL 0RIGINAL PAPER

Avaliação da expressão da proteína bcl-2 no carcinoma de mama: estudo em punção aspirativa por agulha fina; correlação com grau histológico em espécimes cirúrgicos correspondentes

Bcl-2 protein expression evaluation in breast cancer: study on fine needle aspirates; correlation with histologic grade in corresponding surgical material

Daniela Rudgeri DerossiI; Kasuhiro ItoII; José D'Oliveira Couto FilhoIII; Carlos Eduardo BacchiIV

IMestra e professora assistente do Departamento de Patologia Aplicada e Deontologia da Universidade Estadual de Londrina; médica patologista do Instituto de Câncer de Londrina (ICL), Londrina-PR

IIProfessor adjunto do Departamento de Patologia Aplicada e Deontologia da Universidade Estadual de Londrina; médico patologista do ICL

IIIDoutor; professor adjunto do Departamento de Medicina Interna e Cirurgia da Universidade Estadual de Londrina; médico oncomastologista do ICL

IVLivre-docente; professor adjunto da Universidade Estadual de São Paulo; médico patologista; consultor do serviço de Consultoria em Patologia e Imunoistoquímica, Botucatu-SP

Endereço para correspondência E ndereço para correspondência Daniela Rudgeri Derossi Rua Antonio Amado Noivo 430 Jd. Ipiranga CEP 86010-550 – Londrina-PR

RESUMO

INTRODUÇÃO: O gene bcl-2 codifica uma proteína envolvida no processo de controle da apoptose. Inicialmente descrito em linfomas e posteriormente em tecidos epiteliais, sua expressão é freqüentemente encontrada em carcinomas de mama, associada a fatores de prognóstico favorável. Como a punção aspirativa por agulha fina (PAAF) tem sido utilizada como um método confiável na investigação de carcinomas de mama, acessamos a expressão de bcl-2 em material assim obtido e correlacionamos sua positividade com o grau histológico, avaliado em material cirúrgico correspondente, das respectivas pacientes, seguindo a classificação de SBR (Scarff, Bloom e Richardson).

OBJETIVOS: Avaliar a expressão de bcl-2 em PAAF e correlacionar com grau histológico.

METODOLOGIA: A positividade do bcl-2 foi analisada, por imunocitoquímica, em 118 casos consecutivos de PAAF e correlacionada com grau histológico em material cirúrgico correspondente, segundo classificação de SBR.

RESULTADOS: A positividade para bcl-2 foi encontrada em 77 de 118 casos de PAAF (65,25%) e foi inversamente proporcional ao grau histológico (84,37%, p = 0,0022).

CONCLUSÃO: A expressão de bcl-2 em PAAF correlaciona-se com fator de bom prognóstico. O índice de positividade encontrado, assim como a correlação inversa com grau histológico, está de acordo com dados publicados previamente. O fácil e rápido manejo do material obtido por PAAF permite a aplicação de técnicas complementares, de maneira confiável, como demonstra este estudo. A positividade do bcl-2 correlacionada com baixo grau histológico, assim como com outros fatores de bom prognóstico, pode, no futuro, proporcionar informação preditiva e prognóstica para pacientes candidatas a tratamento quimioterápico neo-adjuvante.

unitermos: Mama, Carcinoma, Biópsia por agulha fina, bcl-2, Imunocitoquímica, Prognóstico

ABSTRACT

INTRODUCTION: The bcl-2 gene encodes a protein that is involved in cell death regulation. Initially described in lymphomas, and later in epithelial tissues, its expression is often found in breast cancer, in association with favorable prognostic factors. Because fine-needle aspiration (FNA) biopsy has been established as a reliable method for the diagnosis and biologic characterization of breast cancer, we assessed bcl-2 expression on FNAs from primary breast cancer and evaluated its correlation with the corresponding histologic grade, scored on the subsequent surgical specimen, following the Scarff, Bloom and Richardson method (SBR).

OBJECTIVES: To evaluate the bcl-2 protein expression on FNAs and correlate it with histologic grade on paraffin embedded material.

METHODS: Bcl-2 expression was evaluated retrospectively by immunocytochemistry on 118 consecutive FNAs from patients with primary breast cancer. Histologic grade was assessed according to the SBR classification, on surgical specimen material from the same patients that underwent surgical resection of the lesion. A correlation was established.

RESULTS: Bcl-2 was expressed in 77 of 118 FNAs (65.25%) and was correlated with histologic grade (p = 0,0022).

CONCLUSIONS: Bcl-2 expression, evaluated by immunocytochemistry on FNAs from primary breast carcinoma, correlates with favorable prognostic factor. The positivity rate, as well as the inverse histologic grade correlation, is in agreement with previous published data. As FNA biopsy is used increasingly as a primary tool in the diagnosis of breast carcinoma, bcl-2 evaluation by immunocytochemistry on FNA may provide, in a near future, in addition to other biologic variables, useful information for prognostic and predictive purposes, particularly in patients considered as candidates for neo-adjuvant treatment.

key words: Breast, Carcinoma, Fine needle aspiration, bcl-2, Immunocytochemistry, Prognosis

Introdução

Punção aspirativa

O uso da punção aspirativa por agulha fina (PAAF) para diagnóstico morfológico de uma variedade de lesões palpáveis foi descrito e praticado inicialmente nos Estados Unidos da América (EUA) a partir de 1930, entretanto não teve grande aceitação e difusão fora deste país. Após a Segunda Guerra Mundial, um grupo de hematologistas e oncologistas suecos difundiu o método, renovando as técnicas da citologia aspirativa (26).

Embora a maneira de realização da punção não tenha se aprimorado desde então, o procedimento tem mostrado grande valor custo/benefício. As vantagens de sua utilização consistem em elevada acurácia diagnóstica, baixo custo, excelente aceitação do paciente e morbidade mínima, com raras ocorrências de complicações (24).

Na mastologia, a PAAF tem sido utilizada como um procedimento de rotina na investigação diagnóstica de nódulos palpáveis de mama ou lesões não-palpáveis, detectadas por técnicas de imagem (mamografia, ultra-sonografia, ressonância magnética, etc.). Em adição ao diagnóstico morfológico de neoplasias, o material obtido por PAAF também tem sido utilizado para análise do ácido desoxirribonucléico (DNA) (7, 20) e para alguns estudos de imunocitoquímica, incluindo o de receptores hormonais (38).

bcl-2

O bcl-2 pertence a uma família de genes aparentemente responsáveis pela manutenção do equilíbrio entre proliferação e morte celular programada (22), mecanismo pelo qual células com DNA danificado podem ser removidas sem prejuízo. Este gene codifica uma proteína mitocondrial com peso molecular de 24 kilodáltons, localizada no envelope nuclear, retículo endoplasmático e membrana mitocondrial externa, de vários tecidos normais e neoplásicos, com exceção de tecido muscular e hepático (9, 23). Todas as células hematopoiéticas e linfóides contêm a proteína bcl-2, além de muitas células epiteliais e neurônios (8).

A primeira anormalidade desse gene foi descrita em um linfoma não-Hodgkin, folicular, de linfócitos B, identificada na translocação dos cromossomos t (14;18), levando à justaposição do gene bcl-2 (normalmente localizado no cromossomo 18), ao gene da cadeia pesada da imunoglobulina (Igh) do cromossomo 14 (41), resultando com isto em altos níveis de expressão da proteína, fenômeno este visualizado na técnica de imunoistoquímica pela reatividade de linfócitos de zona do manto e de centro germinativo.

Porém a expressão da proteína codificada pelo gene bcl-2 não requer a presença da translocação t (14;18) (33). Na verdade, a expressão da proteína tem sido identificada em uma ampla variedade de tecidos humanos maduros ou em desenvolvimento, especialmente em células epiteliais de tecidos glandulares, sujeitos a hiperplasia ou involução por estímulo hormonal, como: mama, próstata e tireóide (1, 29, 31, 35, 37).

Hockenbery et al. (16) observaram a expressão de bcl-2 em vários tecidos humanos adultos e a classificaram em três categorias:

1. tecido epitelial glandular, cuja hiperplasia ou involução é regulada por fatores hormonais ou de crescimento;

2. tecido epitelial com diferenciação complexa, caracterizado por células-mães com longa sobrevida, como intestino e pele;

3. células pós-mitóticas com longa sobrevida, como neurônios.

O epitélio ductal mamário se enquadraria na primeira categoria (16).

Estudos prévios também demonstraram que, durante o ciclo menstrual, a flutuação da expressão do bcl-2 pode ser correlacionada à apoptose cíclica das células epiteliais mamárias, sugerindo sua regulação por hormônios esteróides (35).

No câncer de mama, a determinação do bcl-2 vem sendo avaliada como fator prognóstico e preditivo, sugerindo que sua expressão pode ter importante correlação com resposta terapêutica em pacientes com linfonodos axilares positivos, agindo como modulador da resposta quimioterápica e/ou terapia endócrina (10, 14, 17, 44).

Grau histológico

Entre os fatores mundialmente aceitos como indicadores de prognóstico, a determinação do grau histológico é um dos principais e mais fáceis a serem acessados na rotina diagnóstica. Um dos aspectos fundamentais da patologia oncológica, que resistiu ao passar dos anos, foi o reconhecimento de que o detalhamento de estruturas morfológicas de tumores pode ser correlacionado com seu grau de malignidade.

A aceitação da graduação histológica na rotina de histopatologia diagnóstica foi lenta até recentemente, em parte, pela falta de demanda clínica, pela subjetividade e pela falha de reprodutibilidade dos métodos descritos anteriormente. Bloom e Richardson (4) contribuíram para a melhora do sistema de graduação, adicionando uma escala numérica aos critérios histológicos inicialmente descritos por Patey e Scarff (32), registrando a chamada classificação de Scarff, Bloom e Richardson (SBR), adotada oficialmente pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em 1968 (36). Recentemente, o grupo de Nottingham introduziu algumas modificações no método de SBR, na tentativa de tornar ainda mais objetivos os padrões de avaliação histológica (11), mas tais critérios ainda não foram adotados pela OMS.

Neste estudo, empregaremos a classificação de SBR modificada por Elston e Ellis (11) para correlação entre grau histológico e positividade ao bcl-2.

Objetivos

Estudar a expressão do bcl-2 em casos de carcinoma de mama; estabelecer um índice de positividade para a amostra estudada; correlacionar a positividade do bcl-2, em material obtido por PAAF, com grau histológico tumoral, avaliado em material cirúrgico convencional das pacientes correspondentes.

Material e métodos

Material

Neste estudo retrospectivo foram analisadas 138 PAAFs de nódulos palpáveis de mama, realizadas no Instituto de Câncer de Londrina (ICL), nos anos de 1997, 1998 e 1999, com diagnóstico citológico de carcinoma, cujas pacientes foram posteriormente submetidas a cirurgia (mastectomia, quadrantectomia) ou biópsia incisional (comprovação anatomopatológica).

Coleta e mensuração

As punções aspirativas foram realizadas por quatro ginecologistas no primeiro ano e por um único patologista nos anos subseqüentes, em regime ambulatorial, no Instituto de Câncer de Londrina (ICL), para investigação diagnóstica rotineira de nódulos mamários palpáveis. As amostras citológicas foram analisadas por um único patologista. As mastectomias foram realizadas pelo mesmo grupo de ginecologistas e analisadas no serviço de anatomia patológica do mesmo hospital (ICL) por dois patologistas. Todos os esfregaços obtidos por punção aspirativa foram submetidos à reação de imunocitoquímica para detecção da proteína bcl-2 e analisados sem conhecimento prévio do resultado das punções aspirativas. Os resultados foram dados como positivo ou negativo, sendo que foram considerados positivos aqueles em que mais de 10% das células tumorais exibiram expressão citoplasmática (cut off). Como controle positivo, foram utilizados os elementos da população linfocitária, invariavelmente presentes em áreas adjacentes às lesões tumorais. Como controle negativo, foram utilizados cortes de fígado, submetidos à mesma bateria de reações que o material em estudo.

Os cortes histológicos dos respectivos espécimes cirúrgicos das pacientes foram analisados para fins de histopatologia diagnóstica e graduados conforme os critérios de SBR, aceitos pela OMS e modificados por Elston e Ellis, avaliando-se a porcentagem de formação tubular na neoplasia, o pleomorfismo nuclear e o índice mitótico, subdividindo os carcinomas em grau I, grau II e grau III, ou seja, carcinomas bem, moderadamente e pouco diferenciados, respectivamente, de acordo com escala descrita na tabela 1.

O somatório dos pontos determinados na escala define o grau histológico da classificação de Scarff, Bloom e Richardson (modificada por Elston e Ellis):

• 3-5 pontos: grau 1 ou bem diferenciado;

• 6-7 pontos: grau 2 ou moderadamente diferenciado;

• 8-9 pontos: grau 3 ou pouco diferenciado.

As punções aspirativas foram realizadas com seringas de 10ml, agulhas de calibre 25x6, encaixadas em instrumento específico para o procedimento (modelo nº 4, Helmuth Industries, Linden, NJ), como descrito por Zajicek (43). Os esfregaços foram fixados ao ar livre e posteriormente hidratados com solução de cloreto de sódio a 0,9%, por 30 segundos, com a finalidade de promover a hemólise, evitando assim reações cruzadas, envolvendo a peroxidase endógena das hemácias (durante a reação de imunocitoquímica), e imediatamente fixados em etanol a 95%. A reação de imunocitoquímica se processou da seguinte forma: após lavagem das lâminas em solução tampão de fosfato (PBS), pH = 7,2, os esfregaços de punção aspirativa foram colocados em solução tampão de citrato, pH = 6, e aquecidos em forno de microondas durante 5 minutos, na potência máxima, por três ciclos. No final do procedimento, o material foi deixado em temperatura ambiente por 30 minutos para resfriamento. A inativação da peroxidase endógena foi complementada com solução de água oxigenada a 1%. O material foi, então, submetido a incubação com anticorpo primário para bcl-2 (clone 124, Dako Cor., Carpinteria, CA) por 12 horas, à temperatura estável de 10oC na diluição de 1:200. Depois, foram submetidos à incubação com anticorpo secundário anticamundongo (Vector Laboratories, Burlingame, CA), na diluição de 1:160, por 1 hora e incubação com o complexo avidina-biotina por 45 minutos. A revelação da reação foi feita com diaminobenzidina (DAB, Sigma Chemicals, St. Louis, MO), contracorada com hematoxilina. Foram considerados positivos para bcl-2 os casos onde se observaram mais de 10% das células tumorais coradas.

Análise estatística

Foi realizada análise bivariada para avaliar a relação da expressão da proteína codificada pelo bcl-2 com grau histológico, através do teste de qui-quadrado, em nível de significância de 5%, no programa Statistical Analysis System (SAS).

Resultados

Graduação histológica

Dos 138 casos analisados, 20 não puderam ser graduados segundo a classificação de SBR (modificada por Elston e Ellis) por se tratarem de carcinomas in situ (sete casos) ou por apresentarem artefatos de processamento (13 casos) que não permitiram a análise fiel dos dados. Dos 118 casos restantes, 32 foram graduados como grau I de SBR (27,12%), 61 casos como grau II (51,69%) e 25 casos como grau III (21,19%), como demonstra a tabela 2.

Imunocitoquímica

Dos 138 casos analisados e submetidos à reação de imunocitoquímica, 95 foram positivos para bcl-2 (68,84%), como demonstra a tabela 3 e a figura. Vinte casos foram excluídos pela falta de correlação com grau histológico. Dos casos restantes (118), 77 foram positivos para bcl-2 (65,25%).


A positividade para bcl-2 foi encontrada em 27 casos classificados como grau I (84,37%); 40 casos classificados como grau II (53,5%) e dez casos classificados como grau III (40%), como mostra a tabela 4.

A análise estatística demonstrou relação estatisticamente significativa entre positividade para bcl-2 e grau histológico, com valor de p = 0,0022. O teste de qui-quadrado para linearidade demonstrou tendência constante de decréscimo de 22% da positividade do bcl-2 em relação ao aumento do grau histológico.

Discussão

O objetivo deste estudo consistiu em avaliar a expressão de bcl-2 em carcinomas de mama, utilizando-se material obtido por PAAF, estabelecer um índice de positividade e correlacionar tal expressão com o grau histológico tumoral.

A PAAF vem sendo empregada de modo crescente na investigação diagnóstica do câncer de mama por ser um método pouco invasivo, de elevada acurácia diagnóstica, baixo custo e raras ocorrências de complicações. A resistência na aceitação do procedimento no passado se devia, em parte, ao medo de implantes tumorais no trajeto da agulha, ou mesmo à realização de condutas invasivas, como mastectomias, baseadas em resultados citológicos falsos positivos, com implicações médicas e legais.

Após revisão da literatura, Powers (34) encontrou um índice crescente de relatos de complicações, porém com pobre documentação sobre o ato da coleta e principalmente sobre o calibre da agulha usada. Restringindo o estudo a punções realizadas com agulhas de 22 gauges, o índice de complicações foi estimado em 0,03%, tornando a punção aspirativa por agulha fina um dos métodos invasivos mais seguros na atualidade.

Hoje, a grande aceitação desta técnica vem ampliando seu campo de utilização, sendo a aplicação de técnicas complementares somente uma conseqüência do fácil e rápido manejo que este material nos proporciona.

Nos últimos anos, estudos têm demonstrado que vários fatores biológicos podem ser avaliados por imunocitoquímica, em material obtido por PAAF de carcinoma de mama, entre eles os receptores de estrógeno e progesterona, oncogenes como p53 e c-erb-2 e mesmo marcadores de proliferação celular, como Ki-67 (5, 27, 28). Este estudo contribui para reafirmar tal aplicabilidade.

O bcl-2 tem importância no processo de manutenção da morte celular programada. Sua expressão tem sido descrita em células ductais mamárias, onde parece estar envolvido nos fenômenos de hiperplasia e involução relacionados ao controle hormonal (35).

Como um inibidor da apoptose, o bcl-2 deveria estar correlacionado com tumores de comportamento biológico altamente agressivos e resistentes à terapia hormonal e/ou citotóxica. No entanto a alta expressão de bcl-2 tem sido correlacionada a numerosos fatores prognósticos favoráveis, incluindo positividade para receptores de estrogênio e progesterona, baixo grau histológico, tumores bem diferenciados e ausência de expressão de outros marcadores tumorais indicadores de prognóstico desfavorável, como c-erB-2 e p53 (30). Ainda, alguns estudos têm demonstrado que pacientes com tumores que revelam alta expressão de bcl-2 são mais responsivos à terapia hormonal (14) e têm maior sobrevida (13, 15, 21).

Poucos estudos avaliaram a expressão da proteína codificada pelo gene bcl-2 em carcinomas de mama em material obtido por PAAF (5, 6, 27, 28).

Neste estudo, o bcl-2 foi avaliado em 138 casos consecutivos de punção aspirativa por agulha fina, com diagnóstico de carcinoma de mama, e foi correlacionado com grau histológico em 118 casos. A positividade para bcl-2 foi encontrada em 77 casos (65,25%), observando-se sempre coloração citoplasmática em mais de 10% das células tumorais. Resultados semelhantes foram relatados por Bozzetti, descrevendo expressão de bcl-2 em 76% dos casos, avaliados em material idêntico ao nosso (6), e por Troncone, relatando 65% de positividade (39). No entanto os relatos na literatura demonstram índices de positividade variando de 32% a 85,9%, de acordo com critérios e metodologia descritos nos respectivos relatos (3, 12, 14, 15, 18, 19).

Houve associação inversa entre expressão de bcl-2 e grau histológico. O bcl-2 teve alta expressão em casos classificados como grau I (84,37%), ou seja, tumores bem diferenciados, indicando significante correlação estatística com fator histológico de bom prognóstico (p = 0,0022). Houve declínio constante de cerca de 22% da positividade, conforme progressão do grau histológico. Estes resultados sugerem que os níveis de bcl-2 exibem correlação com as vias de regulação hormonal e tendem a declinar durante o processo de progressão dos carcinomas de mama, além de demonstrar a queda de sua expressão em tumores com alta proliferação celular, como descreve Yang (42).

Esta mesma correlação tem sido descrita em estudos recentes, correlacionando a alta expressão de bcl-2 com a expressão de receptores hormonais, estrógeno e progesterona, e demonstrando a falta de correlação com indicadores de prognóstico desfavorável, como p53 e c-erb-2 (3, 25, 28). Berardo et al. atribuem valor prognóstico ao bcl-2 (2).

A positividade do bcl-2, correlacionada a baixo grau histológico, assim como a outros fatores de bom prognóstico, pode, no futuro, proporcionar valiosa fonte de informação na identificação de pacientes que responderão bem à terapia hormonal (10). Porém deve ser lembrado que o bcl-2 é apenas um dos membros de uma extensa família responsável pelo controle da morte celular programada, e sua categorização como fator prognóstico e preditivo, em carcinoma de mama, ainda depende de estudos futuros, com investigação correlacionada com sobrevida, recorrências e respostas terapêuticas.

Conclusões

• O material obtido por punção aspirativa pode ser adequadamente empregado na realização de técnicas especiais, como imunocitoquímica;

• estabeleceu-se índice de positividade da proteína expressa pelo gene bcl-2 de 65,25% na amostra estudada;

• foi demonstrado, neste estudo, que existe correlação estatística significativa entre a positividade de bcl-2 e a graduação histológica de carcinoma de mama;

• a positividade do bcl-2 relacionou-se a fator de bom prognóstico.

Recebido em 10/06/01

Aceito para publicação em 28/11/02

Trabalho realizado no Setor de Anatomia Patológica do Departamento de Patologia Aplicada e Deontologia, Centro de Ciências da Saúde, Universidade Estadual de Londrina, em colaboração com o Instituto de Câncer de Londrina e a Universidade Estadual de São Paulo (Unesp). Apresentado como dissertação de mestrado em Medicina Interna, Universidade Estadual de Londrina, em 19 de abril de 2001

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    ndereço para correspondência
    Daniela Rudgeri Derossi
    Rua Antonio Amado Noivo 430
    Jd. Ipiranga
    CEP 86010-550 – Londrina-PR
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Jul 2004
    • Data do Fascículo
      Set 2003

    Histórico

    • Aceito
      28 Nov 2002
    • Recebido
      10 Jun 2001
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