Acessibilidade / Reportar erro

Metabolismo respiratório e da glicose de Carassius auratus submetidos à concentrações de eugenol

Respiratory metabolism of “Carassius auratus” in different concentrations of eugenol

RESUMO

Este trabalho tem como finalidade avaliar o uso do eugenol como anestésico para Carassius auratus mensurando o tempo de indução à anestesia em relação a diferentes concentrações e seus efeitos nas trocas gasosas respiratórias. Os peixes foram expostos as concentrações de 20, 40, 80, 120, 150mg L-1 de eugenol. Os resultados foram analisados segundo um delineamento inteiramente casualisado (DIC) com seis tratamentos e cinco repetições cada um, submetidos à análise de variância e quando significativos, as médias foram comparadas pelo teste t de Student (α = 0,05). Os valores de PaO2e PaCO2 foram submetidos à regressão polinomial (p > 0,05). Foram avaliados o tempo de sedação e recuperação. O sangue foi retirado para analise parâmetros hematológicos, pH, pressão parcial de oxigênio (PaO2), pressão parcial de dióxido de carbono (PaCO2), bicarbonato (HCO-3) e glicose. As concentrações acima de 80 mg.L-1 apresentaram sedação com 62 seg. A recuperação possui correlação inversa ao tempo de anestesia. O aumento das concentrações de eugenol proporcionou elevação de 27,5% nos hematócrito e de 37% no eritrócitos e houve aumento na glicose plasmática. Ademais, apresentaram diminuição na pressão de oxigênio no sangue (PaO2), e aumento na pressão de dióxido de carbono (PaCO2). A utilização do eugenol possibilitaria e melhoria o manejo nas pisciculturas sendo a dose recomendada de 40mg. L-1 para Carassius auratus pois minimiza os riscos inerentes a processos anestésicos rotineiros, com menor comprometimento cardiovascular e, consequentemente, redução do risco de óbito.

anestesia; hemogasometria; manejo de peixes

SUMMARY

The study aimed to evaluate the use of eugenol as an anesthetic for Carassius auratus measuring time to anesthesia induction in different concentrations and their effects on gas exchange breathing. The fish were exposed to concentrations of 20, 40, 80, 120, 150 mg L-1 of eugenol. The results were analyzed according to a completely randomized design with six treatments and five replications were submitted to analysis of variance and when significant, averages were compared by Student's test (α = 0,05). the probability 5%. PaO2e PaCO2 values were submitted to polynomial regression (p > 0.05). The sedation and recovery time it’s the evaluation. Blood was withdrawn for hematological parameters analysis, pH, partial pressure of oxygen (PaO2), partial pressure of carbon dioxide (PaCO2), bicarbonate (HCO-3) and glucose. Concentrations above 80 mg.L-1 presented sedation with 62 sec. The recovery has inverse correlation to time of anesthesia. Anesthetic induction of: C. auratus to different concentrations of eugenol provided 27.5 elevation on the values of percentage of hematocrit and erythrocyte number 37 and an increase in plasma glucose. C. auratus when subjected to the increased concentration of eugenol showed decrease in blood oxygen pressure (PaO2), and increase in pressure of carbon dioxide (PaCO2). The use of eugenol makes handling the fish farms, the recommended dose is 40 mg. L-1 for Carassiusauratus that minimize the risks inherent in routine anesthetic procedures, with less cardiovascular impairment and, therefore, reducing the risk of death.

anesthesia; hemogasometry; fish management

INTRODUÇÃO

Dentre as espécies de peixes ornamentais com grande popularidade destaca-se Carassius auratus que ocupa lugar de destaque na comercialização mundial em função da sua aparência, docilidade durante o manejo e adaptação ao confinamento (TAGHIZADEH et al., 2013TAGHIZADEH, V.; IMANPOOR, M.; HOSSEINZADEH, M.; AZARIN, H. Effects of acidic water in combination with aluminum on swimming behavior and survival of yolk-sac larval in Goldfish (Carassius auratus gibelio). SpringerPlus, v.2, n.1, p.1-6, 2013.).

Os peixes ornamentais durante o cultivo, frequentemente precisam ser manejados para classificação e comercialização, o que envolve mudanças de ambiente e alteração na sua homeostasia. A utilização de substâncias anestésicas pode diminuir injurias e morte durante as práticas de manejo (GHOLIPOURKANANI et al., 2013GHOLIPOURKANANI, H.; AHADIZADEH, S. Use of propofol as an anesthetic and its efficacy on some hematological values of ornamental fish Carassius auratus. Springer Plus, v.76, n.2, p.1-5, 2013.). Dentre os anestésicos com potencial para utilização na piscicultura destaca-se o eugenol. Esta substancia é muito usado na odontologia (MAZZAFERA, 2003MAZZAFERA, P. Efeito alelopático do extrato alcoólico do cravo-da-índia e eugenol. Revista Brasileira de Botânica, v.26, n.2, p.231-238, 2003.). O eugenol é recomendado como um anestésico com poucos riscos de intoxicação (INOUE et al., 2011INOUE, L.A.K.; BOIJINK, C.L.; RIBEIRO, P.T.; SILVA, A.M.D.; AFFONSO, E.G. Avaliação de respostas metabólicas do tambaqui exposto ao eugenol em banhos anestésicos. Acta Amazonica, v.41, n.2, p.327-332, 2011.) eficácia, seguridade e de baixo custo (PADUA et al., 2012PADUA, S.B.; VENTURA, A.S.; SATAKE, F.; ISHIKAWA, M.M.; HISANO, H.; ROTTA, M.A.; ARANTES, F.C. Respostas hematológicas em tuvira após anestesia com diferentes concentrações de óleo de cravo. Boletim do Instituto de Pesca, v.38, n.3, p.181-188, 2012.).

A anestesia em peixes pode ser afetada por fatores biológicos tais como diferença entre espécies e tamanho e por fatores ambientais (ROTILI et al., 2012ROTILI, D.A.; DEVENS, M.A.; DIEMER, O.; LORENZ, E.K.; LAZZARI, R.; BOSCOLO, W.R. Uso de eugenol como anestésico em pacu. Pesquisa Agropecuária Tropical, v.42, n.3, p.288-294, 2012.). Dentre os estágios de anestesia de peixe, observa-se nos primeiros estágios (I e II) a diminuição dos batimentos operculares e no estágio III aumento dos movimentos operculares (ROSS & ROSS, 2008ROSS, L.G.; ROSS, B. Anaesthetic and sedative techniques for aquatic animals. 3.ed. Oxford: Blackwell, 2008. 222p.). Como as brânquias dos peixes têm múltiplas finalidades, desde promover as trocas gasosas, regulação osmótica iônica e hematológica (GHOLIPOURKANANI et al., 2013GHOLIPOURKANANI, H.; AHADIZADEH, S. Use of propofol as an anesthetic and its efficacy on some hematological values of ornamental fish Carassius auratus. Springer Plus, v.76, n.2, p.1-5, 2013.), a diminuição nos movimentos operculares podem alterar estas funções. A utilização de anestésicos pode causar reações adversas secundárias tais como acidose e estresse osmótico devido à parada respiratória e insuficiente troca gasosa e iônica entre o sangue e a água (ZAHL et al., 2012)ZAHL, I.; SAMUELSEN, O.; KIESSLING, A. Anaesthesia of farmed fish: implications for welfare. Fish Physiology and Biochemistry, v.38, n.1, p.201-218, 2012..

Este trabalho tem como objetivo avaliar o uso do eugenol como anestésico para Carassius auratus mensurando o tempo de indução à anestesia em relação a diferentes doses e seus efeitos nas trocas gasosas respiratórias e no metabolismo energético.

MATERIAL E MÉTODOS

Os exemplares de Carassius auratus foram mantidos por um período de aclimatação de 7 dias no laboratório. Estes foram acondicionados em um tanque de 100L de água termostatizada e aerada. Os peixes foram alimentados com ração comercial ad libtum (45% Proteína bruta, 3800kcal. Kg-1 Energia digestível). A qualidade de água foi monitorada diariamente com o multiparâmetro: para aferição da temperatura (ToC), do potencial hidrogeniônico (pH) e do oxigênio dissolvido (O2D).

Na indução anestésico foram separados 60 exemplares de Carassius auratus com peso de 10,53±1,04g divididos em 6 caixas de 20L de água termostatizada e aerada. Os peixes foram expostos a concentrações de 20, 40, 80, 120, 150mg L-1 de eugenol (O eugenol por ser oleoso, foi diluído em álcool etílico (92,8o) no momento do uso, no que resultou em solução-estoque à concentração de 100mg mL-1 (1:10)), e um controle (peixes submetidos ao manejo de troca de aquários sem utilização de anestésico). Submetidos individualmente ao banho anestésico, no qual foi monitorado o tempo para a indução anestésica e o tempo de recuperação. O tempo necessário para a latência total dos peixes foi considerado como o início da exposição até a perda total de equilíbrio na coluna de água e a parada dos batimentos operculares, condição equivalente ao estágio III de anestesia (ROSS & ROSS, 2008ROSS, L.G.; ROSS, B. Anaesthetic and sedative techniques for aquatic animals. 3.ed. Oxford: Blackwell, 2008. 222p.). Após atingir o estágio III, retirou-se o sangue com seringa de 1mL heparinizada pela veia caudal e transferidos para um aquário com água sem anestésico, onde foi verificado o tempo de recuperação, considerado como o período necessário para que os peixes recuperassem o equilíbrio e a natação ativa na coluna de água.

Para a coleta de sangue cinco peixes de cada tratamento foram coletados aleatoriamente. O sangue foi analisado em aparelho de hemogasometria. Os parâmetros analisados foram pH, pressão parcial de oxigênio (PaO2), pressão parcial de dióxido de carbono (PaCO2) e bicarbonato (HCO-3) e foi analisado a glicose (TRINDER, 1969TRINDER, P. Determination of glucose in blood using glucose oxidase with an alternative oxygen acceptor. Analytical Clinical Biochemistry, v.6, p.24-27, 1969.). Os parâmetros hematimétricos, foram determinados o percentual do hematócrito, pelo método do microhematócrito (GOLDENFARB et al., 1971GOLDENFARB, P.B.; BOWYER, F.P.; HALL, E.; BROSIOUS, E. Reproducibility in the hematology laboratory: the microhematocrit determinations. American Journal of Clinical Pathology, v.56, n.1, p.35-39, 1971.). A contagem de eritrócitos após diluição do sangue previamente homogeneizado em solução formol-citrato (1:200) e contagem realizada em hemocitômetro. Para determinação da concentração de hemoglobina, foi utilizado o método da cianometahemoglobina (COLLIER, 1944COLLIER, H.B. The standardizations of blood haemoglobin determinations. Canadian Medical Association Journal, v.50, n.6, p.550-552, 1944.). Com estes foram calculados os índices hematimétricos (WINTROBE, 1934WINTROBE, M.M. Variations in the size and hemoglobin content of erythrocytes in the blood of various vertebrates. Folia Haematologica, v.51, p.32-49, 1934.), compreendidos pelo Volume Corpuscular Médio (VCM) e Concentração de Hemoglobina Corpuscular Média (CHCM).

Os resultados foram analisados segundo um delineamento inteiramente casualisado (DIC) com seis tratamentos e dez repetições para as analises de indução e recuperação anestésica e cinco repetições para as analises sanguíneas, submetidos à análise de variância e quando significativos, as médias foram comparadas pelo teste t de Student a 5% de probabilidade. Os valores de PaO2e PaCO2 foram submetidos à regressão polinomial (p>0,05).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

As concentrações testadas foram eficientes para induzir a imobilidade de C. auratus com diferentes tempos de indução anestésica (Figura 1a). Durante a indução anestésica, o comportamento dos peixes seguiu o seguinte padrão: hiperatividade ao primeiro contato com o anestésico, caracterizada pela natação agitada contra as paredes do aquário; natação lenta; diminuição dos batimentos operculares, parada do animal na posição dorso ventral, perda da reação aos estímulos externos; perda do tônus muscular. Em nenhuma das concentrações de eugenol testadas houve mortalidade.

Figura 1
Tempo de indução (a) e recuperação (b) de Carassius auratus submetidos a diferentes concentrações de eugenol

O tempo para que o C. auratus apresentasse imobilidade foi inversamente proporcional ao aumento na dose de eugenol administrada. A concentração de 20mg.L-1 obtiveram tempo de indução anestésica em torno de 202seg, considerado longo para atingir o plano anestésico. O tempo de indução anestésica de 77±18seg foi obtida pela concentração de 40mg.L-1. Alevinos de Pseudopatystoma corruscans apresentam tempos de indução inferiores a um minuto com concentrações de 50, 75 e 100mg.L-1 de eugenol (VIDAL et al., 2008VIDAL, L.V.O.; ALBINATI, R.C.B.; ALBINATI, A.C.L.; LIRA, A.D.; ALMEIDA, T.R.; SANTOS, G.B. Eugenol como anestésico para a tilápia-do-Nilo. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v.43, n.8, p.1069- 1074, 2008.). A concentração adequada de eugenol para indução e recuperação anestésica em jundiás (Rhamdia voulezi) é de 50mg.L-1 (DIEMER et al., 2012DIEMER, O.; NEU, D.H.; BITTENCOURT, F.; SIGNOR, A.; BOSCOLO, W.R.; FEIDEN, A. Eugenol como anestésico para jundiá (Rhamdiavoulezi) em diferentes pesos. Semina: Ciências Agrárias, v.33, n.4, p.1495-1500, 2012.). O óleo de cravo possui efeito anestésico para alevinos de lambari, sendo 50mg.L-1 a concentração eficiente e segura para indução à anestesia profunda em até 1,5 minuto, ressaltando a maior resistência devido a diferença de peso em comparação as demais espécies (PEREIRA-DA-SILVA et al., 2009PEREIRA-DA-SILVA, E.M.; OLIVEIRA, R.H.F.; RIBEIRO, M.A.R.; COPPOLA, M.P. Efeito anestésico do óleo de cravo em alevinos de lambari. Ciência Rural, v.39, n.6, p.1851-1856, 2009.). Carassius auratus com 2,7g, não apresenta sedação com doses de eugenol inferiores a 37,5mg.L-1 e a dose de 75mg L-1 acarretou em morte de 25% dos peixes (BITTENCOURT et al., 2012BITTENCOURT, F.; SOUZA, B.E.; BOSCOLO, W.R.; RORATO, R.R.; FEIDEN, A.; NEU, D.H. Benzocaína e eugenol como anestésicos para o quinguio (Carassiusauratus). Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v.64, n.6, p.1597-1602, 2012.).

O aumento na dose de eugenol proporcionou aumento (P>0,05) no tempo de recuperação a anestesia para C. auratus (Figura 1b). A dose de 150mg. L-1 de eugenol proporcionou anestesia rápida dos peixes (60,0±10,6seg), no entanto, o tempo de recuperação foi de 740±57,4seg. O tempo de recuperação recomendado para o Epinephelus bruneus a indução à anestesia profunda deve ser inferior a 600seg (PARK et al., 2008)PARK, M.O.; HUR, W.J.; IM, S.T.; SEOL, D.W.; LEE, J.; PARK, I.S. Anaesthetic efficacy and physiological responses to clove oil anaesthetized kelp grouper Epinephelusbruneus. Aquaculture Research, v.39, p.877-884, 2008.. A indução à anestesia profunda deve levar de 1 a 3min e a recuperação não deve ultrapassar 5min (PEREIRA-DA-SILVA et al., 2009)PEREIRA-DA-SILVA, E.M.; OLIVEIRA, R.H.F.; RIBEIRO, M.A.R.; COPPOLA, M.P. Efeito anestésico do óleo de cravo em alevinos de lambari. Ciência Rural, v.39, n.6, p.1851-1856, 2009.. Ao expor pampo Trachinotus marginatus, à concentração de 25ppm eugenol os peixes levaram10min para atingir a latência total, e na concentração de 75ppm apenas 2min, sendo inversamente proporcional ao tempo de recuperação (OKAMOTO et al., 2009)OKAMOTO, M.H.; TESSER, M.B.; LOUZADA, L.R.; SANTOS, R.A.; SAMPAIO, L.A. Benzocaína e eugenol como anestésicos para juvenis do pampo Trachinotusmarginatus. Ciência Rural, v.39, n.3, p.866-877, 2009.. Em um estudo com C. auratus, o tratamento com dose de 75mg.L-1proporcionou tempo de recuperação acima de 15 minutos, inadequado para o bem estar dos peixes (BITTENCOURT et al., 2012)BITTENCOURT, F.; SOUZA, B.E.; BOSCOLO, W.R.; RORATO, R.R.; FEIDEN, A.; NEU, D.H. Benzocaína e eugenol como anestésicos para o quinguio (Carassiusauratus). Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v.64, n.6, p.1597-1602, 2012..

A indução anestésica de C. auratus à diferentes concentrações de eugenol proporcionou elevação (P>0,05) de 27,5% nos valores de percentual de hematócrito e de 37% no número de eritrócitos (Tabela 1). A anestesia com óleo de cravo em tuvira (Gymnotus inaequilabiatus) ocasiona alterações no hemograma, dose-dependente (PADUA et al., 2012)PADUA, S.B.; VENTURA, A.S.; SATAKE, F.; ISHIKAWA, M.M.; HISANO, H.; ROTTA, M.A.; ARANTES, F.C. Respostas hematológicas em tuvira após anestesia com diferentes concentrações de óleo de cravo. Boletim do Instituto de Pesca, v.38, n.3, p.181-188, 2012.. Para o tambaqui (Colossoma macropomum) o uso de óleo de cravo promoveu aumento na quantidade de eritrócito (PADUA et al., 2013)PÁDUA, S.B.; DIAS NETO, J.; SAKABE, R.; CLAUDIANO, G. da S.; CHAGAS, E.C.; PILARSKI, F. Notas Científicas Variáveis hematológicas em tambaquis anestesiados com óleo de cravo e benzocaína. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v.48, n.8, p.1171-1174, 2013.. Apesar do aumento na quantidade de eritrócito em C. auratus estas caracterizam-se como normocíticas-normocrômicas, resultante da ação de catecolaminas (liberadas pela ativação do eixo hipotálamo – sistema nervoso simpático – células cromafins), que determinam a contração esplênica em resposta ao estímulo de estresse agudo (INOUE et al., 2004)INOUE, L.A.K.A.; HACKBARTH, A.; MORAES, G. Assessment of 2-phenoxyethanol and benzocaine as anesthetics for field procedures in matrinxa (Bryconcephalus). Biodiversidade Pampeana, v.2, n.1, p.10-15, 2004.. Estes corroboram com a elevação dos níveis de glicose plasmática em resposta ao banho anestésico com eugenol em relação ao grupo controle (Tabela 1). A glicose é um dos indicadores mais utilizados na avaliação do estresse em peixes como resposta secundária, sua elevação deve-se a presença de algum fator estressante para suprir a maior demanda energética, característica de situações desfavoráveis (DINIZ & HONORATO, 2012)DINIZ, N.M.; HONORATO, C.A. Algumas alternativas para diminuir os efeitos do estresse em peixes de cultivo - revisão. Arquivo de Ciências Veterinária e Zoologia UNIPAR, v.15, n.2, p.149-154, 2012.. O uso de anestésico pode ter efeitos secundários indesejados que reduzem o bem-estar dos peixes, como a acidose (ZAHL et al., 2012)ZAHL, I.; SAMUELSEN, O.; KIESSLING, A. Anaesthesia of farmed fish: implications for welfare. Fish Physiology and Biochemistry, v.38, n.1, p.201-218, 2012.. Neste estudo não observou-se o quadro de acidose metabólica uma vez que os valores de pH e bicarbonato plasmático sofreram alterações em relação ao grupo controle (Tabela 1).

Tabela 1
Parâmetros sanguíneos de C. auratus submetidos a diferentes concentrações de eugenol

O estudo da variável bicarbonato plasmático (HCO3-) permite avaliar a resposta do organismo frente a variações do pH no sangue.O bicarbonato é responsável por mais de 50% da capacidade tampão extracelular (LUNA, 2002LUNA, S.P.L. Equilíbrio acido-básico. In: FANTONI, D.T.; CORTOPASSI, S.R.G. Anestesia em cães e gatos. São Paulo: Rocca, 2002. p.120-129.). Neste estudo observou-se aumento na concentração de bicarbonato plasmático até a concentração de 40mg.L-1. Estes estão diretamente relacionados a elevação na PaCO2 pois o mecanismo compensatório eleva as taxas de bicarbonato a fim de neutralizar o excesso de CO2 presente no sangue. Nas concentrações acima de 80mg.L-1 observou-se manutenção nos níveis de bicarbonato que podem ser atribuídas ao aumento dos batimentos operculares comuns no primeiros estágios anestésicos destas concentrações de C. auratus quando submetidos ao aumento de concentração de eugenol como indutor anestésico apresentaram uma sutil diminuição na PaO2, e leve aumento na PaCO2 (Figura 2).

Figura 2
(a) Pressão parcial de oxigênio (PO2) e (b) dióxido de carbono (PCO2) de C. auratus submetidos a diferentes concentrações de eugenol

A diminuição do pH com concomitante aumento de bicarbonato (Tabela 1), revela que o peixe submetido a maiores concentrações de eugenol apresentou quadro de acidose respiratória. O aumento de CO2 desencadeia a reação de formação de ácido carbônico (H2CO3), que posteriormente pela ação da anidrase carbônica aumenta a produção de bicarbonato (HCO3), que atua como tampão fisiológico. Estes resultados permite estabelecer o quadro de acidose respiratória caracterizada pela diminuição do pH, decréscimo nos teores de HCO3-e aumento da PaCO2.

A utilização de anestésicos pode causar reações adversas secundárias tais como acidose e estresse osmótico devido à parada respiratória e insuficiente troca gasosa e iônica entre o sangue e a água (ZAHL et al., 2012ZAHL, I.; SAMUELSEN, O.; KIESSLING, A. Anaesthesia of farmed fish: implications for welfare. Fish Physiology and Biochemistry, v.38, n.1, p.201-218, 2012.). As variações PaO2 e PaCO2 podem ser compensadas por compensações cardíacas (KEEN et al., 2012KEEN, A.N.; GAMPERL, A.K. Blood oxygenation and cardio respiratory function in steelhead trout (Oncorhynchus mykiss) challenged with an acute temperature increase and zatebradine-induced bradycardia. Journal of Thermal Biology, v.37, n.3, p.201-210, 2012.). Os peixes apresentarem hiperventilação quando estão no estagio III de anestesia, com o intuito de aumentar as trocas gasosas. No entanto, para o C. auratus aumento dos batimentos operculares não foi suficiente para aumentar a atividade cardio-respiratória resultando em baixas trocas gasosas.

A difusão das trocas gasosas nas brânquias dos teleósteos é mais dificultada pela excreção de CO2 do que pela captação de O2 (LIMA BOIJINK et al., 2010LIMA BOIJINK, C.; FLORINDO, L.H.; LEITE, C.A.C.; KALININ, A.L.; MILSOM, W.K.; RANTIN, F.T. Hypercarbic cardiorespiratory reflexes in the facultative air-breathing fish jeju (Hoplerythrinusunitaeniatus): the role of branchial CO2 chemoreceptors. Journal of Experimental Biology, v.213, p.2797-2807, 2010.). Mecanismo de hiperventilação são respostas ao decréscimo na concentração de oxigênio no sangue (hipoxemia) induzida pela acidose (KEEN et al., 2012KEEN, A.N.; GAMPERL, A.K. Blood oxygenation and cardio respiratory function in steelhead trout (Oncorhynchus mykiss) challenged with an acute temperature increase and zatebradine-induced bradycardia. Journal of Thermal Biology, v.37, n.3, p.201-210, 2012.) em contrapartida a elevação na concentração de CO2 no sangue é capaz de desencadear respostas cardiorrespiratórias (PORTEUS et al., 2012PORTEUS, C.S.; BRINK, D.L.; MILSOM, W.K. Neurotransmitter profiles in fishgills: Putative gill oxygen receptors. Respiratory Physiology & Neurobiology, v.184, n.3, p.316-325, 2012.). No entanto, o aumento na pressão de CO2 arterial, e concomitante diminuição do pH, são inevitáveis durante a hipercardia, mecanismo este utilizado para alterar o gradiente de difusão entre o sangue e água diminuindo a PCO2 (MILSON, 2012MILSON, W.K. New insights into gill chemoreception: receptor distribution and roles in water and air breathing fish. Respiratory Physiology & Neurobiology, v.184, n.3, p.326-339, 2012.).

A utilização do eugenol possibilita o manejo nas pisciculturas, a dose recomendada é de 40mg. L-1 para Carassius auratus sem comprometimento das funções cardiorrespiratórias

AGRADECIMENTOS

A Dra. Fernanda P. L. Zauith Diretora do Hospital Veterinário da UNIGRAN.O estudo foi aprovado pela comissão de bioética e foi realizado de acordo com as normas técnicas de biossegurança e ética. Processo CEUA- 104/11.

REFERÊNCIAS

  • BITTENCOURT, F.; SOUZA, B.E.; BOSCOLO, W.R.; RORATO, R.R.; FEIDEN, A.; NEU, D.H. Benzocaína e eugenol como anestésicos para o quinguio (Carassiusauratus). Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v.64, n.6, p.1597-1602, 2012.
  • COLLIER, H.B. The standardizations of blood haemoglobin determinations. Canadian Medical Association Journal, v.50, n.6, p.550-552, 1944.
  • DIEMER, O.; NEU, D.H.; BITTENCOURT, F.; SIGNOR, A.; BOSCOLO, W.R.; FEIDEN, A. Eugenol como anestésico para jundiá (Rhamdiavoulezi) em diferentes pesos. Semina: Ciências Agrárias, v.33, n.4, p.1495-1500, 2012.
  • DINIZ, N.M.; HONORATO, C.A. Algumas alternativas para diminuir os efeitos do estresse em peixes de cultivo - revisão. Arquivo de Ciências Veterinária e Zoologia UNIPAR, v.15, n.2, p.149-154, 2012.
  • GHOLIPOURKANANI, H.; AHADIZADEH, S. Use of propofol as an anesthetic and its efficacy on some hematological values of ornamental fish Carassius auratus Springer Plus, v.76, n.2, p.1-5, 2013.
  • GOLDENFARB, P.B.; BOWYER, F.P.; HALL, E.; BROSIOUS, E. Reproducibility in the hematology laboratory: the microhematocrit determinations. American Journal of Clinical Pathology, v.56, n.1, p.35-39, 1971.
  • INOUE, L.A.K.A.; HACKBARTH, A.; MORAES, G. Assessment of 2-phenoxyethanol and benzocaine as anesthetics for field procedures in matrinxa (Bryconcephalus). Biodiversidade Pampeana, v.2, n.1, p.10-15, 2004.
  • INOUE, L.A.K.; BOIJINK, C.L.; RIBEIRO, P.T.; SILVA, A.M.D.; AFFONSO, E.G. Avaliação de respostas metabólicas do tambaqui exposto ao eugenol em banhos anestésicos. Acta Amazonica, v.41, n.2, p.327-332, 2011.
  • KEEN, A.N.; GAMPERL, A.K. Blood oxygenation and cardio respiratory function in steelhead trout (Oncorhynchus mykiss) challenged with an acute temperature increase and zatebradine-induced bradycardia. Journal of Thermal Biology, v.37, n.3, p.201-210, 2012.
  • LIMA BOIJINK, C.; FLORINDO, L.H.; LEITE, C.A.C.; KALININ, A.L.; MILSOM, W.K.; RANTIN, F.T. Hypercarbic cardiorespiratory reflexes in the facultative air-breathing fish jeju (Hoplerythrinusunitaeniatus): the role of branchial CO2 chemoreceptors. Journal of Experimental Biology, v.213, p.2797-2807, 2010.
  • LUNA, S.P.L. Equilíbrio acido-básico. In: FANTONI, D.T.; CORTOPASSI, S.R.G. Anestesia em cães e gatos São Paulo: Rocca, 2002. p.120-129.
  • MAZZAFERA, P. Efeito alelopático do extrato alcoólico do cravo-da-índia e eugenol. Revista Brasileira de Botânica, v.26, n.2, p.231-238, 2003.
  • MILSON, W.K. New insights into gill chemoreception: receptor distribution and roles in water and air breathing fish. Respiratory Physiology & Neurobiology, v.184, n.3, p.326-339, 2012.
  • OKAMOTO, M.H.; TESSER, M.B.; LOUZADA, L.R.; SANTOS, R.A.; SAMPAIO, L.A. Benzocaína e eugenol como anestésicos para juvenis do pampo Trachinotusmarginatus. Ciência Rural, v.39, n.3, p.866-877, 2009.
  • PÁDUA, S.B.; DIAS NETO, J.; SAKABE, R.; CLAUDIANO, G. da S.; CHAGAS, E.C.; PILARSKI, F. Notas Científicas Variáveis hematológicas em tambaquis anestesiados com óleo de cravo e benzocaína. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v.48, n.8, p.1171-1174, 2013.
  • PADUA, S.B.; VENTURA, A.S.; SATAKE, F.; ISHIKAWA, M.M.; HISANO, H.; ROTTA, M.A.; ARANTES, F.C. Respostas hematológicas em tuvira após anestesia com diferentes concentrações de óleo de cravo. Boletim do Instituto de Pesca, v.38, n.3, p.181-188, 2012.
  • PARK, M.O.; HUR, W.J.; IM, S.T.; SEOL, D.W.; LEE, J.; PARK, I.S. Anaesthetic efficacy and physiological responses to clove oil anaesthetized kelp grouper Epinephelusbruneus Aquaculture Research, v.39, p.877-884, 2008.
  • PEREIRA-DA-SILVA, E.M.; OLIVEIRA, R.H.F.; RIBEIRO, M.A.R.; COPPOLA, M.P. Efeito anestésico do óleo de cravo em alevinos de lambari. Ciência Rural, v.39, n.6, p.1851-1856, 2009.
  • PORTEUS, C.S.; BRINK, D.L.; MILSOM, W.K. Neurotransmitter profiles in fishgills: Putative gill oxygen receptors. Respiratory Physiology & Neurobiology, v.184, n.3, p.316-325, 2012.
  • ROSS, L.G.; ROSS, B. Anaesthetic and sedative techniques for aquatic animals 3.ed. Oxford: Blackwell, 2008. 222p.
  • ROTILI, D.A.; DEVENS, M.A.; DIEMER, O.; LORENZ, E.K.; LAZZARI, R.; BOSCOLO, W.R. Uso de eugenol como anestésico em pacu. Pesquisa Agropecuária Tropical, v.42, n.3, p.288-294, 2012.
  • TAGHIZADEH, V.; IMANPOOR, M.; HOSSEINZADEH, M.; AZARIN, H. Effects of acidic water in combination with aluminum on swimming behavior and survival of yolk-sac larval in Goldfish (Carassius auratus gibelio). SpringerPlus, v.2, n.1, p.1-6, 2013.
  • TRINDER, P. Determination of glucose in blood using glucose oxidase with an alternative oxygen acceptor. Analytical Clinical Biochemistry, v.6, p.24-27, 1969.
  • VIDAL, L.V.O.; ALBINATI, R.C.B.; ALBINATI, A.C.L.; LIRA, A.D.; ALMEIDA, T.R.; SANTOS, G.B. Eugenol como anestésico para a tilápia-do-Nilo. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v.43, n.8, p.1069- 1074, 2008.
  • WINTROBE, M.M. Variations in the size and hemoglobin content of erythrocytes in the blood of various vertebrates. Folia Haematologica, v.51, p.32-49, 1934.
  • ZAHL, I.; SAMUELSEN, O.; KIESSLING, A. Anaesthesia of farmed fish: implications for welfare. Fish Physiology and Biochemistry, v.38, n.1, p.201-218, 2012.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Set 2016

Histórico

  • Recebido
    25 Mar 2015
  • Aceito
    20 Jul 2016
UFBA - Universidade Federal da Bahia Avenida Adhemar de Barros nº 500 - Ondina , CEP 41170-110 Salvador-BA Brasil, Tel. 55 71 32836725, Fax. 55 71 32836718 - Salvador - BA - Brazil
E-mail: rbspa@ufba.br